Rio -- No meio da pobreza, o luxo obtido com a vida do crime. Policiais Civis descobriram a casa de Adriano Souza de Freitas, o Chico Bento, chefe do tráfico no Jacarezinho. No interior da favela, que tem um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) da cidade, ocupando a 121ª colocação entre 126 bairros do Rio, a casa de quatro andares se destaca.
Um vídeo, obtido pela reportagem, mostra logo na entrada uma piscina com iluminação direcionada; churrasqueira na área gourmet, decorada com azulejos portugueses. A sala, dividida em dois ambientes, tem chão de porcelanato marmorizado. Nela, uma sala de jogos, com mesa de pingue-pongue, futebol e uma bateria. As paredes possuem texturas personalizadas, e escadas com iluminação a cada degrau. A cozinha foi projeta em estilo de ilha, com uma coifa. O teto é rebaixado em toda a residência, inclusive, no banheiro, de cerca de 15 metros quadrados. Nele, uma banheira de hidromassagem entre o porcelanato preto.
A casa foi descoberta por policiais da Delegacia de Roubos e Furtos (DRF) durante a operação realizada ontem na comunidade, visando o Cidade Integrada, programa do governo que pretende levar segurança, saúde e infraestrutura para o local. Informações de inteligência das polícias apontam que criminosos, incluindo Chico Bento, fugiram para o Complexo da Penha, na Zona Norte. De lá, teriam ido para outra localidade, ainda na tarde de ontem.
A semelhança com o personagem pacato e caipira do gibi está somente no apelido e aparência física. Chico Bento do Jacarezinho é mencionado em 27 investigações como autor de crimes, segundo sua ficha do sistema prisional, e possui quatro mandados de prisão pendentes. Ele tem anotações que se estendem em crimes como infração sanitária, ato incendiário, tortura, homicídio e tráfico, inclusive, com o envolvimento de crianças.
Em uma das barbáries mais recentes, em 2020, Chico Bento suspeitou que um técnico de instalação de câmeras fosse miliciano e o chamou para realizar um serviço na comunidade. De acordo com investigações da Delegacia de Descobertas de Paradeiros (DDPA), Renato Garcia de Lima, 43, e Leonardo Alcântara Hilario, 30, foram julgados por um tribunal do tráfico, presidido por Chico Bento, e executados. Hilário foi morto apenas porque acompanhava o colega de trabalho.
Em 2021, investigações que culminaram com a operação Exceptis apontaram que Chico Bento recrutava menores, de até 12 anos de idade, para atuarem no tráfico. "A estratégia baseia-se na impunidade, uma vez que os soldados das quadrilhas com menos de 18 anos, escudos para os bandidos mais velhos, estão sujeitos a medidas socioeducativas e não são encarcerados – o que é visto, obviamente, como vantajoso pelos chefes do crime", diz um relatório de investigação.
Segundo um relatório da Polícia Civil, ao qual O DIA teve acesso, "toda a contabilidade do Jacaré visa prestar contas a Chico Bento, motivo pelo qual seu vulgo não foi encontrado durante análise dos cadernos apreendidos com traficantes".
Em investigação do homicídio do policial da Core, Bruno Buhler, ocorrido em 2017, no Jacarezinho, um dos traficantes presos disse que retornou ao tráfico após anos de prisão, ao ser convidado por Chico Bento. Ele não conseguia emprego, segundo relatou em depoimento à polícia.
Moradores costumam, com frequência, realizar denúncias sobre o paradeiro do traficante. O programa Procurados oferece R$ 1.600 por informações que o levem à prisão. Em uma denúncia de março deste ano, um morador relatou: "Na localidade conhecida como Pontilhão, encontram-se diversos traficantes, da facção Comando Vermelho portando fuzis, pistolas, e comercializando entorpecentes. (O denunciante) relata que o acesso ao local possui barricadas de concreto. Fred (outro procurado) e Chico Bento costumam ficar no local".
Em outras denúncias, moradores reclamam das festas promovidas pelos bandidos. "(...) no local os traficantes participam do evento portando fuzis e pistolas. No dia 16 de fevereiro de 2021, eles fizeram um baile de carnaval que foi até às 10h da manhã". Outra denúncia, diz: "(...)eles ficam armados com fuzis e pistolas, escutando som altíssimo".
O bandido, que possui formação universitária e se identifica como comerciante, chegou a ser preso em abril de 2016, por policiais do Batalhão de Choque, em operação na comunidade do Jacarezinho. Mas, após ganhar o benefício do regime semiaberto, saiu do Instituto Penal Edgard Costa, em março de 2018, e ficou evadido do sistema.
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