Funcionários do Cemitério Municipal de São Gonçalo empurram o caixão com o corpo de Grazielle Sampaio, morta asfixiada pelo ex-companheiro em São GonçaloAna Fernanda / Agência O Dia

Rio - "Ele disse que tentou pular em cima do pai para defender a mãe". A fala estarrecedora é de uma tia de Grazielle Sampaio, 32 anos, morta asfixiada pelo companheiro, em São Gonçalo, na frente do filho do casal, de apenas 8 anos. O caso aconteceu no sábado passado (8) e o enterro ocorreu nesta terça-feira (11) no Cemitério Municipal de São Gonçalo, reunindo cerca de 50 pessoas. Glaubert Soares Seriaco, 38 anos, foi preso em flagrante e teve a prisão convertida em preventiva nesta segunda (10).
Segundo a parente, que preferiu não se identificar por medo de retaliações, o filho também denunciou o pai.
"Ele disse que o pai dele pegou a mãe dele e enforcou depois de dar remédio. Ele disse ainda que tentou pular em cima do pai para defender a mãe, mas o pai jogou ele longe. É muito triste", disse ela.
Ainda segundo a tia, no primeiro momento, Glaubert mentiu sobre a causa da morte, alegando que Grazielle morreu dormindo.
"A gente descobriu o caso porque ela não foi trabalhar no sábado. Ela trabalhava em uma loja de colchões. As pessoas estranharam a ausência e foram até a casa dela para ver o que teria acontecido. Eu soube através de conhecidos quando ela já estava no hospital. Eu cheguei lá e os enfermeiros não quiseram me falar o que aconteceu, aí eu liguei para o marido dela e ele me contou que ela tinha morrido, mas no primeiro momento ele disse que ela tomou um calmante, foi dormir e não acordou mais. Só que ela não tomava remédio nenhum; inclusive quem tomava era ele", disse.
Durante o velório, a mãe da vítima, que mora no Ceará e viajou apenas para comparecer ao enterro da filha, estava muito abalada e não falou com a imprensa. Grazielle é filha única e natural de São Gonçalo, mas grande parte de sua família continua no Nordeste, mas nem todos conseguiram comparecer. Já o pai dela faleceu de infarto há cerca de um ano.
Familiares disseram ainda que a vida do casal era marcada por muitas brigas. "Eu já havia falado que era pra eles pararem com essa briga, que não ia dar certo. Na sexta, eu estava com ela, havíamos bebido juntas e, no sábado, eu não acreditei no que ocorreu. A situação toda é difícil. O filho deles é carinhoso e agora vai conviver com esse trauma. Esse monstro transformou o rosto dela todo, está roxo e inchado. Ela era uma pessoa maravilhosa, não merecia isso de jeito nenhum", contou a tia da vítima.
Paula Duarte, amiga da vítima, afirmou que a Grazeille era pessoa guerreira, maravilhosa e trabalhadora, e lamenta que nada tenha sido feito pela polícia. "Infelizmente será apenas mais um caso para as estatísticas, porque veio a polícia pela primeira vez, não fez nada, não levou o Glaubert, viu que ela foi agredida e não fez nada. A polícia não faz nada. A gente vai na delegacia, a gente dá queixa, e o delegado simplesmente fala que não tem provas. A polícia foi lá, tinha provas e não levou ele. Ele voltou no dia seguinte pra fazer isso. Destruiu o filho deles. O mundo todo tem que orar por essas crianças que perdem a mãe nesses casos. É muito triste, assustador, desesperador".
"Nós, mulheres, não temos proteção da Justiça do Brasil. Os homens defendem os homens. Infelizmente nós estamos aqui à mercê de um dia qualquer ser morta por eles, por causa de ciúme, por causa de posse, por causa de qualquer coisa", concluiu Paula. 
Ainda de acordo com a amiga da vítima, Glaubert e Grazielle estavam separados há cerca de três anos e eles haviam se separado por ele ter um comportamento agressivo. Porém, Grazielle precisava de Glaubert para levar o filho deles na escola e por isso o suspeito frequentava a casa dela.
Advogado da mãe de Grazielle, Gabriel Martino afirmou que a estratégia da defesa será decidida levando em conta o filho de 8 anos do casal: "Com base no melhor interesse do menor veremos quais são as providências cabíveis judiciais para resguardar essa criança que está sofrendo tanto neste momento. Analisaremos com a mãe da vítima, que está muito triste e abalada neste momento, e a partir daí vamos pensar em qual estratégia será melhor tomada", disse.
No final do sepultamento, familiares gritaram por justiça: "Até quando?” Até quando mulheres vão morrer assim?"

Relembre o caso

Segundo a Polícia Militar, no dia do crime, agentes foram acionados para verificar uma denúncia de linchamento do suspeito. No local, verificaram que o motivo da confusão era devido ao assassinato de uma mulher. Depois de contornarem a situação, os agentes foram até a residência do casal, onde constataram o crime.

Ao ser questionado, Glaubert contou aos militares que teria discutido com a companheira durante a madrugada e que ela o teria mordido e arranhado. Ele alegou ainda que teria agredido Grazielle apenas para se proteger.

A vítima chegou a ser socorrida pelo Corpo de Bombeiros e levada ao Pronto Socorro Central de São Gonçalo (PSCSG), no bairro Zé Garoto, mas não resistiu.

O homem foi encaminhado para a 73ª (Neves) onde confessou o crime e foi preso em flagrante. Em seguida o caso foi encaminhado para a Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá (DHNSG).
Na tarde desta segunda-feira (10), o Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ) converteu em preventiva a prisão do suspeito. Em audiência de custódia, realizada na 3ª Vara Criminal da Comarca de Niterói, a juíza Ariadne Villela Lopes levou em consideração a confissão sobre as agressões do preso em sede policial.

Apesar de Glaubert dizer que agrediu a mulher para tentar se defender, testemunhas contaram que as agressões eram recorrentes e, horas antes do crime, presenciaram o preso dando socos no rosto de Grazielle e aplicando um golpe mata leão na mesma. Uma outra testemunha disse aos policiais que um dia antes da morte da vítima o homem também agrediu o filho menor do casal.

"Há indícios suficientes de autoria pelo custodiado em relação ao homicídio da vítima aptos a autorizar a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva", disse a juíza na decisão. A magistrada determinou também o encaminhamento do custodiado para realização de exame de corpo de delito para identificar possíveis agressões sofridas relatadas por ele. A investigação do feminicídio segue em andamento.
*Colaborou Anna Clara Sancho