Os passeios no Alto da Boa Vista, até de bonde, quando a grana andava curta...As esticadas até Sepetiba, Guaratiba, Angra, Ilha Grande, Petrópolis, Teresópolis, Friburgo. Ah, Buenos Aires, Punta Del Leste, Roma, Miami... Ah, Delta do Parnaíba! Tudo virou recordações. Não sei qual o crime que cometi para continuar preso, sem direito a HC
Luarlindo Ernesto, repórter do Jornal O DIA. - Daniel Castelo Branco
Luarlindo Ernesto, repórter do Jornal O DIA.Daniel Castelo Branco
Ainda cumpro as diretrizes das autoridades médico/sanitárias. Ainda estou recolhido na caverna, lavando as mãos, higienizando tudo, derrubando insetos com spray, usando máscaras até durante os banhos. Quando vou passar por exames médicos, ou às consultas, saio com minha garrafinha com álcool, luvas e a máscara... Bolas, deixei de sair para meu lazer, nunca mais fui acampar no clube, no Recreio. Praia? Never ! Me sinto um urso hibernando.
Mas, a televisão mostra a população fazendo de tudo para uma contaminação em massa. Cheguei a conclusão que, somente não serei mais uma vítima do vírus por milagre. E, não acredito em milagres.
Após o desabafo, afinal aqui não é lugar de desabafar e nem mesmo a página das lamentações, vamos ao que interessa. Sou cria do bairro imperial da cidade, São Cristóvão. Bem ao lado da Praça da Bandeira. Nasci em agosto de 1943. Meu pai, boêmio, gozador, escriturário de empresa multinacional, tinha banda de chorinho, tocava violão e batizou aqui, o escriba, de Luarlindo.
Ele dizia que o nome foi escolhido por influência de um índio, amigo dele. Bem, carrego o nome até os dias de hoje. Não me vinguei nas filhas na hora dos registros no cartório civil, ou batismo, como queiram.
Não sei se foi o DNA, ou outra coisa qualquer. Mas sou, confesso que também boêmio, gozador, músico que não deu certo, escritor (ou escriturário?) quase razoável, pai, avô, quase bisavô (bateu na trave), atualmente prisioneiro da covid-19. Logo agora, aos 78 do último tempo, gostaria de estar livre, leve e solto. Livre? Tô preso em casa, tentando chegar aos 79.
Ah, os passeios no Joá, na Barra da Tijuca, no Recreio. Os passeios no Alto da Boa Vista, até de bonde, quando a grana andava curta...As esticadas até Sepetiba, Guaratiba, Angra, Ilha Grande, Petrópolis, Teresópolis, Friburgo. Ah, Buenos Aires, Punta Del Leste, Roma, Miami... Ah, Delta do Parnaíba! Tudo virou recordações. Não sei qual o crime que cometi para continuar preso, sem direito a HC.
Caramba, voltei aos lamentos. Desculpem. Subconsciente é coisa séria. Igualzinho aos nervos: não conseguimos enganá-los. Acho melhor voltar a rever os seriados do Kojak, Rin Tim Tim e M.A.S.H. Quase esqueci do Vigilante Rodoviário, protagonizado pelo patrulheiro Carlos, com seu possante Simca Chambord e seu fiel cão Lobo, um pastor alemão mais esperto que meu neto Vitor.
Tenho certeza que o amigo José Hélio, lá da Tijuca, iria adorar ver uns capítulos. Eu lamento não ter gravado, em K7, a novela 'O Direito de Nascer', do cubano Félix Caignet, escrita em 1940. Também, quem tinha um gravador? Eu nem sabia que existia. Já pensaram, nessa época de clausura? Não estou me referindo às versões das emissoras de TV, entre 1964 e 1965...
Sim, a da Rádio Nacional, nos anos 1950, com mais de 300 capítulos. Paulo Gracindo era o intérprete principal. A cidade ficava em silêncio, o trânsito diminuía. A novela bateu recordes de audiência. O patrocinador fez pressão para a emissora esticar os capítulos. O Brasil parava e o consumo de água, como diziam na época, diminuía. Será porque ninguém tomava banho naquela hora? Tô desconfiado... Audiência maior do que A Voz do Brasil e o Programa César de Alencar. Bateu até a Hora da Ave Maria! Lembram? Bom para ouvir nos tempos de distanciamento social.
Podemos chorar com o drama, sem que ninguém saiba. Bolas, homem também chora. Concordam ?
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