Economista Raul VellosoDivulgação/Inae

A pergunta que mais circula na mídia econômica é: dado que a antiga âncora fiscal, o chamado teto de gastos, literalmente morreu, é realmente preciso que o novo governo introduza uma nova âncora para não perder o controle da gestão macroeconômica, e, se fosse assim, qual seria ela?

O problema do teto é que ele foi fixado igual à taxa de inflação anual decorrida, mas a despesa pública da União é extremamente rígida. Com base nos dados de 2021, calculo que 96,9% dos gastos não financeiros totais têm tal característica, daí serem chamados de gastos obrigatórios.

Como tal, existe algum tipo de legislação que faz com que eles tendam automaticamente a crescer mais que a inflação, a menos de mudanças legislativas difíceis de aprovar. Não é por outra razão que em cada ano que passou desde a criação do teto (2016), o peso dos gastos obrigatórios seguiu subindo, enquanto o dos discricionários só caiu, tal que hoje estes estão se aproximando de zero.

Enquanto decide que nova regra definitiva tentará aprovar no Congresso para valer a partir de 2024, o governo negocia uma emenda constitucional que lhe conceda o perdão pela iminente violação do teto em 2023 (pelo gasto total crescer bem mais do que a regra do teto permitiria), e lhe autorize, em adição, a ampliar programas e regras que lhe parecem fundamentais, como a de assegurar um Bolsa-Família de R$ 600 mais R$ 150 por criança, entre outras medidas prometidas na campanha eleitoral.

Turbinado de credibilidade pelo início do mandato, imagino que em breve Lula aprovará uma medida que o salvará no curtíssimo prazo, certamente a um custo altíssimo em termos de verbas adicionais entregues ao manejo dos titulares de mandato que hoje dão as cartas nesse processo.

Quanto à regra de maior duração que deveria substituir o tal do teto, não vejo muito futuro para as propostas que andam circulando por aí. De minha parte, sinto a falta de um diagnóstico apropriado que viabilize a criação de uma saída que de fato resolva o gigantesco problema que temos nas mãos.

Nesta altura, permito-me apenas chamar a atenção de todos que a saída terá de vir do equacionamento dos gigantescos déficits previdenciários tanto na União, como nos demais entes, cujo financiamento espanta para longe as possibilidades de aumentar os investimentos e, por consequência, o tão ansiado crescimento do PIB. Por enquanto, apenas chamo a atenção de todos que, de 1987 a 2021, o peso dos gastos previdenciários no total despendido pela União aumentou cerca de 170%, passando de 19,2% para 51,8% do total, algo obviamente absurdo. A nova âncora terá de ser o equacionamento disso.

Paralelamente, vale ressaltar que, em segundo lugar, vem o aumento do peso dos tão necessários gastos em assistência social (como o Bolsa-Família), cujo peso de 1987 para 2021 passou de 9,1% para 16,4% do total, um aumento de não menos que 80%. O chocante mesmo foi constatar que os investimentos em infraestrutura desabaram 86%, passando de 16% para 2,2% do total.

Por falta de espaço, explicarei em detalhe o caminho do ajuste a ser trilhado, em uma próxima oportunidade. Meu Estado natal, o Piauí, está concluindo um processo de ajuste como o que a União precisa fazer.
Raul Velloso é consultor econômico