De ex-aluno a personagem de livro didático, Rene Silva se torna inspiração
Ativista está representado no livro do 1º ano do ensino fundamental da rede municipal de educação
Estudantes do 9º ano do ensino fundamental, de escola pública, participam de encontro com ativista Rene Silva e secretário Municipal de Educação, Renan Ferreirinha - Michell Albuquerque/SME
Estudantes do 9º ano do ensino fundamental, de escola pública, participam de encontro com ativista Rene Silva e secretário Municipal de Educação, Renan Ferreirinha Michell Albuquerque/SME
Rio - Aos 11 anos de idade, Rene Silva dos Santos, de 28, criou o jornal o Voz das Comunidades. A ideia surgiu quando ele estudava na Escola Municipal Alcides de Gasperi, no bairro de Higienópolis, próximo da comunidade onde vive até hoje, no Morro do Adeus, na Zona Norte. Nesta sexta-feira (18), o rapaz retornou à escola onde tudo começou. Desta vez, porém, Silva entrou pelos portões da unidade como um jovem que é citado em livro didático da rede municipal de ensino.
Silva está representado no livro do 1º ano do ensino fundamental, como alguém que amplia as vozes de pessoas que vivem em favelas. Muito emocionado com a visita, o ativista diz ter passado um filme em sua cabeça de quando era aluno da antiga 5ª série na escola (atual 6º ano).
"Foi um dia especial, me vi muito naqueles jovens. Nunca imaginei que um dia estaria nos livros escolares. Quando cheguei, os estudantes já estavam com perguntas prontas para me fazer. Prestavam muita atenção no que estava falando. Foi uma emoção gigantesca", descreve, sobre a reunião com alunos do 9º ano.
Para o jovem, o fato de ele estar inserido nos livros didáticos das escolas da rede mostra avanços na representatividade. "Nos livros didáticos, não tinham pessoas pretas, até mesmo de brasileiros ali sendo contadas. A maioria era de fora, outras pessoas brancas. E, hoje, nós temos uma representatividade muito importante. Temos outras histórias de jovens negros, do samba, do Rio. Isso não tem preço".
Assim como o fundador do Voz das Comunidades, outras personalidades cariocas, brasileiras e internacionais estão representadas nos livros da rede que foram elaborados por professores, entre elas, Dona Ivone Lara, cantora e compositora brasileira, conhecida como Rainha do Samba, e a liderança indígena, Marize Guarani. O material respeita as leis do ensino e cultura africana, afro-brasileira e indígena, desde a sua concepção até as orientações para os professores.
Segundo Ricardo Jaheem, gerente de Relações Étnicos Raciais, o material foi pensado para ser inclusivo desde a alfabetização. Os alunos podem se identificar, por exemplo, com referências positivas de negritude. Os livros também incluem territórios da cidade do Rio, como a Mangueira, Madureira, Manguinhos, Pedra do Sal, Encantado e Ilha da Gigóia.“No livro do primeiro ano, junto a uma foto do Rene, por exemplo, temos a Malala (ativista paquistanesa) e a Marize Guarani. Duas páginas depois, o aluno é convidado a se auto- autodescrever. O livro traz um novo olhar para essa criança que está começando a se conhecer”, exemplifica Jaheem.
Para Renan Ferreirinha, secretário municipal de Educação, a escola tem que se aproximar do aluno. Ele acredita ser, por isso, tão importante o trabalho de elaboração desse material feito pelos professores, que conhecem de perto os seus estudantes e as suas questões. "A gente quer que todo mundo se veja. A criança tem que se sentir pertencente. Quando ela vê em um livro pessoas que não têm nada a ver com ela, questões que não são as dela e lugares que ela nunca nem viu, isso distancia o aluno do aprendizado", aponta Ferreirinha.
A sensação de que também pode ser capaz de ser reconhecida no futuro também empolga a estudante Maria Natalina Carvalho,15 anos, aluna do 9° ano da Alcides de Gasperi. Para a adolescente, Rene é uma inspiração para várias pessoas. Ela conta que "não fazia ideia" ser estudante da mesma escola por onde ele passou. A jovem, que gosta muito de ler e sonha em publicar um livro, ficou motivada com a visita: "Ele veio lá debaixo e foi subindo".
Silva, que os 24 anos, em 2018, foi considerado um dos negros mais influentes do mundo pela organização Mipad, de Nova York, disse que o retorno dele à escola onde estudou marcará para sempre a sua vida. "Foi muito emocionante ter retornado hoje à escola e ter visto tudo isso de perto, de como a escola mudou e avanços aconteceram. E há muitas crianças e adolescentes ali precisando de uma palavra, um abraço e de acolhimento para conseguir ter uma carreira promissora na vida também", finaliza.
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