Na hora, é a perda — de tempo, de oportunidades ou de boas notícias — que costumamos lamentar. E o que ganhamos pensando assim?Arte: Kiko

A última quinta-feira amanheceu chuvosa. E eu já sabia disso antes mesmo de abrir os olhos de fato. O barulho dos pingos d’água entremeava o meu despertar, promovendo um diálogo entre o meu corpo e a minha mente: “Fica mais um pouco aqui nas cobertas, vai”.
Quem venceu o impasse? O corpo! Na véspera, eu havia trabalhado pelo jornal até pouco antes da meia-noite, quando terminaram as partidas de futebol, e naquele dia eu retornaria ao batente somente à tarde. Assim, aproveitei mais um pouco o aconchego. E só quando acordei realmente e olhei o relógio, eu me dei conta de que havia dormido mais do que de costume.
Aliás, já constatei que o tempo nublado me ajuda a prolongar o sono — a luz do sol não entra diretamente no quarto com o anúncio de que há dia lá fora. E descobri que, às vezes, é preciso apreciar também o céu cinzento e a sua introspecção, e não apenas a euforia dos momentos ensolarados.
Vi, então, as mensagens no grupo do WhatsApp das minhas amigas do pilates. Elas contavam que havia chovido muito. Aliás, se a minha professora tivesse conseguido vaga para eu fazer aula naquela manhã, teria perdido o horário. Ficaria sem o pilates, mas teria conquistado um tempo a mais de descanso em casa.
Naquele meu despertar vagaroso, fiquei pensando que, às vezes, a gente precisa mudar a lógica do perde e ganha da vida. Colocar o pé no freio nem sempre é desperdiçar tempo, mesmo que todos estejam acelerando ao redor. Assim como nem toda folga precisa da rua para ser aproveitada de fato.
Também pensei que pode haver algo bom até nos desencontros da nossa trajetória. Geralmente, no entanto, a gente só se dá conta do benefício um pouco depois. Na hora, é a perda — de tempo, de oportunidades ou de boas notícias — que costumamos lamentar. E o que ganhamos pensando assim?
Só sei que, na manhã da última quinta-feira, eu aproveitei um café tomado vagarosamente, ouvindo os últimos pingos de chuva que caíam no quintal. Nesse momento, não chovia mais; eram apenas aqueles resquícios de água que ficam nos parapeitos e vão se dissipando lentamente. E constatei que, às vezes, o corpo está esperando que a gente se perca um pouco da rotina para ganhar uma verdadeira pausa.