'Somos a base': entregadores relatam rotina de discriminação, e rodoviários pedem vacina
Trabalhadores que seguem trabalhando na parada emergencial reclamam a falta de suporte das empresas e do poder público
Rio - Enquanto parte da cidade está recolhida em casa, motoristas e entregadores de aplicativos percorrem quilômetros e mais quilômetros para garantir o sustento. O sentimento de quem está na ruas, no entanto, passa longe de heroísmo ou nobreza por prestarem um serviço essencial. A sensação é de cansaço: pouco dinheiro, muito trabalho e risco altíssimo de contaminação.
"O risco começa quando o passageiro entra e te paga em dinheiro. Você não faz ideia de quem pegou naquelas notas", afirma um motorista de ônibus que prefere não ser identificado. "Já tive covid, fiquei oito horas internado, 30 dias afastado. Perdi vários colegas para o vírus, mas o trabalho é essencial, não para e vive cheio. O ônibus roda da Candelária até Jacarepaguá. Quando dá 5h30, 6h, fica lotado de gente, um colado no outro, até no vidro. Motorista tinha que ter prioridade na vacinação. Somos a base", opina o funcionário.
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Apesar dos pedidos da classe, não há expectativa de que a categoria seja incluída em alguma lista de imunização. Na terça-feira, o governo do estado anunciou um calendário único para as 92 cidades do Rio de Janeiro, e incluiu agentes da segurança - PMs, civis, bombeiros, Defesa Civil -, professores e profissionais de saúde na lista de vacinação. No anúncio, o governador em exercício Cláudio Castro explicou que a vacinação das forças de segurança é porque "além de não terem parado, há uma preocupação de eles (os agentes) retransmitirem". Um rodoviário questiona: "A gente se expõe mais do que policiais. Imagina quantas pessoas eu tenho contato por dia?".
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Pelas mesmas ruas, de bicicleta ou motocicleta, milhares de entregadores de aplicativo, muitos deles jovens, trabalham sem descanso para ganhar, muitas vezes, uma taxa mínima paga pelas empresas. Enquanto conversava com a reportagem do DIA, o aplicativo de Rafael de Oliveira tocou: ele, que faz entrega de bicicleta, aceitou uma corrida de cinco quilômetros para ganhar R$ 6. "A taxa não aumenta, e a gente só recebe pelo quilômetro rodado para entregar. O que a gente rodou para buscar o alimento não conta", lamenta Rafael.
Além das longas jornadas de trabalho por pouco dinheiro no bolso e do alto risco de infecção, o constrangimento é uma realidade da categoria. Entregadores têm relatado episódios de discriminação, como Marcus Vinicius Gomes, que acusou um porteiro de tê-lo agredido por utilizar o elevador social do prédio.
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"Muitos pedem para o entregador subir e deixar no apartamento, mas sequer abrem a porta. Pedem para deixar no chão, em frente ao apartamento. Sequer olham no olho. Se a pessoa não quer receber em mãos, por que me obrigou a subir?", questiona Jefferson, que trabalha de moto em uma rede de delivery. Luis Paulo Nascimento, que roda de bicicleta, complementa: "Muitos ainda alegam que não receberam o produto. Se for o caso de você ter que voltar lá, é a palavra do entregador contra a do cliente. Quem está certo? É sempre o cliente".
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"Hoje é bem mais possível você levar um lanche na comunidade, ser bem tratado e ganhar uma gorjeta do que trabalhar para a classe média alta. Te tratam como um nada", completa.
O iFood tem criado ferramentas para auxiliar prestadores de serviço que se contaminam por Covid-19. Procurado pelo DIA, o aplicativo explicou como funciona o sistema:
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O iFood criou dois fundos (solidário e de proteção) voltados a entregadores no início da pandemia, que continuam vigentes até hoje — já são mais de R$ 100 mil investidos pelo iFood em ações para entregadores.
O fundo solidário dá suporte aos parceiros de entrega que necessitem permanecer em quarentena por conta da doença. Com ele, o entregador recebe do fundo solidário um valor baseado na média dos seus repasses nos últimos 30 dias, proporcional aos 28 dias de quarentena.
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Já o fundo de proteção apoia os parceiros que fazem parte de grupos de risco, para que eles possam permanecer em isolamento. O fundo de proteção é voltado a entregadores com mais de 65 anos ou em condições de risco, como doenças pulmonares, doenças cardíacas, imunossupressão (inclui HIV), obesidade mórbida (IMC > 40), diabetes descompensada, insuficiência renal crônica e cirrose.
Os entregadores permanecem em isolamento por período indeterminado, recebendo do fundo um valor mensal baseado na média dos seus repasses nos últimos 30 dias trabalhados.
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Os entregadores que necessitem receber o auxílio do fundo devem comunicar através do app iFood para Entregadores. Acessando a FAQ sobre o tema, basta que o parceiro acesse o tópico "Estou com coronavírus". Informações sobre o tema também estão disponíveis dentro do Portal do Entregador.
Além dos fundos criados, o iFood também disponibiliza gratuitamente, em parceria com a AVUS, um plano de vantagens em serviços de saúde para todos os profissionais de entrega cadastrados em sua plataforma. Com o pacote, os entregadores passam a ter acesso a uma rede credenciada de clínicas médicas, laboratórios e farmácias e pagarão apenas pelos serviços que utilizarem com valores acessíveis e descontos de até 80%.
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Os benefícios são válidos também para um dependente de escolha do entregador, sem a necessidade de vínculo familiar.
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