Gilberto Braga - Opinião - O Dia Reprodução de internet

A história nos mostra que medidas de auxílio à população de baixa renda são indispensáveis e tendem a se tornar irreversíveis com o tempo. Encaixa-se nessa situação o repaginado Auxílio Brasil, que agora em agosto, saltou de R$ 400 para R$ 600. A princípio, o acréscimo de R$ 200 vale somente até dezembro, mas o presidente Jair Bolsonaro já declarou que se reeleito, vai tornar o novo valor definitivo.

Para turbinar ainda mais o efeito financeiro e eleitoral dessa verba, o governo está terminando a regulamentação para permitir que os beneficiários do Auxílio Brasil possam fazer empréstimos consignados (com desconto em folha no recebimento) ainda em agosto de até R$ 2 mil. Dessa forma, potencializa-se o valor que o cidadão poderá manipular num curto espaço de tempo em até R$2.600. Para muita gente verá isso como uma ajuda que caiu do céu, sem se dar conta para o risco de endividamento.

Se por um lado, diante das desigualdades econômicas do país, da inflação elevada, dos juros exorbitantes, do desemprego e dos problemas causados pela covid-19, o pagamento de ajudas financeiras aos brasileiros em situação de precariedade social é correto; por outro, está longe de ser uma solução para a reinserção dessa população no mercado de trabalho. Ao contrário, tende a gerar acomodação e até a multiplicar o número de pessoas necessitadas.

Por isso, se debate tanto se o pagamento desse tipo de ajuda deve ser contínuo ou provisório, as condições de elegibilidade, o tempo de permanência, os estímulos e oportunidades para o cidadão voltar ao mercado de trabalho. Sabe-se que não se deve deixar o nosso povo passar fome, mas não se pode criar uma zona de conforto eterna para a sobrevivência sob a tutela do Estado, sem quaisquer contrapartidas do governo e dos próprios beneficiados para reverter essa situação.

A falta de uma “porta de saída” tende a criar uma situação de dependência contínua e vira moeda política, fazendo com que a resposta correta de curto-prazo se torne um erro de longo prazo.

A explosão de pessoas dormindo na fila do Cadastro Único sugere o fracionamento das famílias necessitadas para criar novos beneficiários matriculados, inflando a quantidade de auxílios pagos a um mesmo núcleo familiar. Esse efeito demonstra a precariedade das regras de enquadramento e a lentidão e despreparo do governo federal em lidar com uma situação de calamidade social.

A nova possibilidade de contrair empréstimo consignado nessa faixa de renda dos beneficiados do Auxílio Brasil cria um risco de bomba relógio, na medida em que os níveis de juros praticados no valor das prestações vão levar a uma nova situação de penúria em pouco tempo, logo ali na frente, mas depois das eleições programadas para esse semestre. Bom, mas isso será um “novo problema” para o próximo governo lidar, seja ele qual for.

O risco de endividamento recorde com a extensão do empréstimo consignado para os beneficiados do Auxílio Brasil é tão grande, que para surpresa geral, os bancos tradicionais declararam que não vão implementar essa linha de operação. Só os bancos digitais e oficiais, como a Caixa e o Banco do Brasil, devem embarcar nessa aventura.

A concessão de auxílios sociais permite que o governo ataque uma questão emergencial, mas não nunca será uma solução permanente se não vier acompanhada de um programa mais amplo de cidadania em todos os seus aspectos. Da maneira como esta parece ser um auxílio sem saída.

Gilberto Braga é economista do Ibmec