Desde ontem pela manhã, houve movimentação policial em um dos acessos ao Morro do Fubá, em CampinhoReginaldo Pimenta/ Agência O Dia

Rio – A Polícia Militar realizou, nesta quinta-feira (22), policiamento ostensivo no Morro do Fubá, que fica entre os bairros Campinho e Cascadura, na Zona Norte. Mesmo sem registrar prisão e apreensão, a estratégia da polícia é atuar contra o crime organizado e intimidar os confrontos entre traficantes do Comando Vermelho e milicianos do grupo ‘Tico e Teco’ pelo controle total da comunidade.
Os Morros do Fubá e do Campinho vivem, desde o início do ano, uma disputa entre traficantes do Comando Vermelho, liderados pelo gerente do Morro do Dezoito, Rafael Cardoso do Valle, o 'Baby', e da milícia do 'Tico e Teco', chefiada por Leonardo Luccas Pereira, o 'Leleo' ou 'Teco'. A guerra entre os criminosos acontece depois que as milícias dos morros foram traídas por um ex-integrante. Agora, os traficantes dominam a parte alta da comunidade, mas a parte baixa segue sendo comandada pelos paramilitares.

De acordo com um professor que é morador do Morro do Campinho, na mesma área, e não quis se identificar, há cerca de 15 dias os confrontos haviam cessado, mas na segunda-feira (19), por volta das 4h50, os tiros voltaram a ser ouvidos.
Uma estudante, de 23 anos, do curso de medicina da Faculdade Souza Marques, em Cascadura, que não quis se identificar, relatou ao DIA momentos de tensão vividos na universidade nos dias de tiroteios: "A sensação é de impotência e insegurança absurda, nós ficamos sem saber se saímos correndo para casa ou se ficamos lá praticamente na frente do conflito. Isso gera uma ansiedade absurda, os pais e familiares ficam muito nervosos também. Em um dos dias que estávamos na faculdade e teve tiroteio, uma menina teve crise de ansiedade e pânico a ponto de passar mal no meio do corredor".
A estudante disse ainda que, por conta dos tiroteios frequentes, as aulas estão sendo canceladas, pois é muito perigoso estar no local. "Só neste semestre, de julho para cá, já tivemos mais de duas semanas de aulas canceladas por causa dos conflitos. Estamos, inclusive, em uma semana sem aulas, uma vez que a região não é segura". 
Um helicóptero da PM sobrevoou o Morro do Fubá, nesta quinta-feira (22), durante intenso tiroteio.

Nas redes sociais, uma moradora relatou que ela e a família quase foram baleados, na manhã de hoje (22), durante a troca de tiros, porque policiais militares teriam tentando entrar em sua casa para se esconderem.
"Nascemos de novo. Operação e confusão entre pms do helicóptero e terrena. Quase fomos alvejados. Morro do Cabo divisa com Fubá", publicou a mulher.

A Polícia Militar pede a colaboração da população para localizar criminosos e esconderijos de armas e de drogas pelo 190 ou pelo Disque Denúncia, nos telefones (21) 98849-6099; (21) 2253-1177 ou 0300-253-1177, além do App Disque Denúncia RJ e também pelo inbox do Facebook e Twitter dos Portal dos Procurados. O anonimato é garantido.

Guerra no Morro do Urubu

Nesta quarta-feira, também houve tiroteio durante a manhã e à noite, e, na terça-feira (20), um outro confronto deixou um homem baleado. Na última segunda-feira (19), ao menos seis veículos foram alvejados com tiros de fuzil por conta de mais uma troca de tiros. No mesmo dia, três criminosos fortemente armados invadiram um edifício na Avenida Ernani Cardoso, em Cascadura, para socorrer um deles, deixando rastros de sangue pelo local.
Além disso, há pouco mais de um mês, o turista americano Trey Thomas Joseph Barber, de 28 anos, que estava hospedado na casa de amigos, também em Cascadura, morreu após ser atingido no pescoço por uma bala perdida durante uma troca de tiros no Morro do Fubá. Na mesma ocasião, dois passageiros de um ônibus ficaram feridos.

Atualmente, o 9º BPM ocupa a região. A guerra entre as facções vem provocando impactos na rotina de quem reside nas comunidades e nas proximidades. Faxineiro há sete meses, um morador do Morro do Fubá, de 42 anos, relatou que já precisou faltar ao trabalho por conta da troca de tiros e que quando vai, teme não conseguir voltar para casa. Ele também conta que os filhos estão há dias sem conseguir estudar, por medo dos disparos.
"Tem sido muito complicado. A minha filha tem três semanas que não vai para a creche. Meus dois filhos, ontem, não foram para a escola. Está em época de prova e a escola liberou quem não pôde ir. Eu fico com o coração na mão, porque violência tem em todo lugar, mas ali está demais. Inclusive, achei cápsula de projétil na minha porta, eles (criminosos) passam perto da minha porta, então, meus filhos ficam com medo. Eu faço de tudo no meu serviço cedo, para ir para casa mais cedo e não acontecer nada. Se acontecer alguma coisa comigo, o que eles vão fazer da vida deles?", lamentou o faxineiro.
Morando na Rua Alberto Silva, no bairro de Cascadura, uma secretária relatou que tem feito planos para se mudar de sua casa e que já chegou a trocar o transporte escolar da filha duas vezes, já que o serviço parou de ser oferecido na região. A mulher disse ainda que chegou a tentar ir trabalhar nesta quarta e quinta-feira, mas precisou se abrigar em um supermercado, devido aos tiros.
"(Estou há) dois dias sem trabalhar. Ontem e hoje cheguei a sair de casa, mas tive de me abrigar no Guanabara. Minha filha já tinha ido para o colégio e o transporte, que já mudei por duas vezes, por conta da guerra, entrou em contato dizendo que não a buscaria. Como ela está em provas, eu não fui trabalhar mais uma vez. Estou começando a ver casa para me mudar daqui. Não podemos ir a lugar nenhum, porque não sabemos se vamos voltar em segurança", desabafou a secretaria.
Um homem que mora em frente ao morro, na Rua Cândido Benício, há mais de 20 anos, contou que passou a adaptar seu cotidiano aos confrontos. "Eu, particularmente, lido da única forma que tem para lidar: se está tendo tiroteio e eu tenho que sair de casa, eu tenho corrido o risco. Se eu puder evitar, eu evito. Mas, se eu tiver que trabalhar para ganhar dinheiro, para poder me sustentar, eu vou ter que correr o risco. Essa é a realidade de quem mora no Rio de Janeiro inteiro (...) Aqui, quando acontece, a gente fica dias sob essa tensão constante. Não é nenhum pouco confortável seu despertador ser tiro de fuzil", disse ele.
"Nunca vi algo assim acontecer. Há uns seis meses é um entra e sai de milícia e tráfico que tem oferecido muito risco aos moradores do entorno. A gente tem vivido em um estado de alerta muito grande e evita sair, porque não sabe mais se volta. As escolas particulares do entorno estão fechadas, com aulas online. Meu apartamento é alvo fácil, tenho dormido na sala com meus filhos, com medo do que pode acontecer na madrugada", afirmou uma instrumentadora cirúrgica, de 47 anos, que mora há 13 anos na Avenida Ernani Cardoso.