Caio Telles Guimarães, de 20 anos, foi preso por um crime que a família diz que ele não cometeuDivulgação

Rio - Mais um caso envolvendo a prisão de um jovem negro, detido por um crime que não teria cometido, tira o sono de uma mãe em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. Preso desde o dia 22 de fevereiro, Caio Telles Guimarães traça a mesma história de Marcos Tavares Carreiro, 19, e Yago Correa, 21, ambos presos em fevereiro deste ano por crimes que também não teriam cometido.
Um rapaz tranquilo, que serviu por um ano o Exército Brasileiro e tinha o sonho de seguir a carreira militar. É assim que a mãe de Caio, Rosangela Telles, 60 anos, descreve o filho, preso minutos depois de sair de casa para ajudar um amigo em uma mudança. O jovem foi detido por policiais do São Gonçalo Presente na Rua Gregório de Mattos, no bairro Laranjal, em São Gonçalo, e apontado como o autor de um roubo de moto na Rua David Campista, próximo à RJ-104, por volta das 13h.
De acordo com a Polícia Civil, Caio foi detido em flagrante após roubar uma motocicleta em frente a uma loja de autopeças no mesmo bairro onde mora e encaminhado à 74ª DP (Alcântara), onde foi reconhecido por duas vítimas. No entanto, a família nega a versão e afirma que o rapaz estava em casa no momento do crime. De acordo com a mãe, às 13h Caio estava sentado com ela na sala montando um currículo e, assim que terminou o que tinha de pendente no documento, se despediu e disse que iria na rua debaixo ajudar na mudança de um amigo.
Imagens de câmeras de segurança de uma residência localizada na frente da casa de Caio mostram o momento em que o jovem, usando bermuda, chinelo e uma camisa no ombro, sai de casa às 13h30. O GPS do celular dele também mostra a distância percorrida por Caio assim que saiu de casa e o horário, confirmando o que foi registrado pelas câmeras.
Veja as imagens:
Rosangela lembra que, minutos depois da saída do filho, um amigo do jovem bateu no portão avisando que ele havia sido detido por policiais. "Tenho a mais absoluta certeza que ele não cometeu o delito porque ele estava comigo no momento que a vítima contou que havia sido roubada. Assim que eu soube, saí correndo, peguei o carro e foi até o local da ocorrência. Quando eu cheguei lá, havia várias testemunhas falando que meu filho era inocente".
A mãe relatou ainda que o dono da moto roubada chegou ao local da prisão logo depois e, quando questionado, disse que não tinha capacidade para reconhecer o autor do crime, pois assim que foi abordado abaixou a cabeça com medo da arma. "O Caio quando foi preso não estava nem com a moto e nem com arma, como pode ter dado tempo dele fazer isso que estão acusando ele se o crime acontece às 13h e 13h30 ele estava saindo de casa?".
Rosangela contou que, em seguida, alguns policiais levaram a vítima para um um canto da rua e, quando prestou depoimento na delegacia, a versão do homem já tinha mudado. "Foi aí que a vítima disse que estava reconhecendo meu filho. Eu tentei questionar e o policial mandou eu não me meter. Claramente foi uma manipulação, o Caio é uma pessoa correta, não tem nada que coloque em questão a conduta dele".
Abuso de poder e agressões
A mãe de Caio lembrou da forma como o filho estava sendo tratado. "Ele foi agredido, foi forçado a entregar e abrir o celular na minha frente, sem direito a nada. O policial estava tratando muito mal ele e a mim. Dizia de forma irônica coisas como: 'esse aqui é seu anjinho, seu santinho?'".
Os policiais também chegaram a questionar Caio por uma cicatriz na barriga, dando a entender que se tratava de uma cirurgia para remoção de uma bala. No entanto, Rosangela explicou que o filho teve um grave problema de saúde há alguns meses, onde precisou retirar cerca de 1 metro de intestino. "Eu tenho o laudo médico que pode comprovar tudo isso que estou falando", garantiu.
Em depoimento na audiência de custódia, Caio mencionou também que foi agredido com dois tapas nos rosto e levou um jato de spray de pimenta na face. Essas acusações serão apuradas junto à Comissão de Direitos Humanos da 8ª Subseção, afirmou o advogado que defende Caio, Douglas de Assis.
"O tempo todo ele estava dizendo que era inocente, não ofereceu resistência, apesar dos maus tratos. Ele falava para mim: 'mãe, não fui eu, eu não fiz nada de errado' e eu sabia que ele estava falando a verdade. Não tenho mais sossego, não durmo, não como, jogaram ele dentro de um presídio sem direito de defesa e sem prova contundente. Nós temos várias provas, mas não fomos ouvidos em momento nenhum", desabafou Rosangela.
Sonho de seguir carreira militar
Aos 20 anos, Caio queria investir no estudo para seguir carreira militar. A mãe diz que ele ficou muito feliz em poder servir o Exército nos últimos meses e que desejava retornar ao meio militar. Caio também estava na reta final do processo para tirar carteira de habilitação e aguardava a marcação da prova no Detran. Porém, se ele for convocado e ainda estiver dentro do presídio, vai perder todo o processo e o valor de R$ 2 mil investido nas aulas.
Além de ser disciplinado, a mãe relata que Caio prestava serviços à comunidade através de um grupo de percussionistas. Há mais de uma semana sem conseguir falar com o filho, Rosangela diz sofrer a dor de ver ele preso e sem conseguir fazer nada, mesmo tendo provas.
O advogado do rapaz disse aguardar o processo sair da custódia e ir para a Comarca de São Gonçalo, ainda sem data definida. "Vamos revogar a prisão preventiva juntando o GPS do celular dele e as câmeras de segurança, dizendo que essa prisão foi desnecessária. Já a família só poderá ver o Caio, preso no presídio de Benfica, quando a carteirinha de visitante chegar e o prazo é de até 60 dias", explicou.
Questionada sobre os relatos de agressão por parte dos policiais, a Polícia Civil informou apenas que o caso foi encaminhado à Justiça. O Segurança Presente confirmou que os agentes realizaram a prisão de dois suspeitos no bairro Laranjal, após eles serem identificados pela vítima como autores do roubo de sua motocicleta.
Após a abordagem dos policiais e o reconhecimento feito pela vítima, os dois homens foram conduzidos para a 74ª DP. Sobre a acusação de agressão por parte dos agentes, a coordenação da Operação Segurança Presente disse "não ter conhecimento da informação, mas repudia a ideia de ter seus agentes envolvidos em tais práticas e irá apurar para que o fato seja devidamente esclarecido."