O estudante de Nutrição Fábio Leandro usou as redes sociais para denunciar que sofreu racismo no Teatro IpanemaFoto: Reprodução do Instagram
'Quero um país sem racismo para que os filhos que eu venha a ter não sofram como eu', diz rapaz acusado de roubo
Fábio Leandro Souza do Nascimento, de 25 anos, usou as redes sociais para denunciar acusação injusta de ter roubado um guarda-chuva
Rio - "Ainda dói muito". É assim que o estudante de Nutrição, Fábio Leandro Souza do Nascimento, de 25 anos, resume o que vem sentindo desde o último sábado (11), quando foi acusado de ter roubado o guarda-chuva de uma mulher, logo após um espetáculo no Teatro Ipanema, Zona Sul do Rio. O caso veio à tona após Fábio usar as redes sociais para denunciar que tinha sido acusado injustamente. Orientado por advogados, o jovem foi à 14ª DP (Leblon), no fim da tarde de segunda-feira (13) e registrou a ocorrência.
Agora, ele espera justiça: "O racismo estrutural nesse país é tão grande e normalizado pelas pessoas que eu, um cara preto, num dia de chuva, não tenho nem o direito de ter um guarda-chuva meu que aí vem uma mulher branca me acusar de roubo. É tudo muito absurdo", lamenta o rapaz, dizendo ainda que espera que sua atitude de não se calar sirva de exemplo a outras pessoas que também sofrem racismo no Brasil: "Só quem passa por isso sabe a dor que é. E se eu posso dar algum conselho é: não se calem! Denunciem, sempre!"
De família humilde, morador da comunidade Chapéu Mangueira, no Leme, Fábio é filho de uma dona de casa com um profissional autônomo. Emocionado, lembra os ensinamentos que aprendeu com a mãe, Glória Regina, que morreu há pouco mais de um ano e meio. "Somos pobres, sim, mas aprendi em casa que o estudo é nosso melhor patrimônio. E meus pais sempre se esforçaram muito para nos criar bem. Eu e meus quatro irmãos. Faço faculdade à noite e de dia trabalho como autônomo. Sou honesto e não vou me calar nunca frente ao racismo", contou o jovem universitário, estudante do 5º período de Nutrição, na Faculdade Santa Úrsula.
Desde que tudo aconteceu, o rapaz diz que tem dormido mal e comido pouco. "O estômago revira com essa injustiça toda". Ainda abalado, faz questão de agradecer o apoio que vem recebendo das pessoas, seja pessoalmente ou pelas redes sociais. "É bom ver que não estamos sozinhos".
Em nota, a Secretaria Municipal de Cultura disse que "lamenta o ocorrido e reafirma o compromisso de uma gestão pública que integre a cidade para que pessoas negras possam circular livremente por espaços públicos e privados sem serem afetadas pelo racismo" e complementa dizendo "o quão significativo é isso acontecer justamente numa peça de um grupo vindo da Maré e que trate de temas como racismo e violência", diz a nota.
Além disso, a secretaria de Cultura convidou o rapaz para voltar ao Teatro Ipanema, na noite desta terça-feira (14), para a comemoração dos 80 anos da Orquestra Afro-Brasileira e o aniversário de Carlos Negreiros, último músico remanescente da formação original. Antes da apresentação, o secretário municipal de Cultura, Marcus Faustini, e a subsecretaria Ericka Gavinho terão uma fala inicial reafirmando o repúdio à agressão sofrida por Fábio. "Estou muito agradecido a todos que me apoiaram. Fiquei muito feliz com o posicionamento do pessoal da Secretaria Municipal de Cultura, também. Não sei se consigo já voltar ao local onde tudo aconteceu porque ainda me machuca muito, mas valeu o apoio de qualquer maneira. Isso é importante para mim".
A direção do espetáculo 'Nem Todo Filho Vinga' também usou as redes sociais para se solidarizar com Fábio e repudiar o ocorrido: "Nós, da CIA Cria do Beco, repudiamos toda e qualquer atitude RACISTA. Uma mulher acusou um amigo negro, favelado, de ter roubado seu guarda-chuva. Sim, um guarda-chuva. A cena foi caótica, estendeu-se na rua, num constrangimento terrível. Continuaremos ocupando esses espaços e trazendo nossa galera pro teatro. Todo nosso apoio e afeto Fábio Leandro".
Em seu perfil no Instagram, mensagens de apoio de amigos e desconhecidos: "A gente não tem um minuto de paz nesse mundo. Como isso é cansativo, cara!!! Estamos juntos, irmão. Você não está sozinho", diz um homem; "Sinta-se abraçado. Um absurdo tudo isso", escreveu uma mulher.
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