Delegado Allan Turnowski, secretário de Polícia Civil do Rio de JaneiroDaniel Castelo Branco

Por Bruna Fantti
Rio -- A Operação Exceptis, que deixou 28 mortos no Jacarezinho, incluindo um policial civil, completa um mês, neste domingo. Em entrevista exclusiva para O DIA, o secretário de Polícia Civil, Allan Turnowski, afirma que uma semana antes da ação recebeu um recado da cúpula do Comando Vermelho, de dentro da cadeia, para não realizar mais operações.
Além disso, destaca o trabalho que a corporação tem feito contra milicianos e diz que há uma articulação entre a maior facção do Rio e setores da sociedade para gerar resistência à atuação das polícias. O secretário também respondeu questões sobre a perícia, resgate de feridos e investigações. Confira:
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O DIA: Por que a Operação foi chamada Exceptis, que significa Exceção?
Allan Turnowski: : Os nomes das operações são dados pelos delegados que as planejam. Isso não vem
para a cúpula. A minha visão, quando eu vi o nome, foi uma questão de respeito: a gente está fazendo uma
operação que está dentro da exceção, então, era para passar essa mensagem. Quando você tem uma investigação de uma delegacia de proteção à criança e ao adolescente, que identifica tráfico de drogas e corrupção de menores, isso se traduz como estado de excepcionalidade. Com certeza, foi para mostrar que
a investigação se traduzia nessa linha.
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DIA: Essa foi a operação mais letal da história da polícia, com 28 mortos. De acordo com especialistas, esse
número alto de mortes ocorreu porque a polícia trabalha com a lógica do confronto. O senhor concorda com essa afirmação?
Turnowski: Não. A polícia reage a uma ação do criminoso. No Jacarezinho o que se viu foram criminosos atirando para matar policiais. Logo no início, nós tivemos um policial ferido com um tiro na cabeça, que veio a óbito, atrás de um muro, com uma seteira [tipo de muro usado para apoiar armas]. Nós demoramos para passar aquele beco, que você faz em um minuto andando, 1h30. Isso quer dizer que houve uma resistência muito forte em relação à polícia. Temos inúmeras operações em que não há mortos, há presos. 
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DIA: A reação no Jacarezinho foi diferente em relação a outras operações?
Turnowski: Foi além do normal. Muito mais do que uma operação da polícia em uma comunidade, o que gente vive hoje é uma batalha entre o Estado do Rio e uma facção criminosa. Na verdade, essa facção é politizada, é articulada. E é muito claro você ver essa diferença: a gente tem uma força-tarefa contra milícia, instituída pelo governador Cláudio Castro, que já causou o prejuízo de mais de R$1,5 bilhão aos milicianos. Mais de 700 milicianos presos. E, tivemos 12 mortos em uma única ação; cinco outros, em outra ação. Quando houve a morte desses criminosos milicianos, em nenhum momento teve crítica. Em nenhum momento explodiu nas redes sociais essa articulação. Pelo contrário, fomos até elogiados. Hoje, essas 17 mortes estão arquivadas. 
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DIA: O senhor tem provas de que exista uma articulação?
Turnowski: Há um discurso politizado de determinados especialistas em Segurança pública que bate exatamente com o mesmo discurso, que vem de dentro da cadeia, de lideranças do Comando Vermelho. Que é: ‘vocês não combatem milícia, só vão em nossas áreas, então a gente não vai aceitar mais operação na área do Comando Vermelho’. Tem um recado que veio uma semana antes da operação, de dentro da cadeia. 
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DIA: O que dizia esse recado e qual o significado dele?
Turnowski: ‘Nós não vamos aceitar mais operações em nossas áreas’; eu tenho os dados de inteligência com essa mensagem. Ou seja, fica claro que o recado dos traficantes é para que eles não se rendam. O que a polícia sente hoje é que há uma articulação desses traficantes [com setores da sociedade], como se fosse uma defesa dessa facção criminosa para que eles não fujam [do confronto]. Pois quanto maior a confusão, melhor para o negócio deles. ‘Se vocês matarem um inocente a gente coloca em xeque a operação e eles não voltam mais’. Essa é a mensagem deles. E, você vai para o discurso politizado, nas redes sociais, que é o mesmo da facção: a polícia não combate milícia. É algo que não passa de um discurso para a defesa de um território que é comandado pela maior facção criminosa do Rio. Sempre que a gente age nesses territórios, é feito um discurso por organizações, muitas delas com participação de parentes de criminosos, que dão entrevistas.
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DIA: O senhor fala do Rumba, que é liderança no Jacarezinho e irmão da Sandra Sapatão [apontada como chefe do tráfico no Jacarezinho]? 
Turnowski: No caso dele, acho parcial a imprensa ouvir como especialista e representante da comunidade alguém que tem na família uma liderança do tráfico. É, no mínimo, parcial. 
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DIA: Quais outros argumentos de especialistas não corresponderiam à realidade?
Turnowski: Nós temos 1.413 comunidades, que representam 15% do território do Rio. Somente nesses 15% temos crime organizado, sendo esse crime dividido em 20% de milícia e 80% do tráfico. Os outros 85% do Rio não sofrem influência do tráfico ou da milícia em relação ao voto, por exemplo. Quem mora em Botafogo, na Rua Sorocaba, não sofre influência do tráfico do Dona Marta sobre quem vai votar. Mas, para muitos especialistas, a milícia tomou conta do Rio de Janeiro.
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DIA: Sobre a Exceptis: teria feito algo diferente?
Turnowski: O resultado é fruto da ação dos bandidos. Uma semana depois, em Belford Roxo, fizemos uma operação na mesma facção, 17 presos, nenhum tiro. A quantidade de ataques aos policiais no
Jacarezinho foi enorme. 
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DIA: Imagens de TV mostram traficantes fugindo, alguns escondendo as armas. A polícia tem
imagens que mostrem confrontos?
Turnowski: A polícia tem algumas imagens da operação, que mostram traficantes cercando os policiais em um beco, posso te mostrar [mostra o vídeo]. Mas, mais que imagens, eu tenho os blindados todos perfurados, tiros nos helicópteros. O nosso policial civil morto. Imagens de televisões mostrando explosão
de granadas, que são usadas somente por traficantes.
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DIA: Há evidências de que houve demora para o socorro dos feridos de até cinco horas. Qual o motivo
da demora e, se estavam mortos, por que foram levados para o hospital e não para o IML?
Turnowski: Essa questão de demora do socorro é uma análise que tem que ser feita na investigação. A gente tem vídeo mostrando o resgate de feridos sendo levados vivos. Mas não podemos esquecer que estávamos em um ambiente hostil. A gente demorou, como disse, 1h30 para atravessar um beco. De fora,
o que vejo, do ponto de vista prático: nós temos 27 pessoas para serem socorridas e, precisamos de quatro pessoas para carregar. É necessário fazer um cerco para proteger essas pessoas. Se
fizer uma conta, para levar 27, temos que usar metade do efetivo e, isso, sob fogo.
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DIA: No dia da operação, em coletiva, os delegados afirmaram que a única execução foi a do policial civil
morto. Como afirmar que não houve excessos ou execuções antes do fim da investigação?
Turnowski: Eu nunca falei que não houve execução. Da mesma forma não aceito rótulos de chacina ou massacre antes do fim da investigação. É uma questão de equilíbrio. Mas, não há nenhum elemento até
agora que comprove execução. Há fake news. Por exemplo, falaram que houve mortes por facadas e a perícia mostrou que não teve nenhuma facada.
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DIA: Uma Ong pediu a investigação da cúpula. O senhor acha precipitado esse julgamento?
Turnowski: É um desrespeito com as instituições legalmente constituídas no estado brasileiro, com a legislação. Pedem para ser retirado do Ministério Público e da polícia para ser feito uma perícia independente. É isso que eu digo que é a defesa inconsequente de traficantes de
drogas e não de moradores.
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DIA: Por que o sigilo de cinco anos dos dados da operação?
Turnowski: Porque há informações sensíveis de como a Polícia opera e isso não pode ser de  conhecimento do traficante. O Ministério Público, que investiga, tem acesso irrestrito. 
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DIA: A população pode continuar a confiar na Polícia Civil?
Turnowski: Tenho certeza que a população confia na Polícia Civil. A população de bem, que está do lado do bem. Porque é isso: uma luta do bem contra o mal.