Por thiago.antunes

Rio - Maio de 1928. Uma nova epidemia de febre amarela volta a assolar o Rio de Janeiro, após ter sacrificado 60 mil vidas entre 1849 e 1907 e ser considerada praticamente extinta da então capital brasileira. Corta para março de 2017. Após quase 90 anos, o Estado do Rio entra mais uma vez no mapa da doença, desta vez na versão silvestre, o que desafia a comunidade científica e deixa a população em alerta.

Dois casos foram confirmados ontem em Casimiro de Abreu, na Região dos Lagos. O pedreiro Watila Santos, de 38 anos, que morreu no sábado, e o servidor Alessandro Valença Couto, 37, internado desde então no Hospital dos Servidores, no Rio, entram para as estatísticas da doença que tem assustado o Brasil nos últimos três meses. Outros 17 casos suspeitos continuam sendo avaliados, e 19 foram descartados no estado.

CLIQUE PARA VER O INFOGRÁFICO COMPLETO

Por conta disso, força-tarefa foi montada ontem no entorno de Casimiro, localizado entre duas reservas biológicas, a União e a Poço das Antas — esta última, considerada um santuário ecológico, refúgio de micos-leões-dourados. Um milhão de doses da vacina já começaram a ser distribuídas, com apoio dos bombeiros, em 12 dos 25 municípios do entorno, que engloba as regiões dos Lagos, Serrana, Norte e Noroeste Fluminense e Metropolitana.

As medidas foram tomadas pela Secretaria Estadual de Saúde logo após confirmar os dois primeiros casos da doença e cinco dias depois de determinar a vacinação em massa nos 92 municípios fluminenses.

O subsecretário estadual de Vigilância em Saúde, Alexandre Chieppe, explicou que a medida foi tomada após a morte de um macaco com febre amarela em Leopoldina (MG). Mas com a descoberta dos casos em Casimiro, longe da divisa com Minas Gerais e Espírito Santo, a pasta teve que mudar a estratégia.

No Sana%2C em Macaé%2C vizinho a Córrego da Luz (Casimiro) onde houve os casos%2C vacinação começou segundaDivulgação / Secom Macaé

Ele descarta surto e pede calma à população:“O risco de a febre amarela chegar à capital e à Região Metropolitana ainda é muito baixo”. Uma nota técnica a ser divulgada hoje advertirá: quem vive em outras regiões, estados ou países deve evitar a ida até essas cidades se não estiver vacinado há, pelo menos, 10 dias.

Ao todo, 47 dos 92 municípios do estado estão no cinturão epidemiológico montado desde janeiro e reforçado ontem. Nos demais municípios, incluindo a capital, a vacina só começa na última semana de março, como já previsto. 

Sintomas parecidos com os da dengue e chicungunha

Apesar de a febre amarela silvestre ser transmitida pelos mosquitos Haemagogus e Sabethes, típicos de regiões de mata, diferentemente da versão urbana, causada pelo Aedes aegypti e considerada erradicada no Brasil desde 1942, os sintomas são os mesmos. E podem ser confundidos como viroses com as quais cariocas e fluminenses já estão, forçadamente, “familiarizados”: dengue, zika e chicungunha.

A maioria das pessoas infectadas pelo vírus da febre amarela apresenta sintomas leves, como febre e cefaleia, com duração média de dois dias. “Mas, em alguns casos, o quadro clínico pode ser moderado, apresentando dor muscular, nas articulações, náuseas e, em alguns fenômenos agudos, o paciente pode ter hemorragia causando icterícia, um sintoma que deixa a região dos olhos, pele e mucosas com aspecto amarelado”, explica a infectologista Sílvia Oliveira, do Hospital Rios D’Or.

Segundo ela, não existem tratamentos específicos. “Geralmente o tratamento visa a melhorar os sintomas e, em casos mais graves, pode haver reposição do sangue perdido nas hemorragias, diálise para os rins afetados e controle geral das complicações”.

Primata morto, uma pista

Um mal-estar causado pelo desencontro de informações marcou o anúncio oficial da febre amarela no Rio. “O estado divulgou a confirmação dos casos sem nos informar. Agora, a maior dificuldade é logística. A área rural é extensa e de difícil acesso”, disse o secretário de Saúde de Casimiro, Ibson Dames. Segundo ele, o esqueleto de um primata foi achado ontem, próximo de onde ocorreram os casos, e será analisado.

Hospital de campanha em praça

Em Casimiro de Abreu, com 40 mil habitantes, além de todas as unidades de saúde funcionando das 8h às 19h, será montado um hospital de campanha na praça principal. O objetivo é vacinar toda a população entre seis meses e 60 anos. Equipes móveis, com apoio de técnicos da Emater-Rio, vão até as casas de moradores da Zona Rural, principal área de risco.

Ontem à tarde, o prefeito Paulo Dames recebeu o secretário estadual de Saúde, Luiz Antônio de Souza Teixeira, para traçar as estratégias. Hoje, às 9h, haverá reunião com prefeitos de 12 municípios da região.

Na vizinha Macaé, o prefeito Dr. Aluízio disse que espera vacinar 70% dos 200 mil habitantes até segunda-feira. Unidades de saúde vão funcionar 24 horas por dia e a campanha também vai às escolas.

Você pode gostar