No centro das divergências entre o presidente da República, Jair Bolsonaro, e a sua equipe econômica, a reforma administrativa pode avançar. Em pronunciamento realizado ontem, no Palácio do Alvorada, ao lado dos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AM), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Bolsonaro sinalizou - ainda que de forma tímida - que o tema não saiu da pauta. Apesar de presente, o ministro Paulo Guedes (Economia) não se manifestou.
O breve discurso ocorreu após reunião com lideranças do Executivo e do Legislativo para firmar o compromisso com o teto de gastos. A tentativa é de apagar o incêndio no governo diante da debandada que ocorreu essa semana no Ministério da Economia.
"Assuntos variados foram tratados, como privatizações, e reformas, como a administrativa. Resolvemos, então, com a reunião, direcionar forças para o bem comum daquilo que defendemos. Queremos progresso e desenvolvimento", afirmou Bolsonaro.
Estabilidade em xeque
A reforma é nada mais que a reestruturação do serviço público do país. Enxugamento de plano de cargos e do número de carreiras, limitação do salário inicial, aumento do tempo para promoções e ampliação do estágio probatório, além do fim da estabilidade para novos servidores são alguns dos itens previstos.
O governo acabou recuando com a reforma administrativa por conta da pandemia, e também porque o presidente avalia que a medida pode prejudicá-lo na tentativa da reeleição.
Após a fala de Bolsonaro, Maia foi mais enfático e defendeu a proposta: “Assim que o presidente entender importante, a Câmara estará pronta para aprovar uma reforma que tem objetivo de melhorar a qualidade do gasto público e do serviço público”.
Servidores rebatem números de estudo
No Congresso, há pelo menos três frentes parlamentares que discutem o tema da reforma administrativa. Vale ressaltar que representantes do funcionalismo federal já declararam que não são contra mudanças no setor, desde que venham para melhorar a qualidade do trabalho e da prestação dos serviços públicos.
Mas as categorias alegam que "vêm sendo atacadas". Por isso, se organizam para intensificar o diálogo com o Parlamento, em Brasília, e levar dados sobre o setor público que contrastam com informações divulgadas em estudos, como a recente pesquisa do Instituto Millenium. O Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) debateu o assunto na última terça-feira. O fórum promete levar os dados aos parlamentares.
Segundo as entidades que compõem o grupo, houve "manipulação de dados sobre o funcionalismo" pelo instituto, "que tem o ministro da Economia Paulo Guedes entre seus fundadores".
"(O estudo) Diz que o Brasil gastou 13,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019, cerca de R$ 930 bilhões, com servidores públicos federais, estaduais a municipais, e contrapõe esses números aos gastos com saúde e educação. Para o Fonacate, são vários equívocos, pois esse montante inclui gastos com previdenciários e com militares, e maldosamente omite que dentro dos gastos com saúde e educação está, majoritariamente, a remuneração dos servidores que atuam nessas áreas", afirmou o Fonacate, por nota.
"Para começar, a despesa com o servidor público civil ativo federal não é R$ 350 bilhões, e sim R$ 136 bilhões. Na Saúde, 70% gasto é com pessoal. A deterioração dos resultados fiscais não é produto do descontrole da folha, estabilizada em relação ao PIB há 20 anos”, explicou o economista Bráulio Cerqueira, que compõe a Comissão de Estudos do Fonacate e é secretário-executivo do Unacon Sindical.
O Fonacate já preparou e divulgou estudos "para desmistificar" dados, que, segundo os servidores, são "usados para atacar o funcionalismo", disse Cerqueira.
"Temos chamado a atenção em nossos estudos, que não é certo incluir os três níveis de governo e os três Poderes para falar genericamente de gasto com pessoal. Tem muita heterogeneidade. Nos municípios, salários de professores e médicos são inferiores aos da iniciativa privada. Nos estados, boa parte do gasto é com polícia militar, segurança. O nível federal concentra funções típicas de governo, militares e a alta cúpula do Judiciário e Legislativo", acrescentou.