Vivi, de Passaporte para LiberdadeDivulgação
O sofrimento e os traumas dos judeus retratados pela minissérie da Globo fizeram Micha se lembrar do que os avós enfrentaram antes de chegarem ao Brasil. “Meu avô perdeu 11 irmãos. Foi o único sobrevivente, mas conseguiu formar uma linda família. Ele sequer podia ouvir o nome de Hitler, pois não controlava sua raiva. Minha avó não podia ver comida sendo desperdiçada. Ela contava da fome que passaram nos campos de concentração, pois o alimento era racionado. Então, ela sentia muito prazer em se sentar com os netos e bisnetos e vê-los comer. Por tudo isso, temos orgulho de manter a nossa história viva”.
Na opinião de Micha Gamerman, a protagonista da obra, Aracy de Carvalho, funcionária do consulado brasileiro que ajudou a salvar vários judeus, colaborou, na verdade, com a mobilização contra a barbárie. “No final de um episódio, ouvi a neta de sobreviventes dizer a frase que reproduzo: ‘Aquele que salva uma alma, salva o mundo inteiro’. Porque, por meio disso, eles conseguiram construir famílias. Como estudioso do judaísmo e neto de sobreviventes, digo que essa é uma frase dos nossos sábios”.
O que salva o mundo é o amor ao próximo
Na opinião de Gamerman, é muito importante que, por meio de produções como 'Passaporte para Liberdade", se possa introduzir a lição do amor ao próximo. “Essa minissérie me impactou pelo amor que Aracy tinha pelo ser humano. Ela não era da nossa religião, mas se dedicou ao nosso povo, salvando-o e, assim, se tornando uma pessoa sublime, pela sua bondade, entre outras nações. Assim como foi Oscar Schindler, que fazia parte do regime nazista, mas também salvou vários judeus. Por amor ao próximo, ele se tornou uma figura sublime, a qual temos consideração, mesmo não sendo da nossa comunidade. E Aracy merece todo nosso prestígio por ter salvado pessoas que conseguiram formar suas famílias aqui no Brasil”.
Na verdade, amar ao próximo como a si mesmo é bíblico. “É um preceito judaico. O Mestre Rabi Akiva ensinou isso para seus alunos. Ele explicou que se você não consegue amar ao próximo como a si mesmo, porque é muito difícil, pelo menos não faça a ele o que não gostaria que fizesse a você. Você não gostaria de ser mutilado, que seu povo entrasse em extinção ou de sofrer, então, não faça. Esse é um grande ensinamento dessa minissérie”, pontua.
Micha Gamerman acredita que só quando os povos entenderem que o que salva o mundo é o amor, não haverá mais violência. “Vivemos diferenças entre raças, culturas e religiões. Mas quando o ser humano entende que tem que respeitar todo mundo, as minorias e suas diferenças, a gente pode acreditar que o mundo vai progredir”.
Wladimir WeltmanReprodução
Para ele, há algo de obscuro em quem põe em dúvida os feitos de Aracy de Carvalho, intenção que pipocou na mídia quando a minissérie foi ao ar. "Quanto àqueles que tentam minimizar os feitos de Aracy e sua importância na sobrevivência de judeus naquele período, obviamente há uma agenda escondida", sugere Weltman. "O Yad Vashem, o museu do Holocausto em Israel, prestigiou Aracy como sendo uma 'justa' (um conceito judaico sobre o ideal que todo ser humano deve tentar imitar). É a instituição mais eficiente para estudo do Holocausto no mundo, não tem uma agenda oculta. Eles homenageiam sinceramente aqueles que realmente salvaram vidas judaicas. Tenham sido 100 ou 1 só, porque uma vida humana vale tanto quanto toda a humanidade."
Nascido no Rio, Weltman hoje vive com a família em Los Angeles, onde prepara um documentário sobre os primeiros judeus da América do Norte. "Os 23 primeiros judeus que aportaram na ilha de Manhattan, quando ainda era uma colônia holandesa, foram judeus brasileiros/portugueses fugidos do Recife, depois que a cidade foi reconquistada pelos Portugueses em 1654", conta.
O roteirista adianta que o documentário trará dados surpreendentes sobre os judeus do Brasil. Ele entrevistou a recém-falecida historiadora da USP Anita Novinsky.
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