Josiane Reis e a pomada modeladora Ômegafix, utilizada em seu cabeloReprodução / Redes Sociais

Rio - A manicure Josiane Reis de Souza, 41 anos, está sem enxergar desde o último sábado (19), quando entrou em uma piscina enquanto usava um penteado feito com uma pomada modeladora. Segundo a denúncia de sua nora nas redes sociais, o produto da marca Ômegafix, usado para fazer tranças, provocou queimaduras nas córneas da moradora de Belford Roxo, após entrar em contato com a água e escorrer para os olhos.
Mirella Reis, nora da manicure, relatou o caso no Twitter e atraiu diversas denúncias similares. De acordo com a postagem feita no domingo (20), sua sogra havia feito o penteado na sexta-feira (18) para ir a uma festa na piscina, que aconteceria no sábado. Durante o evento, Josiane começou a sentir os primeiros sintomas. Na manhã seguinte, a mulher acordou totalmente sem visão.
Ela foi atendida, primeiramente, na Unidade Mista do Lote XV, em Belford Roxo, município da Baixada Fluminense onde mora. No local, recebeu o diagnóstico de que estava com uma lesão severa na córnea. Uma queimadura foi causada pelo contato com o cosmético capilar, que escorreu para os olhos enquanto ela estava na água.
Depois da consulta, Josiane foi encaminhada ao Hospital Municipal Moacyr do Carmo, em Duque de Caxias, também na Baixada. Nas duas unidades onde aconteceram os primeiros atendimentos, a mulher recebeu a notícia de que outras pessoas já haviam apresentado reação a esse tipo de produto. Atualmente, Josiane está sendo acompanhada por médicos do Hospital do Olho, no Humaitá, Zona Sul do Rio.
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a pasta da marca Ômegafix não está regularizada. Diante das denúncias, foi aberto um dossiê de investigação referente ao caso. "O produto Ômegafix Pomada para Tranças se enquadra na definição de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes, regulados pela Resolução RDC nº 7, de 2015. Não foi encontrado processo de regularização deste na Gerência de Cosméticos da Anvisa", afirmou o órgão.
A Ômegafix, em contato com o DIA, disse que lamenta o ocorrido e assume que falhou ao não inserir as informações completas no rótulo. A empresa alegou que vai colocar em destaque, na embalagem da pomada, um aviso sobre o perigo de contato com os olhos. "O aviso está no produto atual, mas julgamos que o recado deveria chamar mais atenção", constataram.
De acordo com a marca, o rótulo também vai indicar a importância da não utilização da pasta em ambientes como praias e piscinas ou em água corrente. Além disso, a equipe está tomando as providências necessárias para regularizar a situação com a Anvisa.
Ao serem questionados sobre a fórmula do produto, alegaram que "as composições das pomadas existentes no mercado são muito similares, não tem como fazer um produto que não cause irritação nos olhos. Isso vale para todas as marcas", afirmou a empresa.
O problema para além da marca
A Ômegafix não foi a única a causar transtornos para os clientes. Josiane Muniz, 26 anos, teve o mesmo tipo de reação à pomada modeladora. No caso dela, o produto era da empresa Esponja Magic.
No domingo (6), ela fez um penteado com tranças no cabelo e foi para uma festa na piscina. Após mergulhar, algumas horas depois do início da festa, a reação ao cosmético teve início. Segundo a mulher, que também é moradora de Belford Roxo, seus olhos começaram a lacrimejar e a visão foi ficando embaçada. Diante da dor nos globos oculares, que aumentava cada vez mais, ela foi para casa.
No dia seguinte, Josiane acordou com os olhos inchados e a sensação de que suas pálpebras estavam coladas. "Meus olhos estavam tampados e eu não via nada, estava tudo embaçado. Tentei forçar a vista para abrir, mas não adiantava. Um desespero que só quem passa sabe", desabafou a operadora de caixa.
Mesmo sem enxergar, ela foi levada pela sogra ao Hospital Sousa Aguiar, no Centro do Rio, onde recebeu o diagnóstico de que a reação estava relacionada à pomada. De acordo com Josiane, a médica que realizou o atendimento afirmou que já havia presenciado diversos casos similares e que, na fila para a consulta, outras duas meninas estavam com o mesmo problema. Após o exame, o oftalmologista da unidade constatou lesões graves nos olhos da paciente, especialmente no esquerdo.
Josiane seguiu a prescrição do médico e viu uma grande melhora no quadro, mas ainda não está com a visão totalmente recuperada. Segundo ela, o olho esquerdo ainda está embaçado. "Você faz uma trança por diversão e, de repente, passa dias sem enxergar, quase perde a visão. Foi muito difícil", afirmou.
Em contato com o DIA, a empresa Esponja Magic, responsável pelo produto "Pomada Braids", usado por Josiane, afirmou que o problema não é a pomada, mas a forma como ela está sendo manuseada. "Nós não temos contato com o consumidor final, apenas com os trancistas. Por isso, estamos focados em orientar esses profissionais a usar a quantidade correta de produto e deixar os clientes cientes dos cuidados", constatou a empresa.
Eles ainda afirmam que estão em contato com o fabricante para evidenciar mais os avisos na embalagem da pasta modeladora.
O ponto de vista dos profissionais
A trancista Eládia Góis, 30 anos, trabalha com penteados e está acostumada a usar as pomadas modeladoras no cabelo das clientes. Segundo ela, a maioria das pastas vem com um aviso para evitar o contato com os olhos, mas, normalmente, é um comentário bem pequeno no rótulo. "Eu sempre falo para as minhas clientes, mas, muitas vezes, outros profissionais não passam a informação. Não avisam que não se deve molhar as tranças e que o contato do produto com os olhos pode causar danos", disse ela.
Eládia reconhece a importância da conscientização sobre o uso correto do cosmético, mas as consequências da repercussão do caso nas redes sociais causam preocupação. "Esse tipo de situação acaba afetando muito o nosso trabalho, muita gente generaliza como se não existisse cuidado pela parte dos profissionais", desabafou a trancista.
Para o médico Cesar Motta, membro da Sociedade Brasileira de Oftalmologia, a recorrência dos casos é preocupante. De acordo com a SBO, esse é um quadro muito frequente nas emergências de oftalmologia: pacientes que utilizaram um produto químico que, por acidente, entrou em contato com os olhos e causou reação.
Segundo Motta, uma lesão é gerada na camada mais superficial do órgão, provocando sintomas como ardência, lacrimejamento e visão turva. "Para amenizar o problema no momento do contato, o paciente deve lavar os olhos de maneira abundante com água filtrada e procurar um oftalmologista o mais rápido possível", afirmou a SBO.
*Estagiária supervisionada por Thiago Antunes