Christiane, que trabalha como controladora de acesso no Hospital Municipal Dr. Ernesto Che Guevara, referência no atendimento de pessoas com covid-19 em Maricá, diz que foi um choque viver de perto o que ela via diariamente no local de trabalho. "Não deu tempo de pedir desculpas, foi inesperado, de um dia para o outro ele se foi. Meus dois filhos, um de 16 anos e outro de 11 anos, tinham o sonho de ver o avô e no dia que isso ia acontecer, ele não resistiu e faleceu", relembra a controlada de acesso que ficou com o pai internado por cinco dias.
"Eu fiquei destruído na época, era mais que meu filho, era meu amigo, havia convencido ele a voltar para a faculdade, fazíamos tudo junto. Quando vi o pessoal hostilizando a homenagem da ONG eu não pude ficar calado", relembra ele. Segundo Márcio, os manifestantes só pararam de derrubar as cruzes quando ele gritou pedindo respeito pois havia acabado de perder um filho. "Eles se sentiram envergonhados e foram embora logo em seguida". Hugo deixou um filho de 6 anos e não concluiu o sonho de cursar faculdade, um plano que seria concretizado em poucos meses.
Rio de Janeiro é o segundo estado com o maior número de mortes no país
Após um ano e dois meses desde a chegada da pandemia no Brasil, os números não ficaram favoráveis para o estado do Rio. Atualmente, o estado ocupa o segundo lugar no ranking de total de mortes por Covid-19 no Brasil, ficando atrás somente do estado de São Paulo. A média de mortos em sete dias no estado é de 240 mortes por dia. Dado coletado no Painel de Saúde do governo do Rio no dia 21 de maio.
O Mapa de Risco da Covid-19, divulgado na sexta-feira (20) pela Secretaria de Estado de Saúde, aponta que o estado do Rio de Janeiro está com bandeira laranja, com risco moderado de contrair a doença. No entanto, o Mapa apresenta piora nas regiões da Baía de Ilha Grande, Metropolitana I e Noroeste, que passou da bandeira laranja para a vermelha, com risco alto.
A 31ª edição apresentou redução no número de óbitos (-31%) e de casos de internações por condições grave, que pode evoluir rapidamente para complicações respiratórias e para óbito, o SRAG, (-24%) na comparação entre a semana epidemiológica 18/2021 e 16/2021. As taxas de ocupação de leitos no estado foram de 84% para leitos de UTI e 62% para leitos de enfermaria . No mapa, foi observado também um rápido aumento na taxa de ocupação no estado a partir do mês de março, com redução e estabilização a partir do mês de abril.
A partir de março, houve maior velocidade no aumento do número de pessoas na fila de espera, mas nas últimas semanas foram observadas menos de 200 solicitações por dia, sendo que para leitos de enfermaria a demanda é muito inferior à de leitos de UTI.
Vale lembrar que em março o estado registrou recorde na fila de pessoas que aguardavam por um leito de UTI Covid no estado. No dia 28 de março, 710 pacientes aguardavam uma vaga de tratamento intensivo na rede pública. Os dados são da Secretaria Estadual de Saúde.
No mês de abril, o estado do Rio chegou ao ápice do colapso nos hospitais estaduais e federais devido à falta de medicamentos. O Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE), em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio, por exemplo, precisou intubar pacientes com covid-19 sem sedação.
O especialista em terapia intensiva e diretor da terapia intensiva da Rede Hospital Casa, Ricardo Eiras, disse ao DIA que as unidades de saúde precisaram improvisar e recorrer a um Plano C devido à falta de insumos. "Os pacientes de covid-19 são de sedação difícil e usam doses maiores que as habituais. Temos várias opções para sedação, claro que tem opções melhores e piores, mas sempre há um Plano B. Mas temos hospitais realmente passando muita dificuldade nesse ponto. Muitos já usaram Plano C e realmente estão improvisando de forma muito inadequada e deixando o paciente em risco, até serem reabastecidos", disse.
A Defensoria Pública do Rio pediu explicações para o Estado do Rio de Janeiro sobre a escassez de medicamentos que compõem o kit intubação e também entrou com uma Ação Civil Pública cobrando o pronto abastecimento das medicações indispensáveis para o tratamento dos pacientes com a forma mais grave da covid-19.
No dia 18 de janeiro deste ano, o Rio de Janeiro deu um grande passo e vacinou as duas primeiras pessoas contra a covid-19, aos pés do Cristo Redentor. Terezinha da Conceição, 80, e Dulcinéia da Silva Lopes, 59 anos, técnica de enfermagem, foram as imunizadas em uma data histórica para a cidade. Desde então, o estado tem se organizado por meio de calendários divididos em idades e grupos de riscos. Até o dia 21 de maio, 3.013.899 pessoas receberam a primeira dose da vacina e 1.414.968 receberam a segunda dose.
A campanha de vacinação foi dividida pelo Ministério da Saúde em quatro fases de distribuição. Na primeira fase os grupos prioritários incluíram trabalhadores da saúde que atuam na linha de frente no combate à covid-19 e na vacinação, pessoas com 60 anos ou mais vivendo em abrigos ou asilos, pessoas maiores de 18 anos com deficiência institucionalizadas, trabalhadores dessas instituições, povos indígenas vivendo em terras indígenas e idosos a partir de 80 anos. Nos demais grupos, idosos a partir de 75 anos e demais trabalhadores da saúde entraram no calendário.
Na segunda fase, pessoas de 60 a 74 anos foram vacinadas. Na terceira fase, pessoas com comorbidades entraram no calendário. Na quarta fase, o calendário contou com a vacinação de pessoas com deficiência permanente grave, pessoas em situação de rua, população privada de liberdade, funcionários do sistema de privação de liberdade, trabalhadores da educação, forças de segurança e salvamento, forças armadas, trabalhadores dos demais serviços essenciais (trabalhadores do transporte coletivo de passageiros e de carga, trabalhadores portuários e trabalhadores industriais) e populações quilombolas.
Decretos e desrespeitos
A forma encontrada pelo estado em frear o contágio foi a publicação de decretos impedindo o funcionamento de boates, proibindo a realização de eventos e o fechamento das praias. No entanto, nem mesmo as principais autoridades seguiram as próprias recomendações. No dia 28 de março deste ano, o governador, até então em exercício, Cláudio Castro, promoveu um evento em comemoração ao seu aniversário de 42 anos, em uma casa no bairro de Itaipava, em Petrópolis, Região Serrana do Rio. O evento aconteceu dois dias após o governador pedir para a população ficar em casa e evitar aglomerações. Pelo menos 20 pessoas estavam no local, todas sem máscara.
Na época, Castro não somente desrespeitou o decreto estadual, como também desobedeceu o decreto municipal de Petrópolis, que proibia aglomerações e a realização de festas de aniversário, mesmo em ambientes privados, durante a pausa emergencial.
O prefeito da cidade do Rio de Janeiro Eduardo Paes também foi flagrado desobedecendo o próprio decreto. Em um evento de roda de samba, no último dia 8 de maio, Paes foi visto cantando sem máscara em um ambiente com aglomeração, poucos dias depois de se curar do coronavírus. Um dia antes, o prefeito havia divulgado novas medidas de proteção contra o avanço da covid-19 na cidade, mas com afrouxamento em alguns setores. Após a divulgação do vídeo, o prefeito usou as redes sociais para pedir desculpas. No dia 10 de maio, a Secretaria de Ordem Pública e a Vigilância Sanitária multaram o prefeito Eduardo Paes por não usar máscara no valor de R$ 562,42.
Desvios de recurso para o combate à covid-19 culminou no impeachment de Wilson Witzel
No dia 30 de abril, o Tribunal Misto (TEM) decidiu pelo afastamento de Wilson Witzel do cargo de governador do Rio de Janeiro. De acordo com a Procuradoria-Geral da República, desde que assumiu o cargo, em janeiro de 2019, Witzel montou uma organização criminosa dentro do governo do estado. A quadrilha foi dividida em três grupos, que disputavam o poder com desvio de recursos dos cofres públicos.
Os dois pontos principais que culminaram na investigação de Witzel se referem à requalificação da OS Unir por decisão do, até então governador, em 23 de março de 2020, após a organização social ter sido impedida de contratar com a administração pública e ter tido contratos rescindidos para a gestão de unidades de saúde no Rio, por irregularidades no contratos, em setembro de 2019.
Outro aspecto da denúncia se refere à contratação da OS Iabas por mais de R$ 800 milhões para construir e administrar os hospitais de campanha do Rio, sem que a empresa tivesse condições de realizar o serviço. A denúncia aponta que as organizações sociais Unir Saúde e Iabas pertencem ao empresário Mário Peixoto.
O vice-governador Cláudio Castro (PSC) assumiu o cargo de governador do estado do Rio de Janeiro no dia 1 de maio, um dia após a condenação do ex-juiz Wilson Witzel em um processo de impeachment.
Perdas irreparáveis para o Rio de Janeiro
Entre as 50 mil mortes, a população do Rio de Janeiro perdeu nomes que fizeram história e deixaram legados. Foi o caso do humorista Paulo Gustavo, de 42 anos, que morreu devido a complicações da covid-19 no dia 4 de maio. Paulo Gustavo estava internado no hospital Copa Star, na Zona Sul do Rio, desde o dia 13 de março. Paulo Gustavo nasceu em Niterói, em outubro de 1978.
Em forma de homenagem, a cidade de Niterói, cidade onde Paulo Gustavo nasceu, homenageou o humorista batizando uma das mais importantes vias do bairro de Icaraí com o seu nome. A Prefeitura de Niterói instalou, no dia 19 de maio, 46 placas da Rua Ator Paulo Gustavo, em Icaraí. A mudança no nome da rua foi aprovada por 90% dos niteroienses em consulta pública com mais de 34 mil participantes e teve mensagem executiva do prefeito Axel Grael aprovada pela Câmara de Vereadores.