Durante protesto, Maria de Lourdes, esposa da vítima, chorou pela perda do companheiroMarcos Porto/Agencia O Dia

Rio - Maria Ysis Vitória, esposa de Diego William da Silva Dias Lima, de 30 anos, morto durante a ação da Polícia Militar no Morro da Caixa D'água, em Queimados, na Baixada Fluminense, nesta terça-feira (5), acusou a Polícia Militar de ter a ameaçado enquanto tentava reconhecer o corpo do marido. O vassoureiro foi enterrado na tarde desta quarta-feira (6), por volta das 17h, no cemitério Vale da Saudade, em Queimados.

Na ocasião, a mulher alegou que ouviu muitos tiros cerca de dois minutos após a saída de Diego para trabalhar. Após o fim dos disparos, Maria Ysis foi para a entrada da casa, onde fica a sua pia de louças para lavar uma panela e, por impulso, resolveu olhar para trás, onde há um beco. Ali, ela teria visto um corpo caído no mato, e não conseguiu ver o rosto da vítima. 
"Eu olhei para trás e eu vi um corpo, mas só que estava no matinho e o braço da pessoa estava em cima do rosto, então não consegui identificar o rosto, mas eu reconheci a blusa, a cueca e a bermuda. Aí eu pensei: 'aquele ali parece ser o Diego', mas quando eu olhei, estava sem chinelo, estava sem a bolsinha e sem o feixe de vassoura perto dele. O feixe de vassoura estava mais embaixo, porque quando eu me debrucei mais um pouco no muro, eu vi mais embaixo e já me apavorei. Eu pensei 'ou ele correu para algum lugar ou é ele que está ali' mas as roupas não me enganavam".

Em seguida, Maria resolveu ir até o portão tentar verificar quem era a pessoa caída em frente à sua casa. Foi nesse momento que, conforme seu relato, um PM pediu que ela retornasse. A mulher perguntou se o policial havia visto algum trabalhador descendo o morro no momento dos disparos e o agente negou, ressaltando que a chamaria para reconhecer o corpo. Ela, então, entrou em casa e ouviu vozes no beco.

"Eu entrei, mas comecei ouvir vozes no corredor de novo e as vozes diziam assim: 'pega essa coberta aí', porque tinha um quintal do lado do beco que tinham umas roupas no varal. Eles falaram: 'pega essa coberta aí, cobre o corpo e não deixa ninguém ver' e aí outra voz respondeu 'mas vamos levar para onde?' e o primeiro respondeu 'não interessa, só bota dentro do carro'. Na minha mente, porque a gente mora em morro e já pensa em tudo, eu pensei que iriam levar o corpo e dar sumiço sem ninguém ver", contou Maria Ysis.

Logo depois, a esposa de Diogo resolveu sair de casa mais uma vez, na tentativa de conseguir descobrir se o corpo estava com os policiais, sem sucesso. Durante o segundo contato com o policial, Maria Ysis alegou ter sido ameaça com uma arma.
"Não tinha ninguém na rua, eu saí, olhei de novo e o policial virou para mim falou 'entra para dentro'. Eu falei 'meu senhor, quero só ver quem é, porque o meu esposo saiu para trabalhar' e ele gritou 'entra para dentro', eu respondi 'meu senhor, meu esposo saiu para trabalhar, a vassoura dele está ali no chão, eu quero ver se é ele, eu quero ver quem é'. Ele gritou e me respondeu 'entra para dentro agora senão eu vou dar um tiro na tua cara', só que eu não entrei, eu persisti e ele destravou a arma. Nisso que ele destravou, os dois policiais encapuzados que estavam atrás dele viraram o corpo para jogar para cima do lençol, quando viraram, o braço saiu de cima do rosto e nisso eu gritei o nome dele (Diego) e os policiais viram que era meu marido realmente. Gritei para eles 'vocês mataram meu marido' e eles disseram que não, que o Diego tinha atentado contra a vida dele e que não tinha trabalhador na rua", desabafou.
Após a ameaça, Maria disse aos PMs que iria atrás deles para saber o paradeiro do corpo, com medo de que o marido sumisse depois de ser retirado do local. De acordo com ela, os policiais informaram que Diego seria levado a uma delegacia. A afirmação foi um suspiro de alívio para a mulher que, por um momento, achou que o marido estava vivo. Um tempo depois, com auxílio da tia, descobriu que apenas uma pessoa havia sido baleada durante a ação da polícia e que teria sido levado para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da região.

Chegando ao local com os documentos do marido, ela foi informada sobre a morte de Diego. "Ali eu fiquei sem chão, tive a certeza de que era ele mesmo e que não tinha mais volta. Acabaram com a minha felicidade de antes de tudo, acabaram com tudo, levaram tudo meu. Meu marido era tudo para mim, ele era um príncipe, para falar a verdade. Ele era um bom marido, cuidava da família dele, meu marido fez coisas erradas no passado? Fez, mas estava se consertando, a gente estava no caminho, a gente estava junto num propósito de casar, de ter filhos, aumentar a casa", contou.

Maria e Diego estavam juntos há quase um ano, e haviam se reconciliado recentemente. Eles moravam em uma casa junto com a filha dela, que o considerava como um pai. Os dois estavam com os papéis prontos para oficializarem o casamento.

"Há pouco tempo, ia fazer um ano, a gente se reconciliou, fomos morar juntos, eu trouxe ele para morar na minha casa e estava dando tudo certo. A gente ia casar agora, anteontem (segunda) eu fui no cartório pegar os documentos e ele estava todo contente que ia casar, todo bobo que ia poder se batizar, estava comemorando horrores e aí do nada aconteceu isso. O meu relacionamento com ele era maravilhoso, eu não tenho do que reclamar, a vida dele era voltada a me agradar, tudo que ele fazia era para mim. Ele era maravilhoso e tiraram isso de mim, mas graças a Deus, ele era uma pessoa tão boa que me deixou tão bem amparada, me deixou com pessoas boas pessoas que estão cuidando de mim nesse momento".

Indignada, ela ainda diz que vai lutar por justiça para que Diego não seja só mais um entre as estatísticas e lamenta pelo tratamento dado pela polícia aos moradores de comunidade.

"A gente está exposto o tempo todo a isso aí, hoje foi ele, amanhã quem vai ser? Essa essa palavra que acabei de falar não é só minha, outros antes de mim já falaram. Será que vai se repetir novamente? Amanhã mais uma pessoa vai falar essa mesma frase?"

A Polícia Militar foi questionada sobre o caso, mas apenas respondeu que "de acordo com policiais do 24º BPM (Queimados), criminosos armados atacaram as equipes na comunidade do São Simão, em Queimados, na terça (05/04). Um homem foi ferido e socorrido à UPA da região. Na ação, foram apreendidos um revólver, duas granadas, três rádios e drogas". A PM informou ainda que a corregedoria da corporação está acompanhando o caso.