Familiares de Jonathas morto no Jacarezinho, foram ao IML do Rio. Na foto, Carlos Roberto dos Santos, avô da vítima. Marcos Porto/Agência O Dia

Rio - A mãe de Jonathan Ribeiro de Almeida, de 18 anos, morto na noite desta segunda-feira na comunidade do Jacarezinho, Zona Norte do Rio, afirmou que estão tentando manchar a imagem do seu filho. Em nota, a Polícia Militar disse que o rapaz foi encontrado com drogas e uma réplica de pistola. No entanto, os familiares do jovem acusaram os policiais de forjarem o flagrante. A Corregedoria da PM está investigando o caso e a Polícia Civil informou que já recolheu a arma do agente envolvido na ação.
"O Jonathan era um menino exemplar, criado por mim, minha mãe e meu pai. Meu filho não tinha envolvimento com nada e estão querendo sujar a imagem do meu menino. Ele foi largado no chão com um tiro e ninguém deu socorro a ele, a não ser a comunidade. Não teve tiroteio, não teve nada, só executaram meu filho, foram embora e largaram ele lá no chão, como se fosse porco, como se ele não tivesse família. O Jonathan tem família, tem uma imagem, um menino de bem. Me sinto injustiçada pelo meu filho, por mim, pela minha índole e criação, pelo o que meu pai e minha mãe ensinaram pra gente. Eles estão caluniando a imagem do meu filho, da minha família. Meu filho não tinha nada a ver com o que eles estão falando", lamentou Monique Ribeiro.

A tia de Jonathan, Iziane, também contestou a versão da PM. "Como que eles estão alegando que meu sobrinho estava com arma e drogas, se eles só chegaram atiraram e foram embora? Meu sobrinho era um menino de bem. Vocês podem parar qualquer pessoa da comunidade pra perguntar isso. Eu to com o coração partido. E agora o que vai ser do filho dele? O que o Governo vai dar? O que a Cidade Integrada vai dar? Como que teve troca de tiros se a comunidade tava ocupada 24 horas? A polícia não respeita a gente, não respeita a nossa família".
O mecânico e auxiliar de serviços gerais, Carlos Roberto dos Santos, de 60 anos, foi categórico ao dizer que o neto não tinha envolvimento com crime. De acordo com ele, Jonathan não tinha nenhuma passagem pela polícia e estava prestes a se alistar no Exército.
"Tá aqui uma coisa clara é que só prevalece a voz deles [da polícia]. Quando morre um policial, todo mundo sofre porque eles tem mãe e família. Vocês têm que ver o que eles fazem na comunidade. Ninguém é contra deles estarem lá, mas é desse jeito que eles vão trazer paz e tranquilidade pro povo? Eles estão batendo até em criança, entrando na casa dos outros, fazendo o que querem. A verdade é só para o lado deles. Eles mataram meu neto, meu filho. Não vai dizer que meu filho era bandido, não. É mentira, vai procurar lá pra ver se meu filho era bandido. Ele tinha 18 anos e tava lutando para entrar no Exército, deixou um filho de 4 meses. A gente estava já com a festinha preparada para fazer", desabafou Carlos Roberto, que esteve no Instituto Médico Legal (IML) do Centro do Rio para reconhecer e liberar o corpo de Jonathan.
O avô do jovem também citou um "kit flagrante" que teria sido forjado pelos PMs do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq). "Não vou mentir, o mundo todo fuma maconha, é errado, mas agora chegar e dar tiro? Não foi nem esses caras do Choque que mataram ele, não. Foi um PM que veio da rua, não vou citar nomes pra não ser leviano, mas a prova vai aparecer. Eles vieram por trás da linha do trem, eu não vi, mas o relato é esse. Eles vieram e o garoto [Jonathan] estava conversando, se assustou, tentou correr e atiraram nele", disse ele, que acrescentou:
"Estão dizendo que ele tava com drogas, com réplica de arma. Toda vez que eles matam na comunidade, eles pegam e levam o corpo. Eles fizeram isso? Eles atiraram, correram, foram embora e quem levou o corpo foi o pessoal da comunidade. Eles não deixam fazer isso. Toda vez que eles matam alguém e tem a ampla certeza que o cara é um marginal, eles pegam o corpo, bota na viatura e carregam. Por que dessa vez a droga só apareceu agora na delegacia? Todo mundo sabe que existe kit flagrante e só não sabe quem não quer".
Carlos Roberto contou que tinha Jonathan como filho. "Ele tinha suas nuances de todo moleque, aqueles lampejos de moleque, mas nunca foi de má índole. Eu quero que alguém me prove que ele era de má índole, quero ver se ele tinha alguma entrada na polícia quando era menor ou maior de idade. Agora ele tinha arrumado uma família, tava trabalhando com a tia vendendo roupa. Ele não podia ter carteira assinada, porque tinha o alistamento do Exército, ia se apresentar", lamentou o avô em meio às lágrimas, que depois completou:
"Me sinto um lixo. Estou me sentindo um lixo sobre essa mentira que eles se propõem. Quero ver mostrarem uma foto ou se ele tinha alguma passagem pela delegacia. Se ele fosse [bandido], eu não estaria nem aí. Toda vez que morre alguém na favela, aparece um kit, é uma pistola, uma granada.Eu só quero que a verdade apareça. A justiça de Deus vai acontecer, mas a da terra é difícil".
O advogado que representa a família de Jonathan, Joel Luís Costa, disse que vai pedir que o Ministério Público do Estado do Rio (MPRJ) acompanhe o caso.
"Primeiro estamos fazendo um trabalho de acolhimento à família. Segundo o que a gente alinhou com a DH que fizeram a perícia, a Monique vai ser ouvida pela unidade da DH no IML. Mas a partir disso, a gente quer que ela seja ouvida pelo Ministério Público com o acompanhamento do Instituto, mas também pela defensoria pública para que a gente possa dar um tratamento mais imparcial a isso. A gente sabe que as perícias são feitas pela Polícia Civil e isso deixa a situação um pouco vulnerável no campo da imparcialidade para ser investigado. A gente vai avançar no processo de investigação, tanto é que esse caso vai ser acompanhado pelo Observatório Cidade Integrada, que monitora as ações executadas pelo Estado no Rio de Janeiro. Há diversos relatos de que ele não tinha arma, não tinha confronto, não tinha nada. Aí a polícia vem falando que ele estava com uma réplica de arma? Eu queria entender a lógica de usar uma réplica de arma dentro de uma favela. Quem vai se defender com uma réplica? Tem uma tentativa muito baixa de tentar justificar o ocorrido", disse ele, que também é coordenador do Instituto de defesa da população negra e morador do Jacarezinho.
O corpo de Jonathan será enterrado às 13h30 desta quarta-feira, no Cemitério de Inhaúma, na Zona Norte do Rio. 
Entenda o caso
Jonathan Ribeiro morreu após ser baleado no peito na comunidade do Jacarezinho. Imagens que circulam nas redes sociais mostram o jovem sendo socorrido por moradores em cima de uma motocicleta, entre duas pessoas. Eles e os familiares acusam policiais militares de terem dado o tiro. O rapaz foi levado para a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) de Manguinhos, mas não resistiu ao ferimento.
Logo depois que a morte foi confirmada, moradores fizeram um protesto na Avenida Dom Hélder Câmara. Em alguns vídeos divulgados na internet, é possível ver populares ateando fogo em caixas de papelão e montando barricadas em chamas em vários pontos da via, que chegou a ser interditada.
Em nota, a Polícia Militar informou que equipes do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) participaram de uma ocorrência no Jacarezinho, na qual um homem foi ferido. Segundo a corporação, os policiais disseram que não foi possível prestar socorro ao ferido em função da reação de um grupo de moradores que arremessaram pedras e garrafas em direção aos agentes.
Ainda de acordo com a PM, havia certa quantidade de drogas e uma réplica de pistola com Jonathan. "As equipes comunicaram a ocorrência de imediato à Delegacia de Homicídios da Capital (DHC). Paralelamente, o comando da Corporação determinou instauração de procedimento apuratório na Corregedoria Geral da PM. As armas empregadas na ocorrência já estão à disposição da perícia".
A Polícia Civil informou que a DHC foi acionada e apura as circunstâncias da morte de Jonathan Ribeiro. A perícia foi realizada no local e a arma do policial militar foi recolhida para exame pericial. Familiares e testemunhas serão ouvidas pelos agentes.
Colaborou Marcos Porto
 
Colaborou Marcos Porto