Se a nulidade for comprovada, a prefeitura deve realizar nova concessão da via reduzindo valor de pedágioPedro Ivo/Agência O Dia

Rio - A abertura do processo de cassação da concessão da Linha Amarela foi publicada na edição desta quarta-feira (28) do Diário Oficial da Prefeitura do Rio. A determinação autoriza a abertura de uma investigação para apurar a nulidade em um termo aditivo do contrato de concessão com a concessionária Lamsa, atual responsável pela via.

No despacho, o prefeito Eduardo Paes diz que "caso seja constatado o vício contratual", autoriza a retomada da operação da Linha Amarela por parte da prefeitura após o fim do prazo contratual. A concessão da via é válida até o dia 31 de dezembro sem o termo aditivo.

O documento ainda aponta que "há valores no orçamento que não encontram respaldo em nenhuma situação orçamentária plausível".

Nesta terça-feira (27), o prefeito anunciou, por meio de suas redes sociais, a decisão de cassar a concessão da Linha Amarela por superfaturamento de obras. A decisão ocorreu após conclusões de perícia determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que constatou um superfaturamento de R$ 72 milhões - valores da época - em obras feitas na via a partir de 2010.

Na ocasião, a Prefeitura do Rio e a Lamsa assinaram, em 2010, o 11° aditivo ao contrato, que ampliou em 15 anos a concessão da Linha Amarela, uma das mais importantes vias expressas do Rio, que liga a Avenida Brasil e a Linha Vermelha. Como contrapartida, a empresa deveria fazer investimentos na via no montante total de R$ 252 milhões. Mas, de acordo com a perícia determinada pelo STF, foram verificados valores bem superiores ao que foi efetivamente gasto.
Segundo o Diretor da FGV Transportes, Marcus Quintella, a intervenção contratual por ser prejudicial para futuras concessões da via expressa, já que indica uma insegurança jurídica, mas que a operação da Linha Amarela não deve ser tão afetada com as possíveis mudanças.
"É muito difícil lidar com essas desavenças porque enfraquece muito o instituto das concessões, dos investimentos empreendedores, e isso não é bom. Como já tem outros precedentes no nosso país, isso realmente reflete para os futuros investidores. Eu entendo que provavelmente não vai afetar muito a operação da Linha Amarela, apesar de ser indesejável qualquer ação de intervenção em um contrato. Tem que avaliar muito bem, mas já são muitos e muitos anos de concessão e essa intervenção pode suscitar em várias situações de insegurança jurídica. Em termos de operação, a única coisa que pode afetar, caso haja uma intervenção da prefeitura, é no atendimento ao usuário. O problema é que ele pode 'ser beneficiado' com a isenção do pedágio, mas ao mesmo tempo não vai ter atendimento como tem pela pela concessionária. E não é interessante para uma via que já está consolidada dentro da área urbana do Rio de Janeiro e é importantíssima hoje para a cidade", explica.
Com o superfaturamento das obras, se caracteriza uma nulidade neste aditivo, ou seja, essa prorrogação de 15 anos é como se não precisasse existir mais. Caso a nulidade seja comprovada, a prefeitura deve realizar nova concessão da via estabelecendo valor de pedágio mais baixo do que o cobrado atualmente, que é de R$ 4.
De acordo com Letícia Mounzer, advogada e especialista em direito do Núcleo Institucional do escritório Normando Rodrigues Advogados, o processo movido pela Prefeitura do Rio está dentro da legalidade.
"Ao autorizar a abertura do processo para a apurar a nulidade do termo aditivo do contrato de concessão da Linha Amarela, o prefeito Eduardo Paes agiu dentro da legalidade. A decisão foi publicada no Diário Oficial e encontra lastros no laudo pericial encomendado pelo Município e pela concessionária à Alumni/ COPPEAD —instituição ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Segundo o despacho do prefeito, a perícia teria constatado que os valores no orçamento do 11º Termo Aditivo não encontram respaldo em nenhuma situação orçamentária plausível. Sendo assim, em havendo indícios de irregularidade, o administrador pode e deve permitir que sejam averiguados eventuais vícios contratuais", explicou.

Procurada, a Lamsa informou que "desconhece qualquer processo administrativo que tenha por objeto a nulidade de contrato e/ou aditivo, mesmo porque não há fundamento legal para sua decretação. O laudo pericial emitido pela ALUMNI/ COPPEAD - contratado em comum acordo pela Prefeitura e pela concessionária - tem por escopo o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato e, inclusive, aponta que há desequilíbrio em prejuízo da concessionária. A Lamsa reitera que vem cumprindo regularmente o contrato de concessão e acredita que todos os seus termos serão respeitados, preservando a segurança jurídica."

Desavenças antigas

Os problemas entre a Prefeitura do Rio e a concessionária Lamsa não são de hoje. Em 2019, ainda durante o governo de Marcelo Crivella, o ex-prefeito apresentou um Projeto de Lei para encampação da Linha Amarela.

O Projeto de Lei se baseou no artigo 37 da Lei de Concessões, que prevê a retomada de serviço durante o prazo da concessão por motivo de interesse público, mediante lei autorizando a decisão e após pagamento de indenização.

No projeto, enviado à Câmara dos Vereadores para ser tramitado em regime de urgência, o prefeito pediu que que a indenização prevista pela Lei de Concessões fosse reconhecida como amortizada, já que a concessionária Lamsa causou prejuízos de R$ 1,6 bilhão aos cofres públicos, valor apurado pela Prefeitura e ratificado pela CPI da Linha Amarela.

A Lamsa, por sua vez, entrou com uma ação na 15ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Rio questionando o processo. No documento, a concessionária afirmou o direito que a Prefeitura tem à encampação, mas enfatizou as etapas do processo legal. A empresa também mencionou a garantia que teria, por lei, ao cálculo de indenização.

A Prefeitura do Rio chegou a reassumir o controle da Linha Amarela e suspender a cobrança do pedágio em ambos os sentidos da via expressa. Na ocasião, a ação para o controle da via contou com diversos agentes da prefeitura descaracterizaram as cabines de pedágio.

Após a prefeitura retomar o controle da via, o Projeto de Lei por aprovado por unanimidade pela Câmara dos Vereadores e antecipou o fim da concessão. A partir da decisão, a Justiça teria que decidir sobre o futuro da concessão da via expressa.

Dias depois, uma decisão judicial determinou a volta da cobrança dos pedágios e as cancelas foram recolocadas. Já que uma liminar do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), concedida à Lamsa, teria proibidos a prefeitura de seguir com o processo de encampação.

Somente em 2021 a prefeitura e a Lamsa chegaram a um acordo para a realização de um laudo que serviria como base para para resolver o processo de encampação. Na época, os dois lados apresentaram proposta conjunta indicando para o trabalho a associação Alumni Coppead, formada por alunos do Instituto de Pós-graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).