As polícias Civil e Militar realizam uma operação, desde às 5h da manhã desta quarta-feira (19), na comunidade do Jacarezinho, Zona Norte do Rio.Marcos Porto/Agencia O Dia

Rio - Mais de mil agentes das polícias Civil e Militar realizaram, nesta quarta-feira, uma operação para ocupar as comunidades do Jacarezinho, na Zona Norte do Rio, e Muzema, na Zona Oeste. A ação policial foi um primeiro passo do novo programa do Governo do Estado que visa levar infraestrutura, educação, trabalho e segurança para as comunidades cariocas. Ainda sem mais detalhes sobre as próximas etapas do projeto, que só serão anunciadas pelo governador do Rio, Cláudio Castro, no próximo sábado, o programa gerou questionamentos por parte de cientistas políticos e antropólogos.
Capitão veterano do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), o antropólogo e especialista em segurança pública Paulo Storani acredita que uma ocupação policial pode ser o pontapé inicial para programas sociais de governo em comunidades dominadas pela criminalidade. Entretanto, ele afirma que é preciso mais do que polícia para que o projeto dê certo.
"Daqui em diante tudo vai depender dos desdobramentos que vão ocorrer ao longo do processo. Ele (o programa) foi lançado com uma grande operação, que é a primeira fase na ideia de implantação de qualquer atividade dentro de uma comunidade. Sobretudo, a partir do momento da implantação, você precisa acompanhar o que está acontecendo. Em termos da presença de outros atores do estado que não sejam as polícias, para que possa identificar as demandas da sociedade, da comunidade local, desenvolver projetos que atendam essas necessidades", pontuou Storani.
Em entrevista durante a operação desta quarta-feira, o porta-voz da PM, tenente-coronel Ivan Blaz, afirmou que há semelhanças entre o programa Cidade Integrada e o projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Para Storani, a aposta de Castro é um amadurecimento de antigos conceitos de destacamentos de polícia ostensiva e comunitária, mas há de se ter cuidado para que o novo programa não seja só mais um.
"A minha preocupação com as UPPs, na época, é que não havia ações integradas à ideia de pacificação de outros campos de ação do Estado, educação, cultura, esporte e lazer, assistência social. O que estamos vendo agora é o Governador do Estado apresentando um projeto que já tinha sido falado anteriormente de reativar as UPPS e, sem dúvida nenhuma, ela traz uma nova roupagem ao projeto anterior que terminou em fracasso, mas não por ponta da polícia, mas por conta da ausência do Estado. Mas acredito sim que há uma possibilidade de resgate, já foi provado isso", afirmou o antropólogo.
Coordenadora da Rede de Observatórios de Segurança do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), a cientista social Silvia Ramos teme que o Cidade Integrada seja mais um programa de policiamento em comunidades, sem atender às necessidades da população.
"A primeira coisa importante ao lançar um novo projeto de ocupação de favelas no Rio de Janeiro é justamente esclarecer o que esse projeto tem de diferente em relação ao projeto das UPPs, lançado em 2008 e que fracassou. Um dos lugares onde fracassou, inclusive, foi na favela do Jacarezinho. É muito importante que o governo e as polícias esclareçam exatamente o que tem de diferente daqueles pontos que deram errado no passado e custaram vidas. É preciso investir na prevenção da violência e isso não se faz com armas. Deveriam investir em qualidade de educação, de lazer, de cultura, saúde e oportunidades de emprego, estabelecendo intervenções urbanas em parcerias com moradores. Os moradores estão lá há décadas, é preciso ouvir eles que sabem das suas prioridades", declarou.
Na ação desta quarta, foram empregados 1.200 policiais, entre 400 agentes da Polícia Civil e 800 da PM.
"As operações de hoje se basearam na superioridade numérica, técnica e tática, que é comum em processos de ocupação militar, por isso a ausência de confrontos. O preocupante é o que se desdobra a partir daí. Como será a atuação dos efetivos que permanecerão ocupando essas áreas?", questionou o cientista político André Rodrigues, coordenador do Laboratório de Estudos sobre Política e Violência da Universidade Federal Fluminense (UFF).