Com muita tristeza, indignação e solidariedade, porque eu sei o que essas pessoas, esses familiares passaram. É muito difícil perder uma pessoa amada, ainda mais em uma situação como essa. Ninguém está preparado para perder alguém que se ama e de uma forma tão rápida. Existem pessoas morrendo agora em três dias! Famílias dizimadas em três dias. A minha mãe passou 21 dias internada, mas existem pessoas que morrem muito rápido e ninguém se prepara para isso. A minha tristeza é por estar nesse número. A minha indignação é porque não tem sido feito nada para ter uma medida mais eficaz para impedir o avanço da doença e a minha solidariedade é uma compaixão por todos que sofreram o que eu sofri.
Todos os momentos são difíceis, porque essa doença não dá folga. Você não pode ficar perto de quem está doente e de quem você ama. É uma sensação de impotência muito grande, ainda mais quando ela vai se agravando e aí vem a necessidade de intubar, porque é um momento de muita tensão e angústia. A pessoa que você ama está ali sozinha e você não pode estender a sua mão e nem pode acompanhar e ajudar aquela pessoa a passar por esse sofrimento. Realmente, você fica impotente.
Claro. A primeira vacina surgiu um mês depois dela ter morrido. Se ela tivesse tomado a vacina, isso não aconteceria. Dá uma sensação de 'puxa vida! Só mais um pouquinho, ela sobreviveria'. Se a vacina fosse implantada no Brasil há mais tempo, com certeza a realidade seria outra.
No último momento que eu estive com a minha mãe, ela já estava inconsciente, mas eu guardo como se fosse a nossa despedida o momento em que ela voltou do hospital, quando fez os exames. Ela passou na minha casa e nós conversamos. 'Mãe, você vai voltar logo' e nos despedimos. Ela não voltou e esse é o momento que eu guardo. Ela estava consciente e pudemos dizer uma para outra o quanto nós nos amávamos (chora)... Também disse o quanto a amava quando ela estava inconsciente e por mais que eu tenha dito de várias outras maneiras, não foi a mesma coisa. Para mim, esse último encontro é o que eu guardo.
Sempre muda, porque quando você perde o pai ou a mãe, é muito forte na vida de qualquer pessoa. Pai e mãe tem que estar dentro de você e de certa forma, você acaba ganhando uma força maior. Você tem que buscar em si mesmo o apoio, os valores e toda a presença daquela pessoa amada que estava ali ao seu lado e que podia ouvir, tocar e falar. Agora você só pode sentir. É um processo de crescimento, de amadurecimento e não é fácil. É de muita dor e que também fortaleceu o amor e a capacidade de amar o outro. É um processo doloroso.
Tudo mudou. A pandemia mudou a rotina de todas as famílias e todas as pessoas. Nós não temos mais uma rotina normal como era antes da pandemia. O distanciamento permanece e por mais que continuemos nos falando por telefone, por mensagens e por vídeos, não é a mesma coisa. Há a ausência das pessoas, do toque e do abraço. Todos nós estamos aprendendo a lidar com isso, independente da perda da minha mãe. Só que agora estamos resolvendo coisas que era ela quem cuidava e resolvia. Desde coisas mais simples como os problemas cotidianos até as questões mais complicadas. Ela morreu muito próximo do Natal, no dia 20 de dezembro. Nosso Natal foi distante por conta já do isolamento e muito triste por não tê-la.
A vida passa rápido. Isso foi uma coisa que meu pai falou antes de falecer: 'a vida é linda, mas é rápida e aproveitem'. A grande lição que a gente pode tirar é de valorizar a própria vida. É o nosso bem maior e quantas pessoas não estão dando o valor a esse bem maior? A questão de cuidar da saúde nesse momento não é só a questão física, é cuidar da saúde mental e espiritual. Dar valor às coisas boas também, porque quando a gente vai embora, a gente não leva as coisas que tem, a gente leva o que a gente é. Estamos aprendendo a dar valor para nossa essência.
Não. Graças a Deus, ninguém tão próximo, mas a gente consegue sentir a perda das pessoas que estão ao seu redor. Não tem como ficar passível diante de tanto sofrimento. Você sente a perda de muitas pessoas e o perigo é eminente.
Eu vejo a novela 'Vida da Gente'. O engraçado é que esta semana mesmo passou uma cena em que a personagem cantava uma música que ela cantou muito para nós, eu e meus irmãos. Essa é uma das formas: rever os trabalhos. Mas, eu oro muito e converso muito com ela de forma silenciosa nas minhas meditações e nas minhas orações. É uma comunicação só de um lado, não consigo ouvir as respostas, mas a gente consegue sentir o amor e a presença. Tem que aprender lidar com as projeções emocionais.
Acho que essas pessoas deveriam olhar mais para o ser humano. Pensa que poderia ser com seu pai ou com a sua mãe ou uma avó, um irmão, um filho ou uma pessoa querida que está passando por esse sofrimento. De certa forma é um dos seus irmãos, porque todos nós somos parte de uma família, de uma grande fraternidade e o que acontece neste mundo é importante para todos nós. Quem tem a responsabilidade de estar em um cargo de governo num momento como esse tem que fazer o possível e o impossível para salvar vidas e para cuidar da saúde da população. A saúde tem que ser um bem acima de partido político ou de uma ideia ou ideologia. A saúde é um direito de qualquer ser humano.
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