Presidente da República Jair Messias Bolsonaro (PL)Isac Nobrega
As "ONGs de prateleiras" têm sido usadas para escapar da regra que estabelece a necessidade de as entidades da sociedade civil existirem há pelo menos três anos para firmar acordos com o governo federal. Essas associações são antigas, sem atividade, e geralmente comercializadas a fim de cumprir o prazo exigido pela lei.
Os dois atletas assumiram os institutos pouco tempo antes de apresentarem proposta de convênio ao governo federal. Para comprovar a capacidade técnica necessária para a execução dos projetos, a dupla listou principalmente, feitos da carreira como jogador e imagens suas durante jogos de futebol.
Sheik assumiu em dezembro de 2019 o Instituto Qualivida, fundado há 26 anos, mas nunca realizou projetos sociais voltados aos esportes. Logo em seguida, o ex-jogador alterou o estatuto, os membros e o nome da entidade. O Instituto Emerson Sheik, novo nome da ONG, apresentou em julho do ano passado seu primeiro projeto ao governo federal. No final de 2021, foi assinado o convênio para a instalação de três núcleos esportivos em Mangaratiba (RJ) e Queimados (RJ) pelo valor de R$ 2,7 milhões.
A verba foi alocada a partir de uma emenda parlamentar da bancada do Rio de Janeiro a pedido do deputado Hélio Lopes (PL-RJ), um dos parlamentares mais próximos de Bolsonaro. De acordo com a reportagem, Emerson tem um convívio muito próximo com alguns bolsonaristas e membros da família Bolsonaro, como a ex-mulher do presidente e o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
O comprovante de endereço do instituto do ex-jogador apresentado ao governo é uma conta de luz da empresa Ceni Compra e Venda e Locação de Imóveis Próprios Ltda, de propriedade do ex-jogador. A sala indicada, porém, está vazia. O Instituto Emerson Sheik tentou comprovar experiência técnica na área do projeto —outra exigência da lei— listando partidas organizadas pelo ex-jogador com arrecadação de alimentos para doações e descrevendo suas conquistas como atleta.
ONG usada por Dani Alves estava inativa havia 5 anos
Já o Instituto DNA, de Daniel Alves, firmou contrato de R$ 3,5 milhões em dezembro com a secretaria para instalar três núcleos de basquete 3x3 nos estados da Bahia, Pernambuco e Distrito Federal.
A entidade chamava-se Instituto Liderança até maio do ano passado e tinha como responsável Leandro Costa de Almeida, ex-treinador de basquete. Ele afirma que a ONG estava inativa havia cinco anos, após ter realizado alguns projetos sociais bancados por apoios privados.
Leandro disse ter sido procurado por um amigo em comum com Daniel Alves e que abriu mão da entidade após ouvir os planos do lateral direito. O ex-treinador de basquete afirmou que não houve negociação financeira para a transferência da instituição. Mas declarou que o jogador passou a apoiar projetos sociais tocados por ele.
Antes de assumir o Liderança, o lateral-direito já havia fundado seu próprio instituto com seu nome em março de 2021. Segundo o diretor técnico da ONG, Rodrigo Valentim, verificou-se depois da fundação desta entidade a necessidade de existência de três anos para firmar convênios com o governo federal.
A inauguração oficial da sede do Instituto Daniel Alves ocorreu no último dia 25 de março, em Lauro de Freitas (BA). Valentim afirmou que a ONG começou a oferecer cursos esportivos um mês antes com cerca de R$ 2 milhões disponibilizados pelo jogador, atendendo a 700 crianças.
A verba federal foi obtida por meio de emenda do relator do Orçamento, a pedido da deputada Celina Leão (PP-DF). A deputada emprega em seu gabinete Ana Cristina Valle, ex-mulher de Bolsonaro.
"As duas entidades apresentaram atestado de capacidade técnica e possuem histórico de projetos realizados na área do esporte", afirmou o Ministério da Cidadania.
Dani Alves falou à reportagem que assumiu o Instituto Liderança para ampliar a capacidade de absorção de crianças em seus projetos.
"Decidi assumir o Instituto Liderança/DNA para apoiar projetos sociais. Neste caso, em especial, os voltados ao basquete. Sou muito amigo do Leandrinho e do Varejão. Sei o poder que o esporte tem de transformação. Assim como transformou a minha vida quero transformar a dos outros. Por isso quis dar agilidade à capacidade de captação do instituto", disse.
Ele afirmou que conseguiu um convênio com valor expressivo em razão da dimensão dos projetos apresentados e pela seriedade dos trabalhos desenvolvidos.
"Atualmente, atendemos 650 crianças e adolescentes em dois núcleos, com recursos exclusivamente privados, provenientes de meu aporte pessoal. Pretendo fazer o que estiver ao meu alcance para aumentar o número de projetos sociais e o número de crianças atendidas" relatou o jogador.
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