Gerente do Porto das Carnes, Fernando Martins, vai adaptar o funcionamento do restaurante
Gerente do Porto das Carnes, Fernando Martins, vai adaptar o funcionamento do restauranteFotografia / Reginaldo Pimenta
Por Jorge Costa*
Rio - Após a prefeitura do Rio de Janeiro ter anunciado o aumento das medidas restritivas, representantes dos sindicatos de bares e restaurantes se manifestaram contrariamente às decisões tomadas, afirmando estarem surpreendidos e que a ação irá provocar um grande prejuízo, sem efetividade para o combate à doença. Especialistas endossam as restrições, mas mencionam que elas deveriam ser estendidas por um tempo maior. Alguns comerciantes são favoráveis, mas com ressalvas.

A partir desta sexta-feira (05), bares e restaurantes terão suas atividades reduzidas e não poderão funcionar após às 17 horas, ficando permitido o atendimento de forma delivery. Quiosques, boates e vendedores ambulantes ficam proibidos de exercer suas atividades até 11 de março.

O gerente do restaurante Porto das Carnes, Fernando Martins, terá que adaptar o estabelecimento para reduzir o horário, que antes ficava aberto até 21h e agora realizará o atendimento até 17h.
Questionado sobre as restrições anunciadas pelo prefeito Eduardo Paes, ele afirmou que elas podem surtir efeito, mas para conter efetivamente o avanço da covid-19, é necessário uma fiscalização forte. Ele pondera, contudo, que haverá prejuízos.

“Se o poder público fiscalizar, eu acredito que vai conter bastante a transmissão do coronavírus. Agora, vai gerar um prejuízo para a gente. Por isso, a covid-19 precisa ser controlada para que tenhamos de imediato a nossa retomada das atividades. O sacrifício só vale a pena se as medidas tiverem êxito”, afirmou Fernando.
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A vendedora Maria Jeliene Araújo, também conhecida como Jú, vai precisar interromper as atividades por uma semana devido as restrições adotadas pela prefeitura. Ela, que trabalha na barraca 89, em Ipanema, na Zona Sul do Rio, ganha seu sustento com a venda lanches e bebidas na praia, e lembrou que ficou sete meses sem trabalhar por conta da pandemia, sem receber nenhuma contrapartida da prefeitura. 
"Estamos muito chateados por tudo que está acontecendo, porque eles nos deram as costas. Todo mundo precisa pagar as contas, eu trabalho aqui há 28 anos e tenho a sensação de que nós somos esquecidos. Se é pra proibir, tinha que interromper tudo. Os transportes, as igrejas, os bailes... Bem ou mal, aqui é o nosso ganha pão, se trabalharmos, ficamos com dinheiro, caso contrário, ficamos sem nada!" desabafou Maria.
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Alguns donos de estabelecimentos fizeram um abaixo assinado concordando com as medidas, mas cobrando também algumas exigências por parte dos governantes. O restaurante Bistrô da Casa liderou o movimento, e em publicação nas redes sociais, defendeu que o poder público estenda a oferta de crédito para o setor e reduza as taxas de impostos cobradas, bem como maior flexibilização da jornada de trabalho e maior subsídio.


O que dizem os representantes dos Bares e Restaurantes

O Sindicato de Bares e Restaurantes do Rio (SindRio) e a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) se manifestaram contrariamente à decisão da prefeitura. Ambas as entidades publicaram notas repudiando as medidas adotadas.

Para o presidente do SindRio, Fernando Blower, as medidas restritivas não vão surtir o efeito desejado apenas interferindo no funcionamento dos bares e restaurantes. Ele disse estar preocupado, mencionando que o setor está no limite de sua capacidade financeira.

“Se acreditássemos que isso faria diferença, seríamos os primeiros a apoiar integralmente. Mas sabemos que a única coisa que teremos é mais demissões, dívidas e quebra de empresas. Os bares e restaurantes estão abertos com as mesmas normas desde agosto do ano passado, nesse tempo a contaminação subiu, desceu e subiu novamente, sendo que as regras não mudaram. Isso mostra que não há correlação direta entre o funcionamento dos estabelecimentos e a oscilação da covid-19”, afirmou.

O presidente da Abrasel, Pedro Hermeto, publicou um vídeo declarando repúdio ao decreto de hoje restringindo o funcionamento de bares e restaurantes na cidade. Além disso, ele menciona que estuda a adoção de medidas judiciais para defender o setor e ações para responsabilizar o prefeito em caso de eventual prejuízo.

“O prefeito erra de uma maneira irresponsável ao nos eleger como vilões para a escalada dos indicadores da pandemia Brasil à fora. A notícia, sem aviso prévio, atinge o setor de maneira avassaladora”, afirmou Pedro.

Especialistas defendem a medida, mas afirmam que ela é insuficiente e apontam riscos

Especialistas procurados pelo DIA mencionam que a decisão de restringir as atividades é importante, mas o ideal é que as medidas fossem estendidas em até 14 dias. Além disso, elas reforçam que as ações são fundamentais para diminuir o número de óbitos e a taxa de ocupação dos leitos.

A pesquisadora Chrystina Barros, do Centro de Estudos em Gestão de Serviços de Saúde, da UFRJ, defende que a ação é válida, mas que qualquer liberação antes de 14 dias é prematura. “As experiências no mundo mostram que o período mínimo ideal é de 14 dias. Porque existe um tempo entre a contaminação pelo vírus e a manifestação dos sintomas. As medidas mais restritivas não deixam de ser bem vindas, mas elas podem ser insuficientes”, afirmou.

Questionada pelo DIA sobre a diminuição recente do número de óbitos, ela ponderou que o Rio tem os piores indicadores do país e que essa redução não diminui a importância das medidas restritivas.

“É fato que o Rio de Janeiro tem em torno de 200 óbitos por cada 100 mil habitantes, enquanto São Paulo, que é o estado com o maior número de pessoas, tem em torno de 130 para cada 100 mil.O número acumulado mostra que o estado do Rio tem o pior indicador. Nós estamos dessincronizados do que está acontecendo no resto do país, mas infelizmente não há a certeza de que não tenhamos uma terceira onda ou uma sobreposição da segunda onda acontecendo por aqui”, concluiu.

Para a médica, geriatra e psiquiatra Roberta França, as medidas são necessárias. Ela alerta que a diminuição na média de óbitos não significa que o número de contaminados tenha diminuído, e menciona que o governo não está conseguindo controlar a pandemia.

“Por mais que as pessoas fiquem chateadas, essa é a nossa realidade. Se nós não tivermos medidas sérias neste momento, vamos voltar a pagar com cada vez mais vidas. É absolutamente necessária essas medidas até que efetivamente tenhamos uma vacinação em massa”, disse Roberta.

*Estagiário sob supervisão de Yuri Fernandes