Juíza Renata Gil é presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros e idealizadora da Campanha Sinal Vermelho Gabriela Biló

Por Isabele Benito
Agora é lei nacional! A coluna conversou com a presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e idealizadora da Campanha Sinal Vermelho, Renata Gil. Além das mais de 10 mil farmácias, a lei conta com um novo parceiro: o Banco do Brasil, que disponibilizou 5.400 agências para que mulheres vítimas de violência doméstica peçam socorro.
Isabele Benito: Na prática isso vai ajudar quanto as mulheres?
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Renata Gil: O Pacote Basta, sugerido pela Associação dos Magistrados Brasileiros e aprovado pelo Congresso Nacional (projeto de lei 741/2021), representa um grande passo na luta contra a violência de gênero. Ele institucionaliza em todo o território nacional o programa de cooperação "Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica", que possibilita à mulher que sofre ameaças e agressões pedir ajuda em estabelecimentos abertos ao público - como farmácias, agências bancárias e repartições públicas - por meio de um "X" vermelho desenhado na palma da mão. A partir desse sinal, os atendentes devem acolher a mulher que fez a denúncia e chamar a polícia imediatamente. A proposição também criminaliza a violência psicológica contra a mulher, para que esse tipo de comportamento, que normalmente evolui para condutas mais graves, e até mesmo para o feminicídio, seja coibido antes de gerar consequências mais danosas. O texto ainda prevê o cumprimento de pena em regime inicialmente fechado para aqueles que cometerem crimes contra a mulher. E, além disso, determina o afastamento dos agressores do lar em caso de ameaça ou agressão iminente.
A luta não para, né?
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A luta contra o machismo e a opressão das mulheres não tem um segundo de descanso. Felizmente, temos alcançado resultados satisfatórios em um curto espaço de tempo. A campanha "Sinal Vermelho" surgiu em junho de 2020. Em março deste ano, apresentamos o projeto à Câmara dos Deputados e conseguimos a aprovação em tempo recorde - menos de três meses - graças ao engajamento da sociedade civil e de parlamentares de todos os partidos. Também aprovamos leis estaduais com esse mesmo teor em onze unidades da federação, além de diversos municípios. O que nós queremos é que toda mulher vítima de violência saiba que pode contar com o apoio do poder público para sair dessa situação.
Qual a próxima causa?
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Nós trabalhamos agora para que a lei aprovada pelo Legislativo seja sancionada pelo presidente da República. Depois disso - e mais importante -, precisamos intensificar as campanhas educativas para que a lei "pegue", isto é, para que a nova legislação seja efetivamente cumprida. Para tanto, precisaremos contar, mais uma vez, com o envolvimento e a dedicação de todos aqueles que se identificam com a luta em defesa dos direitos das mulheres.
Com mais uma lei, você acredita que as mulheres vão se encorajar mais?
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Eu tenho certeza que sim. Afinal, muitas mulheres vítimas de violência não denunciam porque sabem que, ao final de um processo extremamente doloroso, os agressores ficarão impunes. E, mesmo aqueles que são condenados, muitas vezes acabam livres para reincidir nos crimes. Agora, mais mulheres se encorajarão a denunciar porque terão a certeza de que serão ouvidas, e que os responsáveis pelas infrações terminarão atrás das grades. Da mesma forma, nós esperamos que, diante da punição inevitável, menos homens estejam dispostos a ameaçar, agredir e matar mulheres.
Qual ainda é o maior desafio contra a violência doméstica?
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O Brasil conviveu durante séculos com a violência doméstica sem que isso chamasse atenção ou fosse duramente combatido. O poder público também se acostumou a não agir nesses casos. O maior desafio é, portanto, de ordem cultural. As leis se aperfeiçoam, os discursos midiáticos, também. Agora, é preciso mudar as práticas sociais, para que todos saibam que violações dessa natureza são inaceitáveis e serão severamente combatidas pelo Estado.