MPRJ cumpre novos mandados contra rede de bingos de Rogério de Andrade e Ronnie LessaReprodução TV Globo

Rio - O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) iniciou, nesta quarta-feira, a segunda parte da Operação Calígula, que mira uma organização criminosa entorno do jogo do bicho liderada por Rogério de Andrade e seu filho, Gustavo de Andrade. O grupo tem como membro Ronnie Lessa, preso no Presídio Federal de Campo Grande pela execução da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
Os agentes saíram às ruas para cumprir 24 novos mandados de busca em Ipanema, na Zona Sul; Recreio, Itanhangá e Barra da Tijuca, na Zona Oeste. Desta vez, são endereços de 19 empresas ligadas aos denunciados. De acordo com as investigações, todas são de fachada e servem para lavar dinheiro das casas de apostas.
Além das empresas, os agentes estão em cinco endereços de pessoas ligadas os denunciados. Entre os alvos nesta quarta estão os inspetores Jorge Luiz Camillo Alves, chefe do Grupo de Investigação Complementar (GIC) da 16ª DP (Barra da Tijuca), e Vinicius de Lima Gomez, lotado no serviço de transportes da Polícia Civil, na Praça da Bandeira.
Nesta terça-feira, 14 pessoas foram presas, 24 pedidos de prisão foram expedidos, 119 mandados de busca e apreensão foram cumpridos e 30 pessoas foram denunciadas pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Entre os presos, estão os delegados Marcos Cipriano e Adriana Belém. Na casa dela, os agentes apreenderam quase R$ 2 milhões em espécie.
Rogério de Andrade e o seu filho, Gustavo de Andrade, são considerados foragidos. A Justiça autorizou a inclusão do nome do bicheiro na lista de difusão vermelha da Interpol. Os promotores de Justiça do Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) disseram que o bicheiro está na linha de investigação como o possível mandante da morte da vereadora Marielle Franco.
Além dessa quantia, os agentes apreenderam ainda R$ 48.251,20, US$ 2.200, 4420 pesos argentinos, 70 pesos uruguaios, todos em espécie, e R$ 3.800 em cheque.
Quatro bingos comandados pela organização foram estourados e também foram apreendidos 107 máquinas caça-níqueis, 17 aparelhos de celular, cinco notebooks, um HD e um pen drive, diversos documentos, pendrive, chips, máquinas de cartão, cópias de processos e componentes eletrônicos.
A operação foi fruto de investigação da Força-Tarefa do Gaeco para o caso Marielle e Anderson, do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
Segundo as denúncias, Rogério e Gustavo de Andrade comandam uma estrutura criminosa voltada à exploração de jogos de azar não apenas no Rio de Janeiro, mas em diversos outros Estados, fundamentando-se em dois pilares: a permanente corrupção de agentes públicos e o emprego de violência contra concorrentes e desafetos. A organização é suspeita da prática de homicídios.

Entre os agentes públicos corrompidos estão agentes da Polícia Civil e da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Os integrantes do grupo mantinham contatos permanentes com policiais civis com pagamento de propinas. Em contrapartida, o grupo liderado por Rogério Andrade. Por outro lado, oficiais da PMERJ serviam de elo entre a organização e batalhões, que recebiam valores mensais para permitir o livre funcionamento das casas de apostas do grupo.

Em um destes episódios, segundo a denúncia, o delegado de polícia Marcos Cipriano intermediou um encontro entre Ronnie Lessa e a delegada Adriana Belém e seu braço-direito, o inspetor Jorge Luiz Camillo. A reunião resultou em um acordo que viabilizou a retirada em caminhões de quase oitenta máquinas caça-níquel apreendidas em casas de apostas. O pagamento foi providenciado por Rogério de Andrade.
Também foi denunciado o policial civil aposentado Amaury Lopes Junior, elo do grupo com diversas delegacias. O inspetor de polícia Vinícius de Lima Gomez foi apontado como receptor de propinas, agindo em favor de integrantes do alto escalão da PCERJ.
A parceria entre Rogério de Andrade e Ronnie Lessa é apontada nas denúncias como antiga, havendo elementos de prova de sua existência ao menos desde 2009, quando Ronnie perdeu uma perna em atentado à bomba que explodiu seu carro. Ele já atuava como segurança do contraventor. Em 2018, ano da morte de Marielle Franco e Anderson Gomes, os dois denunciados se reaproximaram e abriram uma casa de apostas no Quebra-Mar, na Barra da Tijuca. Segundo os investigadores, elementos indicavam a previsão de inauguração de outras casas na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
O bingo financiado por Rogério de Andrade e administrado por Ronnie Lessa, Gustavo de Andrade e outros comparsas foi fechado pela Polícia Militar no dia de sua inauguração. No entanto, as máquinas apreendidas foram liberadas e a casa foi reaberta após atos de corrupção com policiais civis e militares.
Braço-direito de Adriana era "Amigo da 16"
Adriana Belém entregou a titularidade da 16ª DP em janeiro de 2020, durante a operação Intocáveis II, também do Gaeco do MPRJ. Na ocasião, seu braço-direito Jorge Luiz Camillo e o inspetor Alex Fabiano Costa de Abreu foram presos por atuarem contra investigações que envolviam a milícia do Rio das Pedras e Muzema, na Zona Oeste do Rio.
A ligação do chefe de investigação da 16ª DP com o grupo paramilitar era tão grande que ele era conhecido como o "Amigo da 16" pelos criminosos. O policial foi flagrado em várias conversas com o PM reformado Ronnie Lessa.
Rogério disputa espólio de Castor de Andrade
Rogério de Andrade é sobrinho de Castor de Andrade, que dominava o jogo do bicho entre as décadas de 1970 e 1980. A partir da morte do patrono, em 1997, Rogério e o genro de Castor, Fernando Iggnácio, disputavam o espólio do patriarca na Zona Oeste do Rio. Fernando Iggnácio foi assassinado em novembro de 2020 e a Justiça chegou a mandar prender Rogério, que é patrono da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel. O Supremo Tribunal Federal, no entanto, suspendeu a ação penal em fevereiro deste ano.
A defesa de Rogério de Andrade afirma que a operação não deixou demonstrado a necessidade da prisão cautelar. "Se mostra claramente uma afronta ao STF que acaba de conceder o trancamento de uma ação penal contra ele. Isso vem ocorrendo desde juízes como o De Sanctis, Marcelo Bretas e Sérgio Moro, que tentam burlar as decisões do STF", afirma o advogado Ary Bergher.
Em nota, a Polícia Civil informou que os delegados alvos da operação não têm cargos na Polícia Civil atualmente. "Adriana Belém está afastada de licença e Cipriano trabalhando em outra instituição. A Corregedoria solicitará acesso às investigações para dar andamento aos processos administrativos necessários", diz o texto.