Rio - A Justiça marcou um novo interrogatório para o ex-vereador do Rio Jairo Souza dos Santos Júnior, o Dr. Jairinho, no caso Henry, após o médico ter escolhido não responder às perguntas na audiência dessa quarta-feira (9) que se estendeu até as 22h. A defesa do réu pediu que fosse marcada uma nova audiência para que Jairinho dê sua versão dos fatos após ter acesso a documentos, que segundo ele, garantirão sua defesa.
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Após a fase de instrução e julgamento, em que o ex-vereador será ouvido, o processo passa às alegações finais e a magistrada vai decidir se o padrasto e a mãe do menino vão a júri popular pela morte de Henry.
A juíza Elizabeth Machado Louro, da 2ª Vara Criminal da Capital, atendeu ao pedido da defesa de Jairo e agendou o reinterrogatório dele para o dia 16 de março de 2022. A magistrada também determinou que uma detenta seja retirada da cela em que Monique cumpre pena, após a ré relatar sofrer ameaças na prisão.
A audiência de ontem (9) começou por volta de 11h com o interrogatório de Jairinho, que optou por permanecer em silêncio, direito previsto constitucionalmente. Ele no entanto, com a voz embargada, jurou por Deus que nunca encostou um dedo em nenhum fio de cabelo de Henry, morto no dia 8 de março de 2021.
A fala de Jairinho durou cerca de dez minutos. O ex-vereador afirmou que precisava que fossem realizadas diligências, como o confronto entre a perícia contratada por sua defesa e a do IML para se defender. Ele também aproveitou o espaço para pedir à juíza acesso a documentos, como exames, imagens do hospital e do Instituto Médico Legal (IML) e três folhas do prontuário, que segundo ele estavam faltando, para que venha a se manifestar posteriormente.
A defesa do réu solicitou que a imprensa se retirasse no momento de seu depoimento. Mas, a juíza permitiu que jornalistas permanecessem na audiência, apenas fotógrafos e cinegrafistas se retiraram. A transmissão no Youtube foi interrompida durante a fala do ex-parlamentar.
Jairinho afirmou que está sofrendo na cadeia, sugeriu que estava sendo injustiçado pela perícia e afirmou que sua inocência e de Monique serão provadas.
Já a mãe do menino, fez um longo relato de cerca de dez horas sobre sua formação familiar e profissional, o casamento com o ex-marido Leniel Borel, o nascimento de Henry, o namoro com Jairinho, mas afirmou que não presenciou a causa da morte do filho. Ela disse que estava dormindo na madrugada do dia 8 de março e que foi acordada pelo namorado e já encontrou o filho "gelado e olhando para o nada". Segundo ela, o menino estava sem hematomas no corpo.
No dia da morte de Henry, Monique disse que deixou o menino dormindo em seu quarto e seguiu para a sala, onde jantou e bebeu vinho com Jairinho. Após tomar remédios oferecidos pelo ex-vereador, deitou e dormiu no quarto de hóspedes. Por volta de 3h40 da manhã, ela afirmou ter sido acordada por Jairinho, que relatou que encontrou Henry caído no chão após ouvir um barulho vindo do quarto.
"Quando cheguei no quarto, o Henry estava deitado, descoberto, a boquinha aberta. Vi que tinha algo errado, as mãos e os pés dele estavam gelados. Carreguei meu filho nos braços para o hospital. Mas eu achava que ele estava vivo o tempo todo. Somente Deus, Henry e Jairinho sabem o que aconteceu naquela noite. Infelizmente meu filho não está mais aqui para contar".
Em seu interrogatório, Monique afirmou que o seu filho era "dócil, amoroso, sorridente, feliz e especial, um anjo". Ela também relatou agressões cometidas contra ela por Jairinho, citando episódios de violência física, verbal e psicológica.
Monique relembrou o episódio ocorrido em fevereiro de 2021, quando a babá relatou, por WhatsApp, uma suposta agressão de Jairinho à criança. Ela disse que Thainá, a babá, inicialmente mandou mensagens avisando que Jairinho havia chegado mais cedo em casa e que estava no quarto com Henry. Às 17h42, Thainá conta para Monique que o menino estava se queixando de dores no joelho.
"Muitas pessoas me julgaram como se eu tivesse ficado quatro horas no salão após saber da possível agressão. Assim que eu soube da queixa do Henry, fui para casa, onde cheguei por volta de 18h".
Monique Medeiros disse que levou o filho ao hospital no dia seguinte, onde após atendimento e Raio-X, não foi constatada lesão. Ela disse ter acreditado que o menino havia escorregado e caído da cama.
A ré também afirmou não se sentir à vontade para ser interrogada na presença da advogada de Jairinho, Flávia Froes, o que foi atendido. Em janeiro, os advogados de Monique pediram que a ré fosse encaminhada para prisão domiciliar pois estaria sendo ameaçada pela advogada contratada pelo pai de Jairinho para fazer uma investigação defensiva do caso. Ela teria visitado Monique que alegou ter sido coagida a assinar um termo de culpa pela morte do filho. O caso teria acontecido no dia 7 de janeiro deste ano.
Treinada por advogados
Monique Medeiros afirmou que foi treinada pelo ex-advogado de Dr. Jairinho, André França Barreto, para mentir à polícia sobre a morte da criança. "Ele [André] queria arquitetar tudo. Eu não entendi o porquê, o Jairinho tinha me dito que ouviu um barulho no quarto, acordou, foi até lá, viu meu filho caído no chão e botou na cama. Qual é o problema disso tudo se tinha sido um acidente doméstico? Eles [André e Jairinho] já estavam vendo com outros olhos, que era uma coisa que eu não enxergava na época", afirmou.
Monique relata também que André cobrou inicialmente R$ 300 mil para entrar no caso e que depois iria querer mais R$ 2 milhões. "Ele me falou que os R$ 2 milhões ele queria limpo, mas que os R$ 300 mil podia ser entregue da forma que fosse, mas em espécie". A mãe de Henry cita que o ex-vereador prometeu colocar a casa dele de Mangaratiba em seu nome, como parte do pagamento.
Monique diz que acalmava Jairinho com sexo
A mãe de Henry contou detalhes de sua vida íntima para apontar que Jairinho tinha um comportamento possessivo e controlador nas relações sexuais. Monique diz que fazia sexo com o ex-vereador para acalmá-lo quando o médico adotava um comportamento agressivo durante as brigas.
"Ele fazia uma espécie de ritual, era sempre a mesma coisa. O Jairinho deitava por cima de mim e me enforcava. Ele mandava eu dizer que ele era o único homem da minha vida e que eu nunca tinha tido nada com outra pessoa", relata.
Ciumento, controlador e violento
Durante seu depoimento, Monique narrou episódios em que Jairinho foi controlador, ciumento e agressivo. Ela citou uma vez em que Jairinho arrombou uma porta da casa onde eles moravam após uma discussão. "Numa briga que teve eu me tranquei em um quarto e ele arrombou a porta. O Jairinho não me deixava ficar sozinha. Existia esse tipo de controle. A gente não era cem por cento feliz, nem cem por cento infeliz. Nós fazíamos dar certo".
Monique afirmou que em janeiro de 2021 Jairinho passou a se demonstrar uma pessoa "de altos e baixos". Ela citou que o companheiro sentia ciúmes de Leniel Borel que, segundo ela, era o único homem com quem conversava. Na audiência desta quarta-feira, Monique relatou que uma noite dormia na casa dos pais com o filho em Bangu e Jairinho invadiu a casa pulando o muro e verificou seu celular.
"Ele tinha a senha do celular. Abriu para ver a conversa com Leniel. Ele ficou com ciúmes porque eu o chamava de 'Lê' e ele me chamava de 'Nique'. Acordei sendo enforcada ao lado do meu filho. Fui acordada assim, sem saber o motivo. Jairinho disse que eu estava 'dando mole' para o meu ex-marido", contou. Monique acrescentou que Jairinho pediu desculpas no dia seguinte e enviou buquês de flores e caixas de chocolate a cada 20 minutos para pedir desculpas até que ela pediu para que ele parasse.
A mãe de Henry também citou que uma tatuagem com o nome de Leniel na costela incomodava Jairinho. "Me chamava de piranha. O problema era sempre o Leniel", relatou. Em outro episódio, Monique contou que Jairinho se irritou depois que os dois assistiram juntos cinco episódios na série 'Narcos'. E que após brigarem, ele atirou um controle remoto contra ela abrindo sua boca.
Jairinho, segundo Monique, pediu que ela bloqueasse e não respondesse a homens em redes sociais. A professora também contou que Jairinho infiltrou um homem a lhe vigiar em uma academia e que a pediu para demitir um personal trainer e um preparador físico por ciúmes.
Monitoramento de violência infantil
Durante o depoimento, Monique ressaltou que quando era diretora de uma escola em Senador Camará, monitorava casos de maus-tratos e torturas de alunos e chegou a participar de um indiciamento no Conselho Tutelar de Bangu. "Eu identificava crianças que apresentavam lesões. Elas apresentam algumas características. Iam todas agasalhadas. Temos roteiro (nessa identificação), até para não fazermos pré-julgamento. Já tive criança com queimadura de cigarro no saco escrotal", afirmou.
Indicação para o TCM
Após namorar com o então vereador Jairinho, Monique passou a trabalhar no Tribunal de Contas do Município (TCM) do Rio em 2020. Em 2021, ela foi requisitada para trabalhar com o conselheiro Luiz Antonio Guaraná. Questionada pela juíza, a mãe de Henry confirmou que a requisição foi feita com intermediação de Jairinho. Monique acrescentou que Jairinho não gostava de sua profissão e sentia ciúmes porque seu celular não tinha sinal na escola em que Monique era diretora em Senador Camará.
"Jairinho dizia que professor ganha mal, que é diminuído pela sociedade. As brigas que ele tinha no plenário eram com professores. Não gostava da minha profissão. Ele gostaria que eu fosse trabalhar em um local mais apropriado porque agora eu estava com ele. Fui requisitada", disse.
Monique afirmou que recebia salário de cerca de R$ 6.180,00 na escola e passou a receber R$9.800,00 no TCM. "Uma diferença de R$ 3 mil diferente do que foi dito no inquérito. Estou com quebra de sigilo bancário e vossa excelência pode verificar", afirmou à juíza.
Ex-namorada de Jairinho omitiu agressões
Em seu relato, Monique contou que após começar a namorar Jairinho, foi procurada por Debora, uma ex-namorada do então vereador. A mulher disse, segundo a ré, que ainda namorava Jairinho e compartilhou fotos e prints que demonstravam o relacionamento amoroso. Segundo a professora, ela fez uma videochamada para esclarecer a situação com os três.
"Jairinho começou a desmentir ela na minha frente. Disse 'Eu nunca namorei você', 'você é uma pobre coitada', 'só quer dinheiro'. Mas eu tinha visto as mensagens em que ele era afetivo com ela", contou. Monique acrescentou que neste momento Jairinho demonstrou que mentia e era mulherengo. Mas ressaltou que Débora não lhe falou que era dopada por Jairinho e sofria agressões assim como seu filho, que teve a perna quebrada.
Mãe de Elisa Samudio acompanha audiência
Dezenas de manifestantes compareceram á audiência do caso Henry dessa quarta-feira, no Fórum da Capital, no Centro do Rio. Em frente ao Tribunal de Justiça, os ativistas gritavam palavras de ordem pedindo júri popular e "cadeia" para o casal acusado pela morte da criança. Entre os manifestantes estavam as mães de Elisa Samudio, Sônia Samudio, e de Beatriz, menina morta a facadas em uma escola em Pernambuco, Lucinha Mota.
Foi a primeira vez que a nova defesa de Jairinho compareceu a uma audiência e a primeira oportunidade do casal prestar sua versão à Justiça. Ao entrar no Fórum o advogado Lucio Adolfo, que também defendeu o ex-goleiro Bruno, do Flamengo, condenado pela morte da modelo Elisa Samudio em 2010, não quis se manifestar sobre a estratégia de defesa, mas afirmou que não pretende trabalhar para adiar o julgamento.
A magistrada Elizabeth Machado Louro vai decidir se os réus vão a júri popular. Monique e Jairinho podem ser condenados até 30 anos de prisão por homicídio triplamente qualificado, tortura e coação de testemunhas.
Da última vez que Monique e Jairinho estiveram no tribunal, 25 testemunhas de acusação e defesa foram ouvidas, incluindo a babá do menino Henry e a mãe de Monique. As primeiras audiências aconteceram entre os dias 6 de outubro e 14 e 15 de novembro.
Leniel Borel, pai do menino Henry, que atua como assistente de acusação, convocou uma manifestação pedindo justiça pela vida do filho no local da audiência.
Relembre o caso
Henry Borel tinha 4 anos e morreu na madrugada do dia 8 de março de 2021 após dar entrada na emergência do Hospital Barra D'Or, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. As investigações e os laudos da Polícia Civil apontaram que a criança morreu em decorrência de agressões e torturas.
O padrasto, Dr. Jairinho, e a mãe do menino, Monique Medeiros, foram indiciados pelo crime. O casal responde pelos crimes de homicídio triplamente qualificado, tortura e coação de testemunhas. Para a polícia, a mãe de Henry Borel era conivente com as agressões do namorado contra o filho.
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