Simone (de óculos) ao lado da filha Rayane dos Santos de Oliveira e da mãe, FlordelisBrunno Dantas/TJRJ

Rio - A filha biológica de Flordelis dos Santos de Souza, Simone dos Santos Rodrigues, afirmou em seu depoimento, neste sábado (12), que a morte de Anderson do Carmo aconteceu depois que ela desabafou com o irmão Flávio dos Santos Rodrigues, já condenado pelo crime, sobre os abusos sexuais cometidos pelo pastor contra ela e suas filhas. Anteriormente, a ré havia apresentado outra versão para o crime, em que pagou pela contratação de um pistoleiro para executar a vítima. Além dela, são julgados também a ex-deputada e seus filhos afetivos Marzy Teixeira da Silva e André Luiz de Oliveira, e a neta, Rayane dos Santos de Oliveira, que já foram ouvidos.
Em uma versão anterior, Simone havia revelado que deu R$ 5 mil à Marzy para que ela contratasse um pistoleiro para matar Anderson. Entretanto, na oitiva deste sábado, ela alegou que desabafou com o irmão sobre os abusos sexuais que o pastor havia cometido e ele, por ciúmes, decidiu matá-lo. A ré também afirmou que não deu dinheiro para Flávio, mas o informou sobre a senha do cofre que havia na casa da família. "Eu tinha vergonha e medo de fazer minha família passar por tudo isso que está passando agora", declarou ela. 
A ré afirmou ainda que o crime foi motivado pelo desespero. "Não foi uma coisa planejada. Se fosse planejado, não seria assim. Uma coisa que foi dentro de casa, prejudicou a família inteira". Ainda de acordo com ela, os celulares foram descartados por medo de que as mensagens e ligações sobre o planejamento para o crime fossem descobertas. 
No depoimento, a filha biológica afirmou ainda que tentou alertar Flordelis sobre a índole de Anderson, contando apenas o que podia, e relembrou de uma situação em que foi estuprada pelo pastor. "Tive relações sexuais com ele forçada. O Ramon (filho de Simone) tinha acabado de sair do banheiro, a porta ficou encostada e eu tenho certeza que ele (Anderson) ficou me olhando pela fresta. E, assim quando eu saí, ele foi me empurrando e conseguiu me penetrar com força", contou.
Durante a oitiva, Simone também revelou que Anderson abusou sexualmente de sua filha Rafaela, que só a contou sobre o caso após a morte dele, e disse sentir nojo do pastor. "Eu tomava remédio psiquiatrico e todos dias ele ia no meu quarto e acordava com ele me alisando, com ele com a mão dentro da minha blusa. Eu não tinha paz dentro da minha própria casa. Eu tinha nojo do pastor Anderson, eu queria resolver, não sei explicar", afirmou.
A filha de Flordelis ainda relatou que não estava na casa na noite do crime, em 16 de junho de 2019, e que esteve no hospital ao ser avisada, por volta das 3h, onde a vítima já estava sem vida. Ao chegar em casa junto com a mãe e Flávio, ele a pediu para que ateasse fogo em uma camisa dele e que não fizesse perguntas. Simone então levou a peça até o boxe do banheiro onde fez o que o irmão pediu e disse que soube, naquele momento, que ele havia matado o pastor. 
Relacionamento na adolescência
Durante seu depoimento, Simone disse que conheceu Anderson na escola e que eles namoraram quando ela tinha cerca de 12 anos e ele era aproximadamente 5 anos mais velho que ela. O relacionamento chegou ao fim porque o pastor, segundo a filha, era grosseiro e possessivo. Ela contou ainda que após o término, ele passou a frequentar a igreja e, consequentemente, sua casa, onde ajudava muito a ex-deputada com os jovens e os assuntos religiosos. Nessa época, a ré notou que havia uma relação entre eles.
"Eu fiquei muito constrangida, porque eu já tinha namorado com ele. Quando eu fui perceber que ele tinha parado de investir em mim, foi quando eu percebi que ele estava se relacionando com a minha mãe. Eu fiquei de lado e ele passou a ter um relacionamento com a minha mãe", relatou Simone que disse ainda que a mãe parou de fazer coisas sozinha e que o pastor fazia tudo por ela.
"Ele abria os caminhos e minha mãe ia passando. Eu achava até bonito". A filha biológica também contou que conforme a carreira de Flordelis crescia na música gospel, Anderson assumiu as responsabilidades financeiras da família. "Era nítido que ele era a cabeça, o mentor. Era ele quem direcionava tudo, mesmo minha mãe sendo a pastora".
Apesar de nunca tê-lo chamado de pai, Simone descreveu o pastor como ausente e que não era carinhoso e, pela forma como tratava a todos, os filhos temiam pedir coisas simples e não tinham proximidade com ele, que teria controle financeiro total da casa. "Ele usava o dinheiro para manipular as pessoas. O André, ele o manipulava, mandava ele fazer as coisas e se não fizesse, nada aconteceria. Se não ocorresse do jeito que ele queria, o André ficava sem o dinheiro do mês", afirmou. 
Simone ainda contou que quando foi diagnosticada com um câncer, passou a ver "toda a maldade" de Anderson contra ela, que tentava se aproximar em todas as oportunidades, segundo a ré, que "empurrava com a barriga" a situação por conta da doença. A filha biológica afirmou que tudo o que pedia ao pastor era atendido, na expectativa de que eles se relacionassem. Em uma ocasião, de acordo com o depoimento, ao pedir para comprar um óculos, Anderson pediu que enteada tocasse seu pênis em troca do dinheiro. 
Flordelis chorou bastante durante todo o depoimento da filha e foi retirada do tribunal. A oitiva terminou às 18h22 e em seguida foi dado início ao debate entre a acusação e a defesa. Cada parte terá 2 horas e 30 minutos para falar, podendo haver réplica e tréplica, caso seja estipulado pelo Ministério Público do Rio (MPRJ), que podem durar entre 5 e 9 horas. Depois, os jurados se reúnem para decidir se os réus serão absolvidos ou condenados. A expectativa é de que a sentença da juíza Nearis Arce seja proferida até a madrugada de domingo (13). 
Acusações
Flordelis é acusada de ser a mandante do crime e poderá responder por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima), tentativa de homicídio, uso de documento falso e associação criminosa armada.

Já a filha biológica, Simone dos Santos Rodrigues, e os filhos adotivos Marzy Teixeira da Silva e André Luiz de Oliveira poderão responder por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada. Enquanto, a neta Rayane dos Santos Oliveira, por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa armada.