Passageiros ocuparam a linha férrea e impediram a circulação dos trensReprodução WhatsApp O Dia

Rio - Usuários do transporte ferroviário na Região Metropolitana do Rio enfrentaram mais uma manhã de caos nesta quarta-feira (22). Inconformados com os atrasos recorrentes nas partidas dos trens, passageiros realizaram uma manifestação contra os serviços oferecidos pela SuperVia em Gramacho, em Duque de Caxias, na Baixada. Por conta do protesto, a circulação ficou suspensa de 7h15 às 10h30 entre as estações do Corte Oito e Saracuruna. Os ramais de Japeri, Deodoro e Santa Cruz também operaram com intervalos irregulares, mas já foram normalizados.
Os manifestantes quebraram a bilheteria, jogaram troncos de árvores, madeiras, lixos e até um carrinho de pão de queijo em cima dos trilhos, impedindo a chegada dos trens na estação. Policiais militares atuaram no local para retirar os passageiros da linha férrea. Vídeos publicados nas redes sociais mostraram as plataformas lotadas.
Neste momento, a entrada na estação Gramacho está sendo gratuita, porque as roletas foram quebradas.
De acordo com a SuperVia, o ramal Saracuruna começou a operar com intervalos ampliados devido a furtos de cabos em vários pontos do ramal, ocorridos nos últimos dias, que prejudicaram o sistema de sinalização automática. Por medida de segurança da operação e dos próprios passageiros, os trens precisam aguardar ordem de circulação.
"Mas, às 7h15, a SuperVia precisou suspender a operação no trecho entre as estações Gramacho e Corte Oito e nas extensões Guapimirim e Vila Inhomirim devido à invasão de passageiros à linha férrea na estação Gramacho. Alguns jogaram objetos sobre a via. Nesse momento, o ramal Saracuruna opera entre Duque de Caxias e Central do Brasil. Acionamos a Polícia Militar para as providências necessárias. A SuperVia lamenta atos como esses, de depredação do patrimônio público, que colocam em risco a operação ferroviária, bem como a integridade de colaboradores e clientes da concessionária. Mantemos diálogo aberto com seus clientes através dos seus canais de comunicação, como Atendimento ao Cliente (0800 726 9494) e seus canais digitais", informou a empresa.
Indignação
O técnico de refrigeração Vitor Matheus, de 25 anos, disse que não aguenta mais o sufoco que passa diariamente ao tentar usar o transporte.

"Essa manifestação acabou nos impossibilitando de chegar no trabalhar na hora certa e aí a gente fica também numa dependência da SuperVia, que precisa nos dar um relatório para poder entregar na nossa empresa, a gente precisa de reembolso para conseguir chegar no trabalho e isso é muito cansativo. Sem contar o tempo que ficamos esperando, quando não acontecem essas manifestações, por conta de horários irregulares. Eles dizem que o atraso é de 20 minutos, mas ficamos mais de 40 esperando um trem, que vem superlotado, chegar na estação. A gente passa tanto sufoco, é desumano o que fazem com a gente", lamentou o passageiro.

Vitor trabalha em Del Castilho, na Zona Norte do Rio, e o trem é a melhor opção para ele. Mas os constantes problemas o forçam a pegar outro tipo de transporte.

"A gente chega atrasado todo dia por causa da SuperVia. Esse transporte para mim é uma ótima solução, porque me permite fazer uma baldeação para pegar o ramal Belford Roxo e poder chegar no meu trabalho. Mas chegamos lá no ramal Belford Roxo e não temos trens, o que faz com que a gente saia da estação para pegar outro tipo de condução", reclamou.
Janete Monteiro, de 27 anos, cobra uma resposta do governo para os problemas que afetam a população que depende dos trens para se locomover pela cidade. 
"É a revolta do povo, hoje chegamos no nosso limite. Os atrasos constantes, as interrupções, a falta de comprometimento da SuperVia com os usuários chegou no nosso limite. Nem para avisar com rapidez que não teria mais trem eles avisam. Pagamos passagem cara para um péssimo serviço. Todo dia o trem atrasa, de 40 em 40 minutos, e lotado para ir e para voltar. Ficamos 40 minutos à espera de um trem para Saracuruna na volta para casa num trecho que podemos fazer em 17 minutos. Isso é um absurdo!", disse a passageira, que trabalha em um pet shop da Praça da Bandeira, na Zona Norte.
O gestor de logística Douglas Mendonça, de 34 anos, disse que chegou a abrir dez protocolos contra o serviço prestado pela concessionária.
"O ramal Saracuruna e segundo pior ramal da SuperVia, só perde para o Belford Roxo, são atrasos diários, lotações, portas abertas, baldeação. Duas ou três vezes por semana o trecho Saracuruna x Gramacho fica com intervalo de 1 hora! Absurdo! A Supervia nunca, informa o motivo desse intervalo. Eu mesmo abri dez protocolos mês passado, (na SuperVia, Agetransp, Secretaria Estadual de Trasporte) seis já venceram e a SuperVia não responde o motivos dos atrasos", disse Douglas, que ainda enumerou todos os problemas que encontra diariamente:

Falta banheiro na estações, a estação de baldeação Gramacho não tem cobertura em sua totalidade, os usuários ficam na chuva ou no sol. Por conta dos trens de Saracuruna encerrarem a viagem em Gramacho, o protesto ocorreu lá, chegam dois, três Saracuruna e nunca sai um Central. Me prejudicou muito esse protesto, mas acho válido, o povo tá exausto".
Segundo o almoxarife Célio Marques Pereira, os atrasos nas composições estão gerando até demissões nos trabalhos.

"Eles que estão decidindo a hora que vamos trabalhar e a hora que vamos voltar para casa. A população não está satisfeita com o serviço, que está péssimo. Querem forçar o aumento da passagem, muita gente está sendo mandada embora por causa da SuperVia e agora tá acontecendo isso (a manifestação), o povo tem um limite. Não é certo quebrar tudo, mas chega uma hora que não dá. O cara ainda falar uma gracinha daquelas ali? 'Não tá satisfeito, pega um Uber'. Será que a SuperVia vai dar R$ 60 para cada um? É um absurdo. Agora o povo tá aí revoltado. Me sinto péssimo, abandonado".
Edson Silva presta serviço para uma transportadora e não conseguir chegar ao seu local de trabalho. Ele tem três filhos pequenos e disse que está com receio de perder o emprego.
"Mais um dia precisando da SuperVia, e ela deixando a desejar. Mais um dia perdido e só Deus sabe se amanhã vou conseguir trabalhar. Eu tenho três filhos para sustentar e se eu perder esse trabalho, não sei o que vou fazer. O patrão não quer saber, só quer que a gente chegue. Eu acordo 5h para estar às 6h e passar 40 minutos dentro do trem e ainda ouvir o maquinista falar para uma moça: 'Você tá com pressa? Pega o Uber'. Já vai dar 11 horas e eu to aqui tentando entender o que eles acham que a gente vem fazer aqui todo dia de manhã. Eles acham que é diversão. Eu to me sentindo mais cansado, do que quando estou trabalhando. Foi cansativo viver tudo isso aqui hoje. Já estamos saturados. Vou para casa refletir, botar a cabeça no lugar e ver se amanhã meu patrão vai entender os motivos pelos quais eu não pude ir trabalhar hoje. Só eu sei o quão difícil está para conseguir um emprego, estou há sete anos sem trabalhar de carteira assinada".
Vaca nos trilhos
A SuperVia informou que os técnicos conseguiram resgatar a vaca, e às 8h15 a operação no trecho foi totalmente normalizada. Além disso, os usuários também enfrentaram atrasos nos trens dos ramais de Japeri, Deodoro e Santa Cruz e Saracuruna pelo terceiro dia consecutivo.
Multa
O Procon-RJ aplicou mais sete multas à concessionária SuperVia por falha na prestação de serviço. As sanções, aplicadas na última sexta-feira, somam R$ 6.283.760,00. A concessionária está sendo multada por irregularidades encontradas nas estações Central do Brasil, São Cristóvão, Pavuna, Honório Gurgel, Rocha Miranda, Ricardo de Albuquerque, Anchieta, Olinda, Praça da Bandeira, Mangueira, Riachuelo e Engenho de Dentro. Superlotação e atrasos foram alguns dos problemas constatados que geraram as multas.
Na primeira quinzena de maio, duas sanções, que totalizaram R$ 3 milhões, foram aplicadas à empresa. Desde abril, a autarquia realiza ações de fiscalização nas estações de trem para apurar como o serviço é prestado à população. Outros 10 autos de infração foram lavrados e seguem os trâmites legais, que poderão resultar em novas multas.
CPI 
Deputados da CPI dos Trens, da Alerj, inspecionaram recentemente o ramal Belford Roxo e concluíram que este é o pior ramal de todo o sistema operado pela empresa. Além dos problemas comuns aos outros ramais, como buracos nos muros das vias, muito lixo e presença do tráfico de drogas, a quantidade de pessoas morando às margens da linha férrea impressionou os políticos. Após a prorrogação da CPI por mais 60 dias, o relatório final deverá ser entregue em até 70 dias.
Força-tarefa
Em abril, o Governo do Estado anunciou uma força-tarefa que tinha como uma das principais ações o plano de retomada de 12 estações consideradas perdidas para o tráfico, por meio da Polícia Militar. A ação ocorreu após inúmeros episódios de paralisação nos ramais por conta de roubos de cabos, atrasos nas viagens, sucateamento e falta de trens em horários de pico. 
O governador Cláudio Castro já havia anunciado a suspensão das negociações com a SuperVia quanto ao reajuste das tarifas, até que a concessionária corrigisse todos os problemas no serviço.