Antonio Marcos Barreto, Secretário Municipal de Meio Ambiente de Mangaratiba-RJDivulgação

Com a finalidade de regulamentar o Decreto Estadual 46.890/2019, que ainda está em vacatio legis, e que instituirá o novo Sistema Estadual de Licenciamento e demais Procedimentos de Controle Ambiental – SELCA, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONEMA) aprovou no último dia 24 de junho de 2021, em sessão plenária, a minuta da nova Resolução CONEMA 92/2021, que revoga e substitui a Resolução 42/2012. Embora a norma tenha por objetivo simplificar alguns procedimentos e permitir que os municípios exerçam o licenciamento pleno, autoavaliando seu corpo técnico, também traz algumas inconsistências no que se refere especialmente à competência material administrativa para licenciar e a competência fiscalizatória.
Sobre a competência para licenciar, a Lei Complementar 140/2011, que regulamenta o art. 23 da Constituição Federal, prevê em seu artigo 9º, inciso XIV, alínea “a” que o município promoverá o licenciamento local de atividade e/ou empreendimentos que causem impacto ambiental de âmbito local e que este conceito seria definido pelos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente. No uso desta atribuição, então, o CONEMA editou a nova resolução de nº 92/2021 e busca definir em seu art. 1º o que seria impacto local, remetendo, em um primeiro momento, àquelas tipologias descritas no anexo I. Contudo, no parágrafo primeiro do mesmo artigo, a resolução traz regra de exclusão, ou seja, o que não seria de competência do município licenciar, como, por exemplo, aqueles localizados em dois ou mais municípios, sujeitos ao EIA/RIMA etc.
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Ao ser redigida dessa forma, a resolução gera uma incerteza e insegurança jurídica no que se refere ao licenciamento, pois o enquanto o caput do artigo 1º menciona que impacto local será o que está descrito nas tipologias listadas no anexo I e, portanto, conduzindo à conclusão de que o município somente poderia licenciar o que ali conste, em sentido oposto o parágrafo primeiro, de forma instável, menciona as únicas atividades para as quais o município não poderá licenciar, gerando um nítido conflito entre os dispositivos. Não obstante, a Lei Federal 6.938/1981, que instituiu o SISNAMA, precisamente em seu confere ao órgão municipal a atribuição para exercer o controle ambienta de atividades que ocorram nos limites geográficos do município, privilegiando o impacto local, de modo que o critério de competência administrativa para licenciar não deveria ser a presença, ou não, no anexo I da Resolução, mas sim a capacidade de produzir impacto local.
Outro ponto de instabilidade gerado pela nova Resolução CONEMA 92/2021, a ser publicada, é a fiscalização ambiental e que merecerá cautela em sua aplicação, já que em uma primeira análise, aponta para a restrição da atribuição fiscalizatória do ente municipal. Primeiramente, no art. 4º, a citada resolução prevê que o exercício do Poder de Polícia Ambiental será exercido nos termos da Lei Complementar 140/2011, sendo importante destacar que essa lei instituiu o dever de cooperação, deixando claro que não optou pela hierarquização das estruturas, não há uma verticalidade. Entretanto, nos parágrafos do artigo 4º da CONAMA 92 traz inovação no sentido de que uma eventual medida cautelar (embargo, interdição etc.) aplicada pelo ente que não licenciou a atividade, somente permanecerá hígida se assim concordar o órgão que o licenciou, que decidirá pela existência, ou não, dos requisitos autorizadores da atuação cautelar, em detrimento da equipe de fiscalização que constatou o fato in loco, com evidências materiais. Em outras palavras, a decisão de aplicação da medida cautelar será daquele órgão que não constatou, se for distinto daquele que licenciou. Outro ponto sensível, e que merece toda atenção, é a previsão do parágrafo 5º do artigo 4º da Resolução CONEMA 92.
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Quando qualquer órgão ambiental se depara com um ilícito administrativo que ofenda o bem jurídico ambiental, mesmo que não seja situação que necessite de medida cautelar, pode aplicar auto de infração. Na verdade, não pode, deve, por determinação do artigo 70 da Lei Federal 9.605/1998, ainda que não seja o órgão originariamente competente para promover o licenciamento. A Lei Complementar 140/2011, em seu artigo 17, parágrafo 3º, traz apenas uma prescrição: se o órgão licenciador originário tiver aplicado infração pelo mesmo motivo constatado, então prevalecerá este auto de infração e sucumbirá o eventual auto aplicado por órgão diverso, ou seja, apenas a atitude positiva (infração) do órgão licenciador é capaz de afastar outra atitude positiva (infração) de órgão diverso.
Dessa forma, por uma interpretação a contrario sensu, a Lei Complementar 140/2011 deixa evidente que somente um auto de infração (do órgão licenciador) é capaz de fazer outro auto de infração (de órgão diverso) ser afastado, concluindo-se, então, que a inércia do órgão licenciador, sua opção pela não infração, não é suficiente para a derrocada do auto de infração aplicado por fiscalização que tenha constatado o ilícito. Porém, a CONAMA 92/2021 inovou ao trazer a possibilidade de que a opinião do órgão licenciador pela inexistência de infração prevalecerá sobre a constatação fática de outro ente, privilegiando conduta negativa (não infração) em detrimento de fatos, evidências e constatações, quando, na verdade, o dever de provar que não houve a infração deveria ser de quem cometeu o ilícito, em virtude dos princípios do Poluidor-Pagador e Usuário-Pagador.
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Esses são os principais pontos de toque da resolução, que ainda necessitará de análise ao longo do tempo, mas esperamos que tais incertezas e instabilidades sejam guiadas e sandas com o tempo, tendo como norte a eficiência da Administração Pública e, acima de tudo, o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, previsto no artigo 225 da Constituição Federal.

Antonio Marcos Barreto é Secretário Municipal de Meio Ambiente de Mangaratiba/RJ