O ministro Gilmar Mendes falou em 'desmando completo' e previu mais 'surpresas desagradáveis' - Carlos Moura/SCO/STF
O ministro Gilmar Mendes falou em 'desmando completo' e previu mais 'surpresas desagradáveis'Carlos Moura/SCO/STF
Por O Dia

Brasília - Após ações de policiais e fiscais eleitorais em universidades públicas em várias cidades do país, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) defenderam a liberdade nas instituições de ensino, sem citar casos específicos. Nas últimas 48 horas foram 17 intervenções em nove estados.

O presidente da Corte, Dias Toffoli, publicou nota em defesa da “autonomia e a independência das universidades brasileiras”, divulgada pela Folha S.Paulo.

“O Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição Federal, sempre defendeu a autonomia e a independência das universidades brasileiras, bem como o livre exercício do pensar, da expressão e da manifestação pacífica”, diz .

“Essa Liberdade é o pilar sobre o qual se apoia a própria noção de Estado Democrático de Direito. No julgamento da ADPF 130, o Tribunal reafirmou que ‘a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões'”, concluiu.

Em nota, o ministro Marco Aurélio Mello disse que o saber pressupõe liberdade: "Liberdade no pensar, liberdade de expressar ideias. Interferência externa é, de regra, indevida. Vinga a autonomia universitária. Toda interferência é, de início, incabível".

O ministro acrescenta que fala de "forma geral": "Não me pronuncio especificamente sobre a atuação da Justiça Eleitoral. Mas reconheço que a quadra é de extremos. Por isso é perigosa, em termos de Estado Democrático de Direito. Esse é o meu pensamento".

Já o ministro Gilmar Mendes disse, em São Paulo, que Justiça deve ser menos repressiva. "É preciso que façamos uma reavaliação para não valorizarmos uma ação repressiva e que possamos valorizar uma relação mais dialógica". A declaração, divulgada pela Folha de S. Paulo, foi dada em agenda do ministro na universidade Uninove, em São Paulo. "Não é incomum, nós mesmos (ministros do STF) vamos a eventos universitários e somos recebidos com protesto. Isso faz parte do processo democrático", acrescentou. 

"Temos que lidar com isso com certo espírito de compreensão e de tolerância. Não são todas manifestações que traduzem manifestação de apoio. É claro que na esfera pública não pode haver preferência para um ou outro candidato, mas é preciso lidar com cautela para que não caiamos em nenhum exagero ou exorbitância", defende Mendes.

O ministro Luís Roberto Barroso também se manifestou sobre o assunto à Folha de S.Paulo: "Não me pronuncio sobre casos concretos. Mas o modo como penso a vida, a polícia, como regra, só deve entrar em uma universidade se for para estudar".

Um outro ministro do STF ouvido em caráter reservado pela reportagem definiu os episódios como um "um horror".

Para o presidente do TRE-RJ, o desembargador Carlos Eduardo da Fonseca Passos, no entanto, "as recentes ações de fiscais eleitorais em instituições de ensino no estado do Rio de Janeiro foram desdobramentos de decisões judiciais fundamentadas, a partir de denúncias oriundas de eleitores e da Procuradoria Regional Eleitoral". A nota emitida pelo Tribunal afirma ainda que "A fiscalização da propaganda tem atuado em conformidade com as normas vigentes e de forma democrática, com a prudência e a sensibilidade que as circunstâncias políticas demandam".

Um integrante do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que preferiu não ser identificado destacou à reportagem que manifestações partidárias em prédios públicos são proibidas, mas lembrou que isso não se aplica a atos genéricos, sem conteúdo partidário, que discutam política. Para este ministro, a atuação de Tribunais Regionais Eleitorais nestes casos apresenta um "rigor excessivo". Ele também destacou, por outro lado, que é preciso entender se há alguma ação organizada, o que pode ensejar algum rigor maior da Justiça.

Por sua vez, um outro ministro da Corte Eleitoral acredita que houve abuso de autoridade.

O corregedor Nacional de Justiça, ministro Humberto Martins também se manifestou por meio de nota. Segundo ele, uma vez que a atuação da Justiça Eleitoral, no que toca à suposta ocorrência de propaganda eleitoral irregular nas dependências de universidades, configura ato de natureza judicial eleitoral, não cabe, "pelo menos em princípio, qualquer atuação da Corregedoria Nacional de Justiça, uma vez que tais atos poderão ser impugnados pelos meios próprios".

O corregedor manifesta "plena confiança de que o sistema da Justiça Eleitoral Brasileira garante a todos os interessados a possibilidade de exercerem plenamente o contraditório e a ampla defesa com todos os meios a ela inerentes, inclusive mediante a possibilidade de recorrer aos Tribunais Regionais Eleitorais e ao Tribunal Superior Eleitoral" e diz que a atuação da magistratura "deve sempre estar voltada à garantia dos direitos fundamentais e à pacificação social, o que pressupõe a existência de juízes com sensibilidade e senso de justiça, a fim de que cada vez mais seja fortalecido o Estado Democrático de Direito".

Na última terça, uma faixa contra o fascismo pendurada no campus de Niterói da Universidade Federal Fluminense (UFF) foi retirada por agentes da PF, a pedido do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ). A ação gerou uma manifestação dos estudantes na quarta-feira, 24. Eles alegam que a atuação da corporação foi arbitrária e que a faixa, com a inscrição "Direito UFF Antifascistas", não fazia referência a nenhum candidato.

Também na quarta, em Minas Gerais, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) exigiu que a Universidade Federal de São João Del Rei retirasse uma nota publicada do site oficial, em que a instituição reafirma "seu compromisso com os princípios democráticos", mencionando que a Universidade sempre adotou as cotas no vestibular e o uso do nome social para pessoas trans.

*Com informações do Estadão Conteúdo

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