Daiana realizou uma cirurgia que apresentou problemas e ela teve complicações com um dos pontos da barriga necrosadoReprodução/TV Globo

Rio - "Meu peito está todo necrosado. Eu estou com um buraco na barriga", desabafou Daiana Chaves Cavalcanti, de 36 anos, paciente mantida em cárcere privado dentro de um hospital na Baixada Fluminense. Em entrevista ao "Fantástico", da TV Globo, na noite deste domingo (24), a mulher contou que procurou o médico Bolívar Guerrero Silva para realizar um sonho. "Juntei o meu 'dinheirinho' e acabei querendo tentar realizar o meu sonho, que realmente 'deu ruim' com esse homem [o médico]."

Daiana passou por uma uma abdominoplastia, procedimento cirúrgico para retirada de excesso de pele e gordura do abdômen, em março deste ano. De acordo com ela, teria escolhido o cirurgião plástico boliviano, que foi preso, por ele ser muito famoso nas redes sociais.

Meses depois, em junho, Daiana se internou no hospital Santa Branca, em Duque de Caxias, na Baixada, para outras intervenções, mas desta vez, a cirurgia teve complicações. Ela aguardava transferência há cerca de um mês. "Não podia andar no corredor, não podia fazer nada. Só ficar trancada no quarto que eu estava", contou.

De acordo com a vítima, por conta do problema, seu estado de saúde se agravou, a família tentou transferência para outros hospital e, segundo eles, Bolívar dificultava a mudança, então decidiram chamar a polícia.

O médico foi preso dentro do centro cirúrgico, acusado de manter Daiana em cárcere privado, na última segunda-feira (18).

No Hospital Santa Branca, onde a mulher estava internada, a diretora da unidade, Edmea Verçosa, afirmou que Bolívar Guerrero estava sendo zeloso ao deixar Daiana internada no local.

"Eu não sou médica. A intercorrência, o doutor vai falar para você, acontece, e ela [Daiana] estava sendo bem tratada. Sabe qual foi o erro do Dr. Bolívar? Não ter deixado ela ir, ele foi zeloso. Ela não foi transferida porque o hospital do outro lado precisa dar vaga", disse.

Mais de 20 pacientes já procuraram a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam), em Caxias, para denunciar o médico desde a prisão dele, que teve a prisão temporária prorrogada e responde por cárcere privado, organização criminosa e lesão corporal. O caso corre em segredo de Justiça.

Daiana foi transferida para o Hospital Federal de Bonsucesso, na Zona Norte do Rio, que ofereceu um leito, na última quinta-feira (21).

Além de Bolívar, Kellen Cristina dos Santos também está sendo investigada pela polícia. A técnica de enfermagem, que está com seu registro vencido, é suspeita de realizar procedimentos cirúrgicos ao lado do médico. Em uma publicações nas redes sociais, ela coloca a legenda "é sempre um prazer operar do seu lado", em uma foto com o equatoriano.

Em depoimento, a técnica de enfermagem alegou trabalhar com o cirurgião dando suporte técnico durante as operações, além de ajudar na captação de pacientes. Porém, nas redes sociais, há diversos relatos da mulher dentro da sala de cirurgia.

Uma vítima, que preferiu não se identificar, contou ao "Fantástico" que após passar por uma cirurgia com Kellen, que se passava por médica, fez uma reclamação de que os seios haviam ficado tortos. Com a negativa de ajuda, a paciente foi até o consultório do Bolívar retirar os drenos.

"Foi lá para o consultório do Bolívar, então agora ela é paciente dele, não é minha. Não quero mais assunto com ela. Ela é uma traíra, ela é perigosa", relatou Kellen, em áudio, para uma prima da vítima.

Em um dos casos, um paciente de Bolívar, com 34 anos na época, nem chegou a ser submetido a cirurgia, pois sofreu uma parada cardíaca durante a anestesia e, há 7 anos, entrou em estado vegetativo. A família processou o médico e o Hospital Santa Branca e conseguiu na Justiça que o paciente receba auxílio médico em casa.

Uma outra paciente, a cabelereira Lídia Pereira, foi outra que denunciou o médico após ter feito cirurgias plásticas que deram errado. Ela conta que também o encontrou pelas redes sociais. "Uns 3 anos, tomando coragem, pesquisando com outros médicos, aí eu fui lá eu fiz o 'X-Tudão'", relatou.

X-Tudão é o nome dado por Bolívar ao seu pacote de procedimentos. Para conseguir clientes, ele tinha um time de divulgadores em grupos de Whatsapp e redes sociais. A divulgação era realizada através de uma página do Facebook com o nome de 'Cirurgia plástica com o poderoso Bolívar'.

Em uma das reuniões com o médico, ela alegou não ter gostado do resultado e que ficou com o corpo deformado depois dos procedimentos. "É só olhar as marcas que estão no meu corpo. Para mim tudo deu errada, nada teve sucesso", lamentou.

A equipe também disponibilizava diferentes formas de pagamento, como o carnê. Outra coisa que chamava atenção era o preço abaixo do valor de mercado e a possibilidade de dividir em até doze vezes sem juros, mas a operação só era realizada mediante ao pagamento total das parcelas.

A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica afirmou, por meio de nota, que está acompanhando o caso. O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu sindicância para apurar os fatos.