Rio - Febre amarela pega de humano? O macaco também transmite? Pessoa gripada pode tomar a vacina? Estas e outras dúvidas são respondidas por especialistas e autoridades em saúde pública ouvidos pelo DIA. O mais importante, garantem, é se proteger com a vacinação. E, principalmente, nada de pânico.
O que é febre amarela?
A febre amarela pertence à classificação das arboviroses, assim como a dengue, zika e o chicungunha, mas os sintomas são muito diferentes. É causada por um vírus (flavivírus) e transmitida por mosquitos chamados de Haemagogus e Sabethes (em região silvestre) e Aedes (em área urbana). Apesar das duas formas não há diferença de sinais e sintomas, e o paciente pode ficar com o corpo todo amarelo.
Até o momento não há relatos de transmissão de febre amarela direta entre pessoas. O vírus ocorre em locais de clima tropical sendo mais comum na América do Sul e na África. É considerado um vírus perigoso, pois pode causar formas graves de doença, mas a maioria das pessoas não apresenta sintoma e evolui para a cura.
Sérgio Cimerman, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI)
Quais são os fatores de risco?
Pessoas que nunca entraram em contato com o vírus da febre amarela ou nunca foram vacinadas possuem risco de contraí-la quando viajam para locais em que a doença exista. O risco é maior para idosos com mais de 60 anos e qualquer um com imunodeficiência, como portadores do HIV/Aids, transplantados e pessoas com doenças reumatológicas que usam imunossupressores.
Sérgio Cimerman
Quais os sintomas da febre amarela?
A maioria dos infectados não apresenta sintomas. Quando surgem, são febre baixa, dores musculares em todo o corpo, principalmente nas costas, dor de cabeça, dor nas articulações, náuseas, vômito e fraqueza.
Esses sintomas duram entre três e quatro dias e vão diminuindo até desaparecer, mas alguns pacientes podem ter sintomas mais graves cerca de 24 horas após a recuperação do quadro simples ou passar pelo ciclo da doença de forma rápida, podendo atingir vários órgãos do corpo, principalmente o fígado e os rins. Os sintomas dessa fase são febre alta, icterícia (amarelidão) pela inflamação no fígado, vômitos com sangue, urina escura, sangramentos de pele e olhos avermelhados. Em casos mais graves o paciente pode evoluir muito mal e morrer.
Sérgio Cimerman
Há o risco de o Rio viver um surto da doença em áreas urbanas?
Há probabilidade é baixa, mas precisa-se tomar cuidado principalmente quando a cidade fica próximo de áreas com matas.
André Ricardo Ribas de Freitas, médico epidemiologista e professor da faculdade São Leopoldo Mandic.
Os macacos transmitem febre amarela?
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Não, os únicos transmissores do vírus da febre amarela silvestre no Brasil são os mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes. Além de serem tão vítimas quanto os seres humanos, macacos e outros mamíferos auxiliam na detecção precoce de possíveis surtos. Matá-los é brutalidade injustificável.
Isabella Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm)
Quais as espécies de macacos que servem de hospedeiro para o vírus?
É importante a população se conscientizar de que o macaco não é o transmissor da doença, e, sim, um ‘termômetro’. O mosquito Aedes aegypti é o real transmissor da febre amarela na cidade, então ele é quem deve ser combatido. Quanto aos primatas, todos são suscetíveis à doença, principalmente o bugio, que é a espécie mais sensível e que, na Cidade do Rio, existem apenas três deles, que habitam a Floresta da Tijuca.
O mico e o macaco-prego são um pouco mais resistentes, então acabam nos avisando um pouco tarde da doença. É muito comum quando acontecem esses surtos as pessoas agredirem esses animais, mas temos que venerá-los, na verdade, porque eles é que nos mostram se a doença está presente.
Jefferson Pires, veterinário do Centro de Reabilitação de Fauna da Estácio
Quais as diferenças entre febre amarela silvestre e urbana? Só o transmissor?
O vírus não muda. Na área urbana quem mantém o ciclo é o homem e o Aedes Aegypti e, na área silvestre é o Haemagogus e os Sabethes, além dos macacos que vivem nas regiões, sendo as principais espécies — bugio, prego e o sagui.
André Ricardo Ribas de Freitas
As medidas de prevenção são iguais?
Sim, por meio da vacina. Na área urbana conseguimos fazer o controle do Aedes, e na área silvestre isso já é mais difícil. Vacina continua sendo a forma mais importante nas duas situações.
André Ricardo Ribas de Freitas
Quem deve tomar a vacina contra a febre amarela?
A vacina está indicada a partir dos 9 meses de idade. Porém, em condições de surto, poderá ser antecipada para os 6 meses de idade. A aplicação é por via subcutânea. No Brasil, são recomendadas duas doses. Em crianças, a primeira dose aos 9 meses e uma dose de reforço aos 4 anos.
Crianças maiores de 5 anos de idade não vacinadas, ou adultos não vacinados: deve ser aplicada uma dose, com um reforço em 10 anos. Maiores de 5 anos com uma dose realizada antes dos 5 anos de idade: uma dose de reforço.
Sérgio Cimerman
Devemos fazer uma avaliação antes de tomar a vacina?
Há situações especiais na qual a indicação da vacinação deverá ser avaliada pelo seu médico, que vai expor qual o risco e o benefício de receber ou não a vacina. Alguns exemplos que seu médico deve avaliar: crianças entre 6 e 8 meses; pessoas com idade acima de 60 anos; gestantes e mulheres amamentando crianças menores de seis meses.
Sérgio Cimerman
Tomei a vacina há mais de dez anos. Estou desprotegido(a)?
Depende. Se você tomou apenas uma dose, sim, deve receber a segunda. Caso já tenha recebido as duas, independentemente do tempo, não é necessária nova aplicação. Deve-se destacar que não é preciso reiniciar o esquema se houver atraso, basta completar.
Isabella Ballalai
Idosos podem se vacinar?
Depende. Estudos indicam que maiores de 60 anos têm mais chances de apresentar eventos adversos importantes, especialmente quando vacinados pela primeira vez. No entanto, em situações de surtos, o benefício da imunização pode ser superior aos riscos de reações. Cabe ao médico definir o que é melhor para o paciente.
Isabella Ballalai
E as crianças menores de nove meses?
A criança entre seis e nove meses pode ser vacinada apenas se morar ou viajar para regiões onde estejam ocorrendo muitos casos da doença em humanos. A dose, contudo, não será considerada válida para fins de rotina porque a interferência de anticorpos maternos e outros fatores a tornam menos eficaz nesta faixa etária.
Ao completar nove meses, desde que já tenham se passado 30 dias da aplicação antecipada da vacina, a criança deverá receber a primeira dose prevista no calendário do Programa Nacional de Imunizações. A segunda será dada aos 4 anos.
Isabella Ballalai
Tenho alergia ao ovo. Posso receber a vacina?
Pessoas que têm alergia grave (anafilaxia) ao ovo de galinha e seus derivados não devem receber a vacina contra febre amarela. Mas atenção: intolerância, que causa desconforto estomacal e gases, é diferente da anafilaxia, que pode levar até a morte.
Isabella Ballalai
Se a pessoa estiver gripada, pode mesmo assim tomar a vacina?
Gripe sem febre nas últimas 24 horas não contraindica a vacinação, mesmo que ainda persistam sintomas de tosse, nariz entupido ou dor de garganta.
Isabella Ballalai
Que reações podem ocorrer após a vacina?
São raras, mas quando ocorrem, necessitam ser avaliadas pelo médico. Reação muito comum (ocorre em 4% dos pacientes): dor de cabeça; vermelhidão, hematomas ou inchaços no local da agulhada, que podem ocorrer em até dois dias depois da vacina. Reação comum (ocorre em 4% dos pacientes): náusea, diarreia, vômito, dor muscular, febre e cansaço, que podem ocorrer após o terceiro dia da vacina.
Reação incomum (menos de 0,1% dos pacientes): problemas neurológicos, como infecção no sistema nervoso, que ocorrem de 7 a 21 dias depois. Reação raríssima (poucos casos descritos no mundo): dor abdominal e dor nas articulações, icterícia (amarelão), falta de ar, urina escura, hemorragias, perda da função do rim, que pode ocorrer em até 10 dias.
Sérgio Cimerman
Como se pode evitar a febre amarela?
A forma mais eficaz de evitar a febre amarela é por meio da imunização. A vacina é constituída de vírus vivo atenuado, isso quer dizer que ele foi enfraquecido para não causar doenças em pessoas saudáveis. O vírus age estimulando o organismo a produzir a própria proteção contra o vírus e o efeito aparece cerca de 10 dias após a injeção. Apresenta eficácia acima de 97,5%, e a proteção persiste por mais de 40 anos.
Sérgio Cimerman
Como a doença deve ser tratada?
Tem um curso clínico frequente para casos graves. Por esta razão os casos suspeitos (pessoas com sintomas sugestivos e vindos de áreas de epidemia) devem sempre procurar um serviço de saúde para fazer o diagnóstico o mais rápido possível. A hospitalização é necessária e muitas vezes em unidades fechadas como (CTIs e UTIs) para acompanhamento e tratamentos das complicações.
O tratamento é de suporte para manutenção dos órgãos vitais, e não existe antiviral específico testado e seguro até o momento. Não é aconselhado ficar em casa com tratamento para sintomas sem avaliação médica.
Leonardo Domingues Romeiro, reumatologista da Sociedade de Reumatologia do Rio de Janeiro
Quando procurar o pronto-socorro?
Se houver sintomas como febre, icterícia (pele e olhos amarelados), dor de cabeça, dores musculares, náuseas e vômitos e hemorragias; caso haja epidemia na região onde mora ou foi visitar, existe a necessidade de avaliação de emergência para o diagnóstico.
Exames laboratoriais são necessários para confirmação e também para ajudar no tratamento das complicações. Todo caso suspeito deve ser notificado pela equipe de saúde para controle da doença. O diagnóstico rápido e a vacinação podem ajudar na prevenção de casos graves e na mortalidade.
Leonardo Domingues Romeiro
Por que alguns casos evoluem para morte e outros não?
A suspeita e diagnóstico com notificação rápida e precoce são importantes para hospitalização e início de cuidados intensivos. Alguns pacientes possuem alteração no sistema imunológico e podem fazer complicações graves, como hepatite e insuficiência renal (lembrar que a vacina, que é de vírus vivo atenuado, é contraindicada em pacientes com doenças autoimunes e uso de imunossupressores), que aumentam a mortalidade.
O sistema de saúde desde a prevenção, passando pela vacinação, diagnóstico e até o tratamento com suporte avançado em unidade de cuidados intensivos, deve funcionar para tentar diminuir a mortalidade. É uma doença grave com mortalidade relativamente alta; entretanto algumas mortes podem estar associadas ao diagnóstico tardio ou falta de cuidados intensivos.
Leonardo Domingues Romeiro
Qual o índice de mortalidade da febre amarela?
A mortalidade varia segundo as fontes bibliográficas e regiões estudadas. De uma forma geral, 15 % dos pacientes apresentam formas graves e de 5% a 51% podem evoluir com morte (fonte: Ministério da Saúde, hotsite sobre febre amarela). Esta variação ocorre por vários fatores, como a virulência do organismo, resposta imunológica do hospedeiro e cuidados adequados em saúde.
Leonardo Domingues Romeiro