Vitimas do cirurgião Bolivar Guerrero estiveram na DEAM de Duque de Caxias, na manhã de hoje. Na foto, Fernanda AlmeidaReginaldo Pimenta / Agencia O Dia

Rio- A Polícia Civil ouviu outras cinco mulheres que denunciaram por lesão grave o médico cirurgião Bolivar Guerrero da Silva, 63 anos, preso acusado de manter uma paciente em cárcere privado no Hospital Santa Branca, em Duque de Caxias. Elas compareceram na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) na manhã desta terça-feira (19).
Uma delas foi a paciente Vanessa Miranda, 41 anos, operada pelo médico em 2013. Ela alega que sofreu fortes dores após a operação e que Bolivar agiu de forma grosseira.

“O meu trato com ele foi mastectomia total mas não foi feito e eu saí da cirurgia com queimação e muitas dores, não conseguia ficar deitada e nem em pé. Eu voltei nele e falei que tinha algo de errado porque os pontos estavam inflamados, mas ele foi muito grosso e rude comigo, falou que era coisa da minha cabeça, teve um dos pontos que ele arrancou bruscamente, ficou um buraco e infeccionou”, contou.

Ainda segundo a vítima, o médico se negou a fornecer comprovantes da cirurgia. “Ele disse que não era necessário o comprovante e eu fiquei fazendo tratamento com ele na clínica onde teve uma Operação Beleza Pura que descobriu que os medicamentos que ele usava estavam fora da validade”, disse.

A operação a que Vanessa se refere foi realizada pela Polícia Civil em 2010. Na ocasião, oito médicos foram presos, entre eles o cirurgião equatoriano. Ele foi acusado de aplicar um medicamento para preenchimento facial sem registro na Anvisa, além de usar outros produtos falsificados. Segundo as investigações, o produto pirata era fabricado em Goiás e distribuído em clínicas de estética no Rio.
Vanessa Miranda foi operada pelo médico em 2013 e prestou depoimento nesta terça-feira (19) na delegacia - Reginaldo Pimenta/Agência O DIA
Vanessa Miranda foi operada pelo médico em 2013 e prestou depoimento nesta terça-feira (19) na delegaciaReginaldo Pimenta/Agência O DIA

Vanessa contou ainda que até hoje possui um ponto aberto e que já procurou outros médicos, mas que ninguém aceitou mexer no local. Além disso, ela conta que está desempregada pois é impossibilitada de realizar tarefas simples devido ao inchaço dos seios.

“Até procurei outros médicos e ninguém quis botar a mão devido a situação, eu não posso trabalhar, varrer casa, fazer nada, porque as mamas incham, ficam vermelhas. Eu, inclusive, to com medo, porque vai fazer 10 anos, eu tenho que trocar e eu não sei como fazer. Eu conheci ele porque estava em busca de preço, não tinha condições de pagar um cirurgião renomado, eu paguei na época por volta de R$ 7.800, mas o combinado não foi feito. Eu pedi para fazer ressonância, e ele me chamou de louca, de maluca. Eu quero que a justiça seja feita para que outras mulheres não sejam vítimas dele, porque eu estou sofrendo até hoje”, desabafou.

Outra vítima é Fernanda Almeida, 24 anos, ela também prestou depoimento nesta terça-feira (19) e alega ter ficado com os seios deformados após uma cirurgia de prótese de mama com o cirurgião.

"Quando eu saí do centro cirúrgico, meu peito saiu deformado, com a cicatriz da minha auréola toda torta, tipo quadrada, estava um peito meu em cima e outro embaixo, eu questionei a doutora e ela disse que meu peito não tinha saído de lá daquele jeito, mas eu tinha fotos, só que depois de um tempo descobri que ela não era médica, porque ela não teve postura de médica", lamentou.

Fernanda Almeida informou ainda que pagou R$ 8.100 na primeira cirurgia e R$ 3.100 no segundo procedimento de reparo, mas que teve o sonho e a autoestima destruídos com o resultado.

"Era um sonho, eu tenho 24 anos, não uso roupa decotada, é difícil, fica um em cima e um embaixo, nitidamente. Eu imaginava minha autoestima lá em cima, mas não foi isso que aconteceu", lamentou.

A vítima disse ainda que uma prima também realizou procedimentos cirúrgicos com ele, mas na barriga, e que ela também lida com imperfeições.

Outra vítima, também esteve acompanhada do marido na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam). Assim como as outras duas. De acordo com a delegada da distrital, Fernanda Fernandes, as mulheres têm procurado a delegacia após a repercussão do caso.

O médico foi encaminhado ao Presídio de Benfica, na Zona Norte do Rio, ainda nesta terça-feira (19). A polícia também pediu uma perícia no Hospital Santa Branca, que pode até ser fechado, dependendo do decorrer das investigações.

Defesa
Apesar dos depoimentos, cerca de 20 pacientes protestaram utilizando panelas em frente a Deam em defesa de Bolivar Guerrero Silva. Aos gritos elas chamavam as vítimas de mentirosas. Elas alegam que a acusação de cárcere privado é falsa. 

Cerca de 20 pacientes protestaram batendo panelas em frente a delegacia em defesa de Bolivar Guerrero Silva - Reginaldo Pimenta/Agência O DIA
Cerca de 20 pacientes protestaram batendo panelas em frente a delegacia em defesa de Bolivar Guerrero SilvaReginaldo Pimenta/Agência O DIA

A empresária, Tamires Silva, 32 anos, relata ser paciente do doutor há 13 anos e que nunca teve problema algum.

“Eu já operei três vezes, sou paciente dele há 13 anos, minha mãe já operou, nós que viemos aqui tivemos cirurgias bem sucedidas, eu acredito que fatalidades podem acontecer com qualquer cirurgião, ainda mais um que opera de cinco a seis pacientes por dia de segunda sexta, isso é estatística”, disse.

Tamires ainda alega ainda que a vítima que o acusa de cárcere privado não está em estado grave. “Ela está internada, dançando em vídeos do tiktok, como que uma paciente em estado grave tava dançando, o que aconteceu é que ela queria alta ou ser transferida, mas não quis assinar alta revelia. E outra, ela tem acompanhante, fica com telefone, não está em cárcere privado”, disse.

Outra paciente, a comerciante Girlene Marinho, 32 anos, relatou ter realizado um procedimento há menos de dois meses e que foi muito bem atendida.

“Eu gostei muito, não tenho nada a reclamar, o pós operatório foi tranquilo, ainda estou fazendo drenagem, da internação até o pós operatório está tudo ótimo. Foi a primeira cirurgia que fiz com ele, mas fui indicada por outras amigas”, contou.

A modelo de digital influencer, Juliane Alves, 27 anos, também relatou uma experiência positiva com o cirurgião plástico.

“A minha experiência, tanto as das minhas irmãs e amigas foram excelentes, tive toda assistência, não tenho o que falar dele, ele deu toda assistência possível, inclusive, uma das minhas irmãs que tem pressão alta passou mal e foi super bem atendida. Minha outra irmã fez uma reparadora recentemente, ela estava do lado dessa paciente que denunciou, e ela não estava em cárcere privado, isso é mentira!”, relatou.

O que diz o médico

Na página oficial do cirurgião Bolivar Guerrero Silva, que conta com mais de 40 mil seguidores, sua equipe publicou uma nota negando a acusação e repostaram uma sequência de depoimentos positivos de outras pacientes sobre o médico.

Confira a nota na íntegra:

“Boa tarde, meninas, o dr Bolivar foi prestar um depoimento na delegacia. Ele não estava mantendo paciente nenhuma em cárcere privado, ela estava fazendo curativo e sendo assistida no hospital dele por ele, porém ela queria ser liberada sem ter terminado o tratamento e ele como médico seria imprudente de libero-la. Ele disse que poderio liberá-la se ela assinasse a alta à revelia (documento ao qual a paciente se responsabiliza por qualquer coisa que acontecer após sua liberação) e ela não quis assinar, ele disse que liberaria somente se ela o assinasse, Como ela não assinou ele não liberou, pois o intuito dele é prestar toda assistência a paciente ate ela está recuperada.

Além disso, ela estava com um curativo especial para acelerar a cicatrização. Esse curativo só pode ser manipulado por pessoas capacitadas como técnicos em enfermagem ou enfermeiros. Em breve o doutor irá se explicar.”


O que diz o hospital

O Hospital Santa Branca também se manifestou sobre o caso e alegou que as acusações de cárcere privado nas dependências da unidade são infundadas.

"Tal crime decorre do verbo encarcerar, que significa deter, ou prender alguém indevidamente e contra sua vontade. No crime de cárcere privado, a vítima quase não tem como se locomover, sua liberdade fica restrita a um pequeno espaço físico, como um quarto ou um banheiro. Com 43 anos de funcionamento, essa Unidade desconhece tal prática dentro do seu estabelecimento, sempre buscando zelar pela saúde física e mental de seus pacientes, prezando pelo direito de ir e vir dos mesmos, amparado por um equipe multidisciplinar profissional, centros cirúrgicos e CTI com 20 leitos operando 24 horas por dia. Nossas salas cirúrgicas são locadas. Repudiamos quaisquer práticas criminosas que nos foram indevidamente atribuídas! Tal acusação é absurda!", disse em nota.

Ainda em nota, a unidade explica que o médico Bolivar Guerrero não pertence ao quadro societário da empresa e deu detalhes sobre a internação da paciente.

"Data da internação da paciente 01/06/2022. Acomodação: apartamento privativo com direito a acompanhante. Paciente recusa-se a sair da unidade, (transferida). Todo custo da paciente é mantido pelo cirurgião, inclusive com atendimentos externos". finalizaram

CREMERJ

Em nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado informou que apura o caso. "Tendo conhecimento do caso pela imprensa, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu sindicância para apurar os fatos. Todo procedimento segue em sigilo de acordo com os ritos do Código de Processo Ético-Profissional."

O caso

O cirurgião plástico equatoriano Bolivar Guerrero Silva, de 63 anos, foi preso nesta segunda-feira (18) sob acusação de manter uma paciente em cárcere privado. A denúncia aponta que a paciente era mantida em cárcere privado na unidade de saúde por cerca de dois meses após um procedimento estético na barriga dela ter dado errado. A família foi quem procurou a delegacia para falar sobre a situação da mulher.

A paciente realizou uma abdominoplastia no início de março e precisou voltar em junho para se submeter a mais três intervenções. No retorno, contudo, o procedimento apresentou problemas e ela teve complicações com um dos pontos da barriga necrosado. Os familiares acusam o médico, que administra a clínica de cirurgia plástica, de impedir a mulher de ser transferida da unidade particular para outro hospital.