A Redes da Maré se coloca a favor da vida e defenderá sempre os direitos dos moradores e o Estado democrático de direito.
Nota pública 15/8/19
A ideia de convidar os moradores a se manifestarem por meio de cartas surgiu no momento de busca de alternativas coletivas sobre como reagir com a notícia da suspensão da Ação Civil Pública – ACP. Uma conquista da população da Maré que, de fato, contribuiu para diminuir o número de homicídios na região. Esse trabalho foi feito a partir da mobilização das muitas parcerias que a Redes da Maré já estabeleceu ao longo de mais de 20 anos de trabalho no território. Foram muitos adultos, jovens, crianças, homens e mulheres, que de maneira espontânea, participaram dessa ação.
Neste sentido, nos causa muita indignação ouvir do governador Wilson Witzel que a manifestação articulada por instituições e moradores das favelas da Maré foi fruto de manipulação de integrantes de grupos armados. Ficamos estarrecidos e nos sentimos afrontados, também, com as insinuações do presidente do Tribunal de Justiça do Estado, Claudio de Mello Tavares, que colocou em questão a veracidade das cartas escritas pelas crianças da Maré. E ele não para por ai ao indagar: “Foi a criança que fez a carta, o desenho? ou algum traficante, ou algum miliciano fez com que ela fizesse isso para fazer com que a polícia parasse de agir como está agindo com rigor?”
Ao nos depararmos com essas falas, preconceituosas e discriminatórias, fica claro o grande abismo que temos entre uma parte da sociedade, aquela que, historicamente, ocupa espaços de poder e a grande maioria da população que sofre os efeitos das desigualdades do nosso país. É espantoso o modo como não reconhecem a complexidade da vida nas favelas: quem são essas pessoas? O que elas desejam? Que lutas tem no seu dia a dia? É importante refletir sobre as representações que moldam pessoas e lugares a ponto de se definir as políticas públicas de acordo com o lugar onde se vive. As favelas e as periferias, não são historicamente reconhecidas como territórios de direitos como qualquer outro lugar rico da cidade. Até o sentir e a inocência das crianças das favelas é colocado em dúvida, é negado.
É importante frisar, que a Redes da Maré é uma instituição de longa atuação no conjunto de favelas da Maré. Fundada por pessoas oriundas da região, onde construiu sua história com respeito e legitimidade a partir de um trabalho social ancorado em ações estruturantes que em médio e longo prazo tem beneficiado os moradores da Maré. Dessa maneira, é que produz conhecimento, formula ações e cria advocacy em políticas públicas em cinco áreas prioritárias, quais sejam: educação, arte e cultura, memórias e identidade, desenvolvimento territorial e segurança pública.
Nosso trabalho, por fim, deseja que o Estado reconheça os direitos dos moradores das favelas e que todas as ações policiais sejam pautadas pelo respeito às leis e a legalidade como deve ser num estado democrático de direito.