Projeção de como ficará o novo espaço com a exposição do painel do cartunista ZiraldoDivulgação (SGCOM)

Rio - A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) apresentará seus planos para o Canecão ao Conselho Universitário na próxima quinta-feira (25). O novo projeto quer entregar à comunidade acadêmica e aos cariocas um espaço para manifestações culturais e para uso de algumas instalações por professores e alunos da universidade. Localizado na Rua Lauro Müller, em Botafogo, na Zona Sul, o Canecão, apesar de consagrado na vida cultural do Rio e do Brasil, estava fechado desde 2010 e não abrigava mais do que escombros, uma péssima infraestrutura e lembranças de tempos gloriosos.
A proposta da Universidade é derrubar a antiga estrutura do Canecão para construir um Equipamento Cultural Multiuso (ECM), com espaço adaptável para abrigar desde óperas, espetáculos e apresentações teatrais à shows, com capacidade para receber no mínimo 1,5 mil pessoas sentadas e mais de 4 mil em pé.
A UFRJ também poderá utilizar o espaço por alguns dias durante o ano para apresentação de espetáculos, formaturas e até congressos, além de salas destinadas a ensaios, apresentações ou exposições da universidade. A previsão é que a licitação ocorra ainda em dezembro deste ano.
O espaço, concebido por artistas e pessoas do ambiente cultural da UFRJ, buscará atender essa classe artística, apresentando um ambiente parecido com o antigo local. O projeto também prevê isolamento acústico e acessos com baixo impacto no tráfego de veículos das redondezas, respeitando a lei municipal de ocupação do solo, de 2011.
O painel de 23 metros povoado com as artes do cartunista Ziraldo também entra nos planos. "O painel está em parte coberto e perdido pelas intervenções do antigo dono do Canecão. Vamos tentar recuperar uma parte e deslocar para a parede onde ele deve ser totalmente refeito. Uma réplica do painel completo deverá estar no espaço Ziraldo, se a família permitir", contou a Reitora da UFRJ, Denise Pires.
Segundo a reitoria, o modelo de cessão de ativos e contrapartidas não financeiras foi pensado ainda na gestão anterior, do ex-reitor Roberto Leher, que contratou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em 2018. A gestão atual mudou o projeto original após receber os estudos preliminares em 2020: "não concordávamos com a cessão daquele terreno para construção de edifícios ou hospitais privados, em troca de um equipamento cultural", argumentou a reitora.
A UFRJ não assumirá risco de negócio, ou seja, o orçamento da academia não será aplicado para a concretização do centro cultural, permanecendo voltado para seu tripé: ensino, pesquisa e extensão. "Pretendemos que o investimento no Canecão, com a sua cessão e modelo compartilhado de uso, traga novos ativos imobiliários para a UFRJ, como prédios com salas de aula e restaurantes universitários", pontuou Denise.
Como ainda aguarda apresentação e futura aprovação no Conselho Universitário, o vice-reitor Carlos Frederico Leão adiantou que a proposta tem sido levada à várias instâncias da UFRJ e que a receptividade tem sido "muito boa" por parte dos centros. "As pessoas entendem que ali havia um patrimônio cultural que foi construído pela cidade e que retorná-lo para a cidade é muito importante. Então, de uma maneira geral, a iniciativa tem contado com o apoio da comunidade acadêmica", afirmou Leão. 
Para a presidente da Associação de Moradores de Botafogo Regina Chiaradia, o bairro só terá a ganhar com o novo espaço. "Estamos super de acordo, pois trabalhamos intensamente em relação a esse projeto junto à Câmara Municipal. Ele vai respeitar o que sempre solicitamos, que é o gabarito do bairro. Ou seja, não vão ser construídos andares acima do que é permitido, vai atender à exigência de estacionamento para que não haja os engarrafamentos que existiam antes, além de manter as árvores, que era um pedido da associação parceira da Lauro Muller, e ter uma parte aberta a população", explicou Regina.
Uma das polêmica envolvendo o novo centro cultural é a demolição do muro, que mostra, em ordem cronológica, diversos ídolos do Botafogo e do futebol brasileiro, para dar lugar a uma praça em área verde. "Aquilo ali, na minha opinião, virou um patrimônio cultural da nossa cidade, não só para os torcedores do Botafogo. A minha sugestão é que se conseguíssemos, junto aos políticos e à faculdade, e elogio à faculdade por ter tratado tão bem o muro esse tempo todo, tombar e tornar uma coisa cultural da cidade ia ser muito bacana. Até porque o projeto deles é cultural, então não faz sentido você tirar o muro para implantar outra coisa cultural", defendeu Rafael Mois, presidente da torcida Loucos pelo Botafogo.
A importância do Canecão
O Canecão foi inaugurado em junho de 1967 como uma cervejaria, pelo empresário Mário Priolli. A mudança para casa de espetáculos veio dois anos depois, com o show da cantora Maysa, dirigido por Bibi Ferreira. De lá pra cá, estabeleceu-se uma briga judicial de quase 40 anos entre o empresário e a UFRJ, que recebeu o terrenos da União nos anos 1960 e alegava o não pagamento do aluguel por parte de Priolli.
Em 2010, a universidade conseguiu a reintegração de posse do espaço. O Canecão chegou a ser cedido ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), mas, sem recursos para promover sua reforma, acabou retornando para a UFRJ. Desde então, ele permanece fechado.
Pelos palcos do Canecão, já passaram artistas nacionais e internacionais e nomes consagrados da nossa música. Embalado por artistas da Música Popular Brasileira, o público já prestigiou shows de Maysa, Tom Jobim, Toquinho, Vinícius de Moraes, Elza Soares e outros. Uma das grandes histórias envolve o cantor Elymar Santos, que vendeu seu apartamento e carro para conseguir alugar o espaço e se apresentar. Além disso, grandes nomes do rock nacional nos anos de 1980 fizeram shows memoráveis, como Paralamas do Sucesso, Engenheiros do Hawaii e Barão Vermelho. 
*Estagiária sob supervisão de Thiago Antunes