O segurança Jorge Luiz Antunes, que morreu depois de um assalto à uma joalheria no shopping VillageMall, atuava como freelancer Arquivo pessoal

Rio - O Sindicato dos Vigilantes do Município do Rio (Sindvigrio) publicou uma nota, nesta segunda-feira (27), em que afirma que a morte de um segurança durante um assalto no VillageMall, na Barra da Tijuca, Zona Oeste, expõe o descaso de shoppings da cidade com a proteção de funcionários e clientes. No último sábado (25), Jorge Luiz Antunes, de 49 anos, foi morto depois que criminosos roubaram uma joalheria do estabelecimento. A vítima não trabalhava armada e não tinha formação na área. Na ocasião, os criminosos chegaram a fazer reféns.
Segundo a nota, a morte de Jorge "expõe uma das maiores ilusões vendidas pela maior parte dos shoppings do Rio de Janeiro: – a ideia que seus frequentadores estão em uma ilha de tranquilidade e segurança em meio a esse mar de violência e caos que se tornou nosso Estado". A publicação diz ainda que os estabelecimentos estão menosprezando a questão ao contratarem pessoas que não estão qualificadas para atuar como vigilantes. "Traduz-se em um ato de desapreço pela população carioca", continua. 
De acordo com o presidente do Sindvigrio, Antônio de Oliveira, a prática de contratar controladores de acesso, porteiros e vigias para atuarem como vigilantes é comum em cerca de 70% dos shoppings cariocas e já acontece há bastante tempo. A medida, segundo ele, tem o objetivo de reduzir custos, já que esses profissionais habilitados devem trabalhar com carteira assinada.

Para exercer a função de forma regular, é necessário realizar o curso de formação de vigilância e, a cada dois anos, fazer uma atualização, que é chamada de reciclagem, com aulas sobre noções de direitos penal, constitucional e humanos, e também voltar a praticar tiro e manuseio de armas. Entretanto, para dar início a capacitação, os futuros profissionais da área precisam estar em dia com a Justiça, não podendo responder a inquérito. Os vigilantes são registrados pela Polícia Federal. 

"O que os shoppings costumam fazer, especialmente na Barra da Tijuca: eles contratam uma empresa de vigilância legalizada e colocam meia dúzia de vigilantes. Essa mesma empresa de vigilância tem uma empresa de serviços, com outro CNPJ, porém dos mesmos sócios e, através dela, contrata 20, 30 controladores de acesso, por exemplo. O controlador de acesso vai estar lá de terno, rádio comunicador, fone de ouvido, parecendo para quem frequenta o shopping, que ele é um vigilante, que ele é um profissional habilitado a fazer a segurança do shopping quando, na verdade, não está", afirmou Oliveira.

Ainda segundo o representante da categoria, a irregularidade acontece principalmente nos shoppings da Barra, o que é atribuído à questões geográficas e urbanas, devido ao tamanho dos estabelecimentos, que têm muitos metros quadrados de área construída. Por conta disso, o efetivo de vigilantes para a segurança do local precisa ser maior e, consequentemente, se torna mais caro.

O presidente explica que também é comum que pessoas sejam chamadas para esse tipo de serviço, mas que não tenham nenhum vínculo empregatício com a empresa, além da atuação de policiais militares de folga na função. Segundo familiares, Jorge não tinha a carteira assinada, recebia R$180 por 12 horas de trabalho e não contava com vale-transporte ou auxílio para se alimentar. A família disse ainda que, mesmo desarmada, a vítima era obrigada a abordar suspeitos no shopping, após ser alertado via rádio.

"É uma mistura explosiva, porque quando você tem uma ação criminosa como aconteceu no VillageMall, esses profissionais que não estão habilitados a atuar como vigilantes, numa reação desastrada, equivocada, não só colocam sua vida em risco, como a das pessoas que estão dentro do shopping. Poderia ter morrido um daqueles reféns, ou um policial militar que estava ali atuando na segurança, ou um controlador de acesso, porque o bandido não vai distinguir quem é vigilante, quem está armado. É muito perigoso", alertou o presidente.
Oliveira explica que ao ser contratada, uma empresa de vigilância privada elabora um plano em que aponta as ferramentas e efetivo necessários para a segurança do estabelecimento. Dessa forma, é possível prevenir a ação de criminosos, que costumam estudar os locais antes dos assaltos, além de conseguir posicionar os profissionais armados em locais estratégicos para coibir os bandidos. Para ele, a ação no VillageMall poderia ter sido evitada se o estabelecimento tivesse vigilantes habilitados. 
"A ação da vigilância privada é preventiva. Agora, esses profissionais, essas empresas que não estão habilitadas a exercer essa atividade, geralmente, vão atuar no momento em que o crime está acontecendo. Muitas vezes não é a melhor opção. Se você tem refém, se você têm um shopping lotado de pessoas, por que você vai reagir? Não é melhor deixar eles levarem o que pretendem e preservar a vida de quem está lá dentro? Para isso, você tem que estar preparado, ser uma pessoa apta a pensar rapidamente no momento da atividade criminosa. Eram 12 assaltantes armados. Não tem como exigir isso do Jorge Luiz, que não tinha curso de formação, não tinha reciclagem, registro na Polícia Federal". 
O Sindvigrio vai notificar o Ministério do Trabalho (MPT) sobre as irregularidades no VillageMall e peticionar para participar da ação do órgão, que vai investigar as condições em que o segurança assassinado trabalhava. Segundo Oliveira, um vigilante deve receber salário mensal, além de FGTS, INSS, seguro de vida, além de vales alimentação e transporte. A empresa contratante também é responsável por arcar com os custos da reciclagem.

"Evidentemente, o Jorge Luiz, por não estar com a carteira assinada, está totalmente desprotegido de tudo isso. É uma questão absurda ele receber R$ 180 para ir lá expor a vida dele. Acabou dando no que deu. E se fosse um dos reféns que tivesse sido morto nessa ação desastrosa? Se fosse um cliente? Certamente, a repercussão seria bem maior e mais grave. Se ele não tivesse morrido, talvez estivesse até preso. Talvez estivesse respondendo em uma situação extremamente difícil perante a lei", declarou o representante, que prestou solidariedade à família da vítima. 
"Nós somos solidários à família do Jorge, não estamos contra o trabalhador. Nós sabemos que ele estava ali porque ele dependia daquilo para o sustento da família dele. É extremamente compreensível. A responsabilidade é da empresa que o chamou, da forma como o chamou. Espero que o shopping, que é o tomador de serviço, responsável maior, e a empresa que o chamou, sejam responsabilizados e tenham que indenizar a família pela perda que tiveram e respondam diante da Justiça". 
Em nota, a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) informou que "atua em conjunto com autoridades competentes da segurança pública no combate à criminalidade e garantia do bem-estar e da ordem em todos os empreendimentos associados à entidade" e que "conta com um Comitê de Segurança especializado na proteção de shoppings e que este grupo mantém uma forte interlocução com secretarias de Segurança municipais e estaduais, contribuindo com investigações em andamento".
Familiares afirmam que a vítima temia pela própria segurança, mas aceitou o trabalho porque estava desempregada há aproximadamente cinco anos. Parentes de Jorge estão na Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) nesta terça-feira (28) para prestar novos depoimentos. A especializada investiga o crime. O corpo da vítima foi sepultado nesta segunda-feira (27), sob forte comoção da família e amigos. Ele deixa esposa, quatro filhos e dois netos. O Disque Denúncia oferece R$ 50 mil por informações que levem a prisão dos envolvidos no crime, pelo telefone 2253-1177. O anonimato é garantido.