PM tenta negociar evacuação do antigo prédio da FaperjDivulgação

Por Carolina Freitas e Karen Rodrigues*
Rio - Cerca de 150 famílias estão na frente do prédio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), na Rua da Alfândega, no Centro do Rio. Elas, que ocuparam o edifício como uma opção de moradia, correm o risco de ir para as ruas depois da chegada da Polícia Militar, que pediu para que o local fosse totalmente desocupado nesta madrugada.
A ocupação foi denominada "Ocupação Kathlen Romeu", em homenagem à jovem Kathlen Romeu, grávida de 24 anos baleada durante um confronto entre criminosos e policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do Complexo do Lins, na Zona Norte do Rio, no início de junho. Entre os ocupantes estão camelôs e diaristas afetados pela pandemia da covid-19, que não têm onde morar.
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"Em meio a pandemia, quando o isolamento social é a melhor maneira de prevenir o contágio do vírus, muitas famílias não têm sequer onde morar. A política habitacional de Bolsonaro e Eduardo Paes só privilegia as grandes empresas e a especulação imobiliária. Por isso, construímos a luta pelo direito à moradia digna", informou o movimento.
Paula Guedes, de 27 anos, coordenadora do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), falou à reportagem que a polícia chegou no local de surpresa e disse que todos teriam que desocupar o prédio em 40 minutos. 
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"A gente se deparou hoje de tarde com uma abordagem policial que avisou que nós tínhamos 40 minutos para esvaziar o prédio ou então seríamos despejados a força. Desconsideraram todos os nossos argumentos. Falamos que o despejo é ilegal durante a pandemia e que as famílias estão aqui somente buscando uma moradia. Não conseguimos nenhuma negociação", afirmou.
Além disso, afirmou que a PM não apresentou qualquer documentação para o despejo. "Eles disseram que estavam apenas cumprindo ordens. Não deram nenhuma justificativa. Eles agiram com violência e ameaça".
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Cláudio Ribeiro, professor de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), disse ao DIA que é preciso democratizar o uso da cidade.
"A cidade já era muito desigual, a pandemia piorou muito a situação. As pessoas que estão sem-teto tem uma situação cada vez mais vulnerável. Não só pela pandemia, mas também pela fome, o desabrigo. A gente está no inverno, inclusive. As pessoas estão ocupando um edifício do estado que estava sem uso há mais de dez anos, portanto, não estava cumprindo a sua função social, que é uma determinação da constituição federal. É importantíssimo que o estado garantisse o direito à moradia dessas pessoas".
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Ele disse ainda que a luta do movimento MLB é justa e legítima. "Nada mais diz respeito a uma garantia de direitos dos cidadãos da cidade do Rio de Janeiro. A história exige que tenha justiça para essas pessoas. A Polícia Militar deveria estar lá protegendo a população, não ameaçando a remoção. Nós que estudamos a questão habitacional, sabemos da importância que é esse tipo de ação e o melhor a se fazer é proteger essas pessoas, negociar e garantir uma solução pacífica e efetiva. Despejar essas pessoas em plena pandemia seria um ato totalmente abusivo e violento", finalizou. 
A vereadora Tainá de Paula (PT) publicou no Twitter que está acompanhando a ação da Polícia Militar em frente a ocupação.
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O Acampamento Cícero Guedes, localizado na ex Usina Cambahyba, em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, também se manifestou nas redes sociais em apoio à ocupação. "Uma belíssima homenagem a uma mulher negra cuja vida foi violentamente ceifada por uma política de extermínio da população negra e de negação dos direitos mais fundamentais como o é a moradia. Por isso, enquanto tivermos sangue nas veias iremos lutar pela transformação social, por terra, teto e dignidade".
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Em comunicado divulgado nas redes sociais, o MLB pediu a contribuição para a compra de materiais de limpeza, álcool em gel, máscaras, alimentos, colchão e roupa de cama, utensílios de cozinha e outros.
Logo depois, porém, foi postado um vídeo no perfil oficial do Twitter da deputada estadual do PSOL, Dani Monteiro, mostrando que os policiais estavam impedindo que pessoas levassem doações até o local. Nas imagens, é possível ver dois senhores fechando o porta-malas de um veículo ao lado da PM. No conteúdo, uma mulher, que não foi identificada, narra o que acontece:
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"Acabaram de embarreirar a entrada das quentinhas que iriam alimentar os companheiros aqui da ocupação. Tem famílias aqui precisando dos alimentos. Infelizmente o estado ao invés de vir negociar, manda a polícia para dizer que não pode entrar comida para o pessoal que está aqui na ocupação".
Procurada, a Faperj ainda não se pronunciou sobre o ocupação do prédio. A PM continua no local em negociação com os organizadores do movimento.
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*Estagiária sob supervisão de Thiago Antunes