Gean Loureiro (à esquerda) com a diretoria do Conectar em reunião com o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, na última quinta-feira
Gean Loureiro (à esquerda) com a diretoria do Conectar em reunião com o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, na última quinta-feiraDivulgação
Por Bernardo Costa
Liderado pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP), o consórcio Conectar, formado por mais de 2.500 cidades brasileiras para aquisição de vacinas, pode concretizar nesta semana a compra de 30 milhões de doses do imunizante Sputnik V, da Rússia. O mais provável é que a compra seja efetuada pelo Ministério da Saúde com o apoio das doações financeiras de empresas privadas enviadas ao consórcio, informa Gean Loureiro, presidente do Conectar e prefeito de Florianópolis, nesta entrevista ao DIA. Segundo ele, a hipótese de compras diretas de imunizantes pelos municípios ainda depende da regulamentação da lei federal14.124/2021, que autorizou a aquisição pelas prefeituras e estados: "Mas ainda é preciso que sejam definidas as regras do jogo. Nesse caso, os governos locais poderiam definir seus grupos prioritários? Haveria dedução das doses que depois seriam entregues pelo Ministério da Saúde? São perguntas que o governo federal ainda precisa responder".
O DIA: O mais concreto até o momento é a aquisição de 30 milhões de doses da vacina russa Sputnik V pelo consórcio das cidades. Como estão essas tratativas?
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GEAN LOUREIRO: Fizemos contato direto com o Fundo Soberano Russo, que é um órgão semelhante ao Banco Central Brasileiro e só ele pode fazer a negociação. À princípio,eles negociam apenas com os governos federais,mas entenderam o tamanho do nosso consórcio, que representa 150 milhões de habitantes e mais de 2.500 cidades do país, e aceitaram dar início às discussões. Na semana passada, tivemos retorno deles com a possibilidade da entrega de cinco milhões de doses até junho e o restante sendo repassado mensalmente até atingirmos 30 milhões de doses no fim do ano. Com base nisso, procuramos o Ministério da Saúde, pois ainda há alguns entraves a serem resolvidos.

Como quais?
Temos a necessidade de regulamentação da lei federal que prevê a compra de vacinas pelos estados e municípios. É preciso que seja definido como se comportaria o Programa Nacional de Imunização (PNI) com a compra de vacina com recursos próprios das prefeituras. Se haveria dedução das entregas previstas pelo Ministério da Saúde para as cidades que adquiriram as doses ou não. Também é necessário definir o apoio logístico do governo federal para fazer as vacinas chegarem aos estados e, posteriormente, aos municípios.
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O que ficou definido na reunião da última quinta-feira com o governo federal?
O secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, informou que será disponibilizado pelo governo federal o apoio logístico, mas disse que essa hipótese de compra pelos municípios ainda está sendo discutida. Ele informou que está sendo avaliada uma eventual aquisição conjunta de vacinas pelo Ministério da Saúde e pelo consórcio Conectar. Essa é a hipótese mais provável no momento.
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Como isso se daria?
Nós disponibilizaríamos a oferta que recebemos do governo russo ao Ministério da Saúde, que faria a compra e nós ajudaríamos aportando os recursos que já recebemos e que ainda vamos receber de empresas privadas. Essa parceria garantiria a distribuição a todos os municípios brasileiros em uma quantidade maior da que está prevista pelo PNI no momento. Com isso, poderia ser iniciado um debate para a inclusão de segmentos que ainda não estão contemplados no PNI, como os profissionais da educação básica. A expectativa é que essa aquisição conjunta seja concretizada nesta semana.
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Caso isso não aconteça, qual será a alternativa?
A outra seria regulamentar a lei federal para que fiquem claras as regras do jogo, para evitar o risco de confisco das doses compradas pelas cidades pelo governo federal quando elas chegassem ao aeroporto. Não se sabe, por exemplo, se as doses iriam apenas para os municípios que aportaram dinheiro para a compra, e que, depois, teriam dedução das doses que seriam entregues pelo Ministério da Saúde. São dúvidas que ainda pairam no ar. O importante para o consórcio é que as vacinas cheguem aos municípios, a forma é o de menos.
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Há previsão de regulamentação da lei?
Ainda não sabemos o prazo e como se dará a regulamentação. Pois, nessa hipótese das compras pelas cidades, algumas receberiam as vacinas e outras não, e o recebimento seria proporcional ao valor que cada cidade aportou. Nesse caso, os municípios poderiam definir os grupos prioritários para aplicação das doses? Haveria dedução das doses que o governo federal distribuiria posteriormente? Tudo isso precisa ser regulamentado e definido, são perguntas que precisam ser respondidas pelo governo federal. A lei saiu, mas é preciso que haja um decreto agora para regulamentar essa lei.
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No caso da compra conjunta, que o senhor disse ser o mais provável, haveria aporte financeiro dos municípios?
Não, nessa fase inicial seriam os valores das doações privadas feitas para o consórcio.
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Essas doações atingiram que valor até o momento?
A primeira que recebemos foi da Natura no valor de R$ 4 milhões. Há contatos com aproximadamente outras 10 empresas, mas há cláusulas de confidencialidade e só haverá divulgação quando as empresas autorizarem. Se tivermos propostas mais concretas de compra, a partir dos esclarecimentos dessas questões que ainda precisam ser esclarecidas pelo governo federal, isso andará de forma mais rápida. Hoje, temos uma parceria com o Banco Santander, que é uma conta de passagem. O recurso é depositado e, se por acaso não houver a compra de vacinas, ele retorna para o doador.
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Hoje haverá uma nova reunião do consórcio com o Ministério da Saúde. Qual será a pauta?
Vai ser atualizada aos prefeitos a programação de distribuição das vacinas compradas pelo governo federal, vamos esclarecer também a parceria que estamos tendo com o Ministério da Saúde na identificação de quais medicamentos são necessários para termos compras coletivas para todos os municípios. Devemos lançar um edital para uma compra muito maior que possa garantir menor preço e mais fornecedores participando da licitação, o que vai significar economicidade para as cidades.
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Um dos problemas graves hoje é a carência do kit intubação. O consórcio também está atuando para prover esses insumos?
Essa questão vem sendo coordenada pelo Ministério da Saúde. O que vamos tratar com eles nessa próxima reunião (hoje) é sobre os medicamentos que eles não têm previsão de compra e que as cidades estão necessitando. Vamos saber deles os medicamentos que estão faltando no mercado, pois eles já tentaram fazer grandes compras. Isso para trabalharmos em conjunto, pois não podemos trabalhar separadamente numa questão desse volume e dessa importância. Nessa reunião também será definido um representante do Ministério da Saúde para ser o interlocutor do consórcio, que se constitui num grande canal de comunicação para fazer com que as informações cheguem às prefeituras.
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Além da negociação com a Rússia pela Sputinik V, há contatos feitos pelo consórcio para aquisição de outras vacinas?
O primeiro passo que tivemos foi fazer uma reunião com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opam), em que foram repassados os laboratórios farmacêuticos, seus representantes comerciais e os preços praticados no mercado. Além disso, fizemos busca ativa, com contatos com o Butantan e a Fiocruz, e conversamos com o embaixador da China no Brasil para estabelecermos contato com os laboratórios Sinovac e a Sinopharma. Também procuramos a embaixada americana, em função das vacinas da AstraZeneca estarem em solo americano, onde há um quantitativo que não está sendo utilizado. Tudo isso para acelerarmos a programação do PNI e o envio de doses para os municípios e também para viabilizarmos uma eventual compra pelo consórcio.