Para deputadas, assassinato de Marielle Franco é violência política de gêneroDivulgação/ Câmara dos Deputados

Rio - Em sessão solene na Câmara dos Deputados, nesta terça-feira, deputadas cobraram justiça para o assassinato da vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes. O crime completou quatro anos nesta segunda-feira (14) e a data foi marcada por diversos atos e um festival cultural no Circo Voador. Dois homens acusados de serem os executores do crime aguardam julgamento, mas as investigações ainda não concluíram quem mandou matar a parlamentar e o que teria motivado o crime.
Líder do Psol na Câmara, que era o partido de Marielle, a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP) foi uma das que exigiu justiça e ressaltou que milícias e milicianos têm relação com o crime. "Aqueles que retiraram a vida de Marielle naquela noite tinham o objetivo, sem dúvida, de tentar calar sua voz, as suas ideias, os seus objetivos, a sua atuação política", disse. Para Sâmia, porém, Marielle vive na reprodução de suas ideias. Ela saudou ainda o fato de muitas mulheres negras e LGBT, como Marielle, terem se inspirado a fazer política a partir do exemplo da vereadora.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), por sua vez, salientou que o crime é de violência política de gênero e que o mundo inteiro aguarda a resposta para ele. "Quanta dor acumulada porque não há resposta. Para além da ausência, não há resposta. Aparece quem atirou, que dirigiu o carro, mas não se diz quem mandou, o por quê. Muitas são as teses, as especulações, as interpretações. Nós podemos até ter as nossas certezas, mas é preciso que se esclareça. Não há resposta maior do que o esclarecimento e a punição para a violência política de gênero", disse.

Simbologia
A deputada Talíria Petrone (Psol-RJ) chamou a atenção para a simbologia em torno do assassinato. "Marielle, mulher negra, num País do feminicídio, que é o quinto país com maior índice de feminicídios no mundo e em que o feminicídio é negro. Marielle, mulher favelada, em que a favela é alvo do braço armado do Estado, mas lá não chega o SUS, não chega creche", citou. Ela acrescentou que Marielle era defensora dos direitos humanos e que o país é um dos que mais assassina ativistas dos direitos humanos no mundo. Para ela, a execução política de Marielle por pessoas ligadas à milícia significa retrocesso democrático.

Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), as idas e vindas na investigação e o sigilo que se tenta impor a ela ocorrem porque "o crime mexe nos cernes de um poder que se associa com milícias e com jagunços". Ela também destacou a simbologia do crime: "O extermínio de Marielle Franco representa o ataque frontal, a bala no corpo da democracia, balas no corpo de cada mulher negra deste País, balas no corpo de todas que ousam descer os morros e assumir os palanques e as tribunas que eles negam ao povo brasileiro."

Golpe contra a democracia
Em discurso lido no Plenário, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), enfatizou que o assassinato foi um golpe contra a democracia brasileira. Segundo ele, o crime foi uma tentativa de calar a vereadora, de interromper os projetos políticos por ela defendidos, além de uma tentativa de sufocar as vozes dos cidadãos e cidadãs que defendem as mesmas causas que a vereadora. "A afronta à representatividade política no Brasil é também uma afronta à esta Casa e ao povo desta nação", completou.

Presidente do Psol, Juliano Medeiros observou que muitas parlamentares ainda hoje se sentem inseguras para exercer seu mandato, e necessitam de proteção policial, como no caso da deputada Talíria Petrone. Para ele, por esse e outros tantos motivos, a democracia brasileira está incompleta. Ele demonstrou indignação com "manobras para que caso não seja concluído" e com a não condenação de nenhum dos assassinos.

Antônio Francisco, pai de Marielle, também ressaltou que o crime não pode ficar impune em prol da democracia. "Se não conseguimos dar essa resposta, não vamos ter uma democracia sadia no Brasil", avaliou.

Para Agatha Arnaus, viúva do motorista Anderson Gomes, ele representa cada brasileiro que é assassinato e o crime não tem resposta, cada trabalhador que sai de casa e está à mercê da violência, principalmente no Rio de Janeiro.

Extermínio de corpos negros
De acordo com Danielle Sanchez, do Coletivo de Mulheres Negras Yaa Asentewa, a política construída no País - heteressexual, branca, cisgênero e masculina - não está acostumada a ver mulheres pretas e periféricas, como Marielle, ocupando esses espaços. “A política genocida segue limando corpos negros”, frisou. "Lutar por justiça por Marielle é lutar para que outras violências políticas de gênero não aconteçam", acrescentou.

A cantora Nana Matos também participou da sessão e prestou homenagem à Marielle. Ela também condenou os mecanismos "excludentes, patriarcais e embraquecidos" da política brasileira.